terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Arábia Saudita na iminência de troca de regime

23.01.2016 Author: Petr Lvov - “New Eastern Outlook”.

Tradução btpsilveira




Vários especialistas previram a transformação que aparentemente começa a sofrer a Arábia Saudita. Tornou-se óbvia depois que o atual rei Salman bin Abdulaziz Al Saud substituiu seu falecido irmão Abdullah bin Abdulaziz Al Saud no trono em janeiro de 2015, e em seguida promoveu uma série de medidas dentro da elite governante, nomeando o presidente do Ministério do Interior Muhammad bin Nayef, do clã Abdullah, como príncipe coroado, enquanto o filho do novo rei, Mohammad bin  Salman Al Saud, de 33 anos de idade e pertencente ao clã Sudairy, recebeu a nomeação de segundo na linha de sucessão ao trono.

Nestas alturas já estava claro que o novo rei tentava abarcar todo o poder do reino nas mãos de seu filho, contornando Muhammad bin Nayef, enquanto ele mesmo entrava em uma espécie de aposentadoria devido ao Alzheimer que o acomete, vindo a se tornar então uma espécie de “rei honorário” sem poder real, mas com o direito de voto consultivo quando dos assuntos mais cruciais e decisões importantes. Não é preciso dizer que isso é uma violação direta à tradição sucessória do reino, onde o trono é passado de irmão par irmão e que está ainda em vigor. Salman está substituindo essa tradição pela sucessão pai-para-filho.

Para tomar decisão dessa magnitude, ele deve estar preparado para levar a efeito um Golpe de Estado com a aprovação do Comitê de Sucessão, o qual é formado, de acordo com fontes diferentes, por entre 7 a 11 membros da dinastia Saud.


Parece que as rodas da máquina política começarão a se movimentar novamente. Na última semana, reportagens originadas em Riad indicaram que a doença do rei começa a cobrar seu preço e ele se veria forçado a renunciar em favor do príncipe coroado. Mas os dirigentes de Estados vizinhos, especialmente Catar e os Emirados Árabes Unidos Começaram discretamente a sugerir que os membros da família real, que juntamente com os sheiks das tribos mais fortes formam a base onde se assenta o regime saudita, estariam extremamente insatisfeitos com a forte deterioração na situação econômica e social no país, que está levando a uma queda acentuada em suas receitas pessoais.  

Não é segredo para ninguém que a Arábia Saudita aumentou drasticamente sua produção de petróleo em uma tentativa de enfraquecer seus principais concorrentes – Rússia, Irã e Venezuela. Mas o reino também teve que suportar a pancada, sendo forçado a usar seus fundos de reserva e a cortar o financiamento de vários programas sociais.

Em seguida aconteceram as execuções de 47 pessoas, entre as quais Nimr Baqir al-Nimr, clérigo xiita e popular ativista de direitos humanos. As execuções foram pensadas como uma forma de retaliar o Irã e o Hezbollah pelo apoio que providenciaram ao povo sírio na sua luta contra os militantes apoiados pela Arábia Saudita. A medida provocou grande agitação nas áreas de população xiita do reino, justamente onde se localizam as áreas da maior parte da produção de petróleo saudita. O país acabou se colocando ao mesmo tempo à beira de uma guerra civil em suas entranhas e um conflito com o Irã fora de suas fronteiras, o que provocou irritação e descontentamento no ocidente. 

Afinal, o ocidente precisa de um Irã politicamente leal, já que se trata de um país onde deverão ser feitos grandes investimentos, especialmente no setor de petróleo e gás natural, na intenção de deslocar a Rússia para fora do mercado europeu de gás e do mercado mundial de petróleo ao mesmo tempo. Apesar disso, neste contexto, o Irã é obrigado a continuar contando com Moscou na sua confrontação com a Arábia Saudita para assegurar a própria segurança e continuar providenciando assistência militar para a Síria, Iraque e os rebeldes xiitas no Iêmen.

Agora, o altamente respeitado Institute for Gulf Affairs (instituto sediado em Washington, EUA, para estudo das relações internacionais e questões políticas e sociais no Golfo Pérsico – NT) informa que o rei saudita, Salman bin Abdulaziz Al Saud estaria preparando para renunciar ao trono em favor de seu filho Mohammad bin Salman, levando o país para a beira de um desastre.

Tudo isso significa que o rei saudita de 80 anos de idade tenta desesperadamente convencer seus irmãos da linha de sucessão a permitir que ele mude as regras de sucessão do trono saudita que ele está pronto para deixar, mas não tão pronto para permitir que seu sobrinho Mohammad bin Nayef (Ministro do Interior) governe o país. O rei alega que tudo o que está fazendo teria o objetivo “de manter a estabilidade do reino”, embora a realidade da situação seja clara – caso o rei consiga sustentar sua posição, a desintegração do país será iminente, com certas áreas de população majoritariamente xiita tentando separar-se do reino, enquanto as regiões na fronteira com o Iêmen, que são habitadas principalmente por tribos iemenitas ficarão muito contentes em voltar para casa. 

Além disso, o Ministro do Interior (príncipe coroado) é habitual usuário de cocaína, tendo sido capaz de “produzir” apenas duas filhas, e agora não é mais capaz de “produzir” crianças. Se o rei saudita conseguir finalizar o esquema acima descrito, será o primeiro monarca saudita a deixar o trono para o próprio filho.

O fato de que existe uma crise crescente no reino árabe se torna evidente quando se examinam os cortes em subsídios e bônus que o rei Salman começou a fazer no início do ano para reduzir a dependência do país da produção de petróleo. Depois de décadas de largo uso das receitas oriundas do petróleo para subsidiar os altos salários pagos pelas companhias sauditas e fornecer benefícios sociais, a queda dos preços feriu a Arábia Saudita no coração. 

Basta dizer que as receitas cm o petróleo se reduziram à metade em 2015 em comparação com anos anteriores. Analisando pelos últimos meses, não dá para dizer quem sofreu mais com a redução dos preços do petróleo. Rússia ou a própria Arábia Saudita, já que a última virtualmente não dispõe de outros setores para suportar a economia do país. O economista saudita Turki Fadaad acredita que a Arábia Saudita está tentando abandonar a política do “bem estar universal”, levando a uma mudança de posição psicológica nas mentes dos dirigentes do país. Fadaak se convenceu que o objetivo final do rei Salman é eliminar a dependência crônica da economia saudita em relação ao petróleo. Isto é factível? De acordo com a maioria dos especialistas a resposta é um eloquente e sonoro “não”, acrescida da informação de que todos os argumentos em contrário não passam de fantasia.

No início parecia que Salman, que veio ao poder depois da morte de seu irmão, Rei Abdullah, continuaria seu curso, já que depois de assumir o trono, Salman gastou generosamente 30 bilhões de dólares do orçamento em bônus para servidores civis, pessoal militar a estudantes. Além disso, os preços de bens e serviços básicos, incluindo-se combustível, eletricidade e preços da água foram rebaixados para níveis muito baixos, devido aos subsídios governamentais oriundos das receitas petrolíferas. 

No entanto, devido à queda dos preços e sob a pressão desses gastos o orçamento começou a entrar em colapso. Hoje, a coisa mais importante para o reino é fazer a transição de um sistema social extremamente generoso para uma economia produtiva, o que fará com que os súditos do reino sejam forçados a cortar os próprios gastos/custos, e parece que eles não estão propensos a concordar com a ideia. Os indícios de um iminente colapso econômico devem fazer com que Salman se apresse em seguir seu caminho para fora do trono, e é melhor sair agora, antes que os protestos comecem de verdade.

É curioso notar que a manutenção do preço do petróleo por volta de $29 dólares por barril foi o motivo que fez a Arábia Saudita de repente se tornar realista quanto ao seu próprio orçamento para o ano de 2016. No último ano, o orçamento saudita somou um débito de quase 98 bilhões de dólares, causado em grande parte pelos bônus largamente concedidos para servidores civis, pessoal militar e aposentados. Para o ano de 2016, as autoridades do país resolveram colocar 49 bilhões de dólares em um fundo de emergência que poderia então financiar projetos importantes caso o preço do petróleo continuasse baixo no futuro. Acontece que foi a própria Arábia Saudita que desde 2014 propôs a adoção de novas táticas para a OPEP, sugerindo que não haveria cortes na produção de petróleo, levando o preço, em consequência, para os níveis atuais.

Entendemos, portanto, que Riad em breve terá que escolher entre dois caminhos: ou deixa que o reino sofra um profundo e irrevogável colapso, ou dão mais poder aos jovens tecnocratas e pragmáticos que conduzirão a uma política petrolífera mais abrangente. De qualquer forma, a Arábia Saudita será forçada a colocar um fim em suas caríssimas aventuras militares na Síria e no Iêmen bem como em suas confrontações com a Rússia e o Irã.

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