Wahid Azal, 29/2/2016, "Comentários" na pág. de Pepe Escobar no Facebook, 29/2/2016
Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
De fato, é preciso gostar de novelões tragicômicos, para levar a sério o que é apresentado como 'noticiário' na mídia-empresa de massa no ocidente.
O bloco reformista-moderado que cerca o presidente Rouhani obteve 30 assentos com voto no Parlamento, em Teerã, obteve alguns avanços modestos em Isfahan (ainda menos que isso em Qom). E a mídia-empresa de massa no ocidente apresenta as eleições da 6ª-feira como se tivesse sido vitória arrasadora para os "reformistas iranianos". Nada disso.
Houve alguns ganhos modestos dos tais ditos "reformistas" – e nada além disso. A única cidade onde os ditos moderados-reformistas venceram foi Teerã – a capital, num país com mais de 12 milhões de habitantes. – O restante do Irã acompanhou os principistas e independentes. Não esqueçamos que, em 290 assentos com votos, 30 é indisfarçável pequena minoria.
Por exemplo, não ocorreu ao 'jornalismo' ocidental destacar o fato de que a população que não vive nas grandes cidades (especialmente o Irã rural), e que no total representa a maioria do eleitorado iraniano não teria motivo algum para votar a favor de políticas de privatização e economia neoliberal, como pregam os ditos "reformistas moderados". Sim, Hasan Rouhani obteve vitória significativa, ao ganhar um décimo Parlamento que será mais amigável com suas políticas que o nono; mas as eleições parlamentares não resultaram, nem de longe, em vitória 'arrasadora' do bloco reformista moderado, uma vez que o restante do Irã, sim, votou a favor dos principistas e dos independentes com tendências principistas. Claramente, alguns dos 'observadores de Irã' a serviço da mídia-empresa ocidental ou vivem numa terra do nunca infantilizada, ou, simplesmente, recebem salário para mentir.
"Conservadores", "moderados" e "reformistas" são termos que dominaram as matérias 'jornalísticas' que circulam no ocidente sobre o Irã, especialmente na cobertura das recentes eleições que aconteceram na nação do Golfo Persa essa semana. Como tudo que se encontra nos noticiosos ocidentais sobre o Irã, as análises também são 'arranjadas' para confirmar o que já circula, do que para realmente oferecer informação objetiva, e visam exclusivamente a desorientar os cidadãos iranianos sobre a política empenhadamente independente do regime iraniano revolucionário, que continua a resistir às violentas investidas do ocidente.
Como em qualquer democracia (embora a democracia iraniana seja diferente de outras), há campos políticos surgidos de inevitáveis diferenças políticas sobre como governar e outras questões. O establishment iraniano revolucionário admite todas as diferenças políticas dentro do amplo espectro da Revolução Islâmica fixados pelo fundador do Irã independente, Aiatolá Khomeini.
Assim, emergiram três linhas políticas: principistas (erradamente batizadas "conservadoras" pela mídia-empresa ocidental, porque são as mais radicais no que tenha a ver com romper completamente com o imperialismo norte-americano), reformistas e moderados.
Para alguém que examine de longe esses campos políticos, talvez pareça que os três grupos tenham projetos e fundamentos ideológicos divergentes – o que absolutamente não é verdade. Todos, basicamente, declaram-se leais e comprometidos com os princípios da Revolução Islâmica.
Os principistas (Usulgeraa) foram antes conhecidos como conservadores (muhafidh karan), mas o Imã Khamenei observou que essa designação induz a erro e implica rejeitar mudanças que alienariam esse grupo, da massa. A Revolução Islamista 'sabe' que não alcançou qualquer perfeição; portanto, mudanças são necessárias e bem-vindas. Todos os grupos iranianos trabalham a favor de mudanças.
Os reformistas tendem a abraçar ideias ocidentais, as quais, mesmo não sendo necessariamente anti-islâmicas, são apresentadas por seus opositores como incompatíveis com os ideais e objetivos radicais da Revolução Islâmica. Esses reformistas têm sido acusados, pelos opositores, de 'ocidentoxicados' [orig. westoxicated].
Por outro lado, o campo reformista acusou os principistas de serem extremamente conservadores em questões sociais e religiosas. E nesse ponto da discussão é onde entram os tais 'moderados' ou 'centristas' – que tentam consolidar as ideias dos dois campos mais aparentemente 'opostos'. Não é diferente do que se vê em sociedades capitalistas, exceto que o Irã é politicamente sociedade islâmica, e as divisões são mais políticas que ideológicas.
O Aiatolá Misbah Yazdi[1] é um dos principais ideólogos do campo principista; o ex-presidente Khatami é citado como reformista, e o presidente Rouhani como moderado. Outro ex-presidente, Rafsanjani, que já foi principista, é popular entre reformistas e moderados. Há quem o chame de "misto", em persa: porque não é nem branco nem preto, em termos políticos; talvez possa ser dito um homem pragmático.
O Supremo Líder, não raras vezes mostrado como principista 'absoluto', já trabalhou solidariamente com um governo "reformista" e trabalha agora com um governo moderado.
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Líder da Revolução Islâmica expõe o Principismo
19/6/2006, Gabinete do Supremo Líder Ali Housseini Khamenei, Teerã
"A nação e o governo iraniano conquistarão os pontos mais altos de progresso e dignidade e resolverão os problemas existentes, com unidade, fé, vigilância, racionalidade e conhecimento" – disse o Líder da Revolução Islâmica, Aiatolá Sayed Ali Khamenei, em audiência nessa 2ª-feira [at. 19/6/2006], com governantes iranianos, dentre os quais o presidente da República Islâmica, o presidente do Parlamento, o presidente do Judiciário, o presidente do Conselho dos Interesses do Sistema, membros do Gabinete, deputados do Parlamento, altos funcionários do Judiciário, comandantes militares e outras figuras políticas, culturais e religiosas de destaque.(...)
O Aiatolá Khamenei considerou maus conselheiros "tanto o excessivo otimismo quanto o excessivo pessimismo", que distorcem qualquer avaliação que se faça do país. (...)
"Além da longa lista de realizações e pontos positivos, há carências agudas e graves problemas a resolver, e todas as medidas devidas devem ser tomadas para resolvê-los" – disse o Aiatolá Khamenei.
O Líder da Revolução Islâmica destacou que criar empregos, baixar a inflação, alcançar com serviços públicos as áreas não privilegiadas, lançar programa sério para combater a corrupção, salvaguardar a segurança dos investimentos, consolidar com racionalidade o status internacional do sistema da Revolução Islâmica e purificar a imagem cultural do país são prioridades em direção às quais o Executivo e o Legislativo principistas, ao lado dos demais corpos governantes, devem dar passos decisivos e sem interrupção, perseverando na atenção aos princípios, com o devido planejamento e esforços perseverantes.
O Aiatolá Khamenei definiu como grande bênção divina a governança do país guiada pelos pilares chaves da democracia iraniana e pelo princípio da Doutrina Islâmica – conjunto de fatores e forças que chamou, em termos gerais, de "Principismo".
"O Principismo não é partido ou corrente política em confronto com outras correntes políticas. Daí que dividir grupos políticos entre 'principistas' e 'reformistas' ou variantes dessas expressões não é adequado, porque cada um e todos que se empenhem na preservação da Revolução Islâmica são principistas, não importa o nome do grupo ou partido."
O Aiatolá Khamenei apontou então os oito parâmetros do Principismo, dos quais os mais importantes são a fé e a identidade islâmica e revolucionária do Irã.
"Os governantes e os diferentes corpos culturais devem promover visão firme e profunda da fé, livre de superstições e sem se deixar desencaminhar pelas ideias oscilantes dos muito jovens e da geração que está hoje em crescimento, para consolidar a fé na religião, na revolução, no sistema revolucionário islâmico do Irã, no povo iraniano, na independência, na unidade nacional e nos seus aspectos promissores, nos corações e mentes dos iranianos" – disse o Líder da Revolução Islâmica.
O Aiatolá Khamenei invocou o verso Corânico "E argumente com eles, pelos melhores argumentos" – conclamando todos a se servirem dos melhores métodos de argumentação nas discussões com seguidores de visões diferentes. E lembrou que a fé que o Principismo convoca e promove nunca, em nenhum momento e em nenhum caso, soprará sobre as brasas do fanatismo sectário.
"Temos de apresentar a identidade islâmica sem nenhum traço de superstição e sem jamais pregar qualquer divisão, às nações e intelectuais muçulmanos, mediante inovação e exploração metódica também dos mais novos pensamentos e ideias que há no tesouro de recursos Islâmicos" – disse o Aiatolá Khamenei. – Conclamou os presentes a promoverem o Principismo em todo o mundo islâmico, sempre sob a bandeira da fraternidade de toda aUmmah [comunidade] islâmica e promovendo virtudes éticas.
O Aiatolá Khamenei criticou duramente a mentalidade distorcida que se viu no Afeganistão e que hoje [2006] se manifesta na rede terrorista no Iraque. Acrescentou que aqueles indivíduos veem o restante de humanidade como renegados, e divulgam uma imagem violenta e suja do Islã.
Disse que o verdadeiro Islã, cuja bandeira são hoje as ideias claras, novas, progressistas do falecido Imã, adoça a boca de todas as nações e manifesta fé e identidade revolucionárias verdadeiras.
Como outro parâmetro do Principismo, o Líder da Revolução Islâmica falou da justiça, acrescentando que o crescimento econômico não pode separar-se da ideia de justiça. Não faz sentido nem jamais se alcançará por aí qualquer sucesso, pensar em crescimento econômico antes, para promover a justiça depois.
Aspectos da promoção da justiça que o Aiatolá Khamenei reforçou são reduzir a desigualdade social, criar oportunidades iguais para todos, encorajar a sinceridade, punir todas as tentativas de malversar a riqueza do país, combater efetivamente contra a corrupção e o nepotismo, promover a justiça dentro do governo, sobretudo nas indicações e demissões, e jamais perder de vista as regiões não privilegiadas.
"Fazer justiça exige firmeza para decidir, nenhuma tolerância aos privilégios, relações públicas confiáveis, manter vida de moderação e equilíbrio, servir primeiro ao povo e cuidar de purificar a própria alma" – disse o Líder da Revolução Islâmica.
Outro dos parâmetros do Principismo, como o Aiatolá Khamenei os expôs é a absoluta independência do país. Qualquer corrente ou partido que não cuide incansavelmente de preservar a independência do Irã contra o polvo da cultura ocidental que nos é imposto, e que se mostre indiferente quanto à independência político-econômica do país e da nação, estará abandonando o compromisso principista.
O Aiatolá Khamenei falou ainda de estimula a autoconfiança dos iranianos em vários campos da vida, como mais um parâmetro do Principismo. Disse que é preciso trabalhar com efetivo empenho contra a autonegação imposta ao país durante décadas. (...)
"Temos de empreender grandes obras em campos científicos novos e multiplicar nossa riqueza científica, e a juventude iraniana é capaz de conquistar o que decidir conquistar, confiando nela mesma, no próprio talento, desde que o governo cuide de prover condições estimulantes e favoráveis" – disse o Aiatolá Khamenei.
Outro parâmetro do principismo, na fala do Aiatolá Khamenei, é a consolidação da liberdade e do livre pensamento. Lembrou que a liberdade é uma das grandes bênçãos divinas, da qual o livre pensamento é um dos ramos. Disse que, sem livre pensamento, o crescimento da ciência, da criação intelectual e da filosofia é impossível.
O Aiatolá Khamenei destacou a liberdade de pensamento e opinião, conclamando as autoridades nos seminários, universidades e outros centros culturais, a não reagir com escândalo ou fúria quando aparecerem indivíduos com ideias novas; que cuidem de garantir que haja condições e espaço para que ideias e pensamentos ampliem-se sempre.
Mas o Aiatolá Khamenei estabeleceu uma diferença entre a liberdade legítima e verdadeira, por um lado, e a prática de acolher qualquer pensamento ou ideia do inimigo, sob o pretexto de que assim lhes seriam garantidos supostos direitos de liberdade de expressão. Nada justifica que se permita ao inimigo disseminar pensamento envenenado.
O Aiatolá Khamenei listou também o reformismo – em sentido legítimo, como outro dos parâmetros do Principismo. Disse que reformas principistas e o Principismo reformador estão interconectados e são diferentes das reformas norte-americanas e das do deposto Xá, que nunca foram reformas, porque sempre visaram a aniquilar.
O Aiatolá Khamenei definiu a Constituição como o critério de todas as reformas; e disse que todas as reformas têm de ser orientadas por critérios e baseadas na ética e nos valores islâmicos e iranianos.
O Aiatolá Khamenei lembrou que é indispensável melhorar os métodos e escalonar os objetivos e as decisões necessárias. Disse que reformas verdadeiras são completamente diferentes de desestruturação e não admitem campanhas contra a Constituição e o Islã.
O líder da Revolução Islâmica falou do florescimento econômico do país e de melhorar as condições de vida do povo, como o oitavo parâmetro do Principismo. Acrescentou que apoiar investimentos, combater o desemprego, trabalhar para criar empregos e aumentar a produção, dar combate decidido à sonegação e à corrupção, criar regras econômicas transparentes e sustentáveis, estimular os negócios globais, dar uso positivo construtivo à riqueza que advém do petróleo e atenção harmonizada a todos os planos estratégicos do país estão entre as mais importantes questões nesse campo.
Para o Aiatolá Khamenei, a fraqueza interna e as conspirações externas também levam a graves dificuldades; acrescentou que, sim, sem dúvida, hoje a maioria dos desafios que chegam ao Irã têm origem nos grupos norte-americanos que se opõem à nação iraniana.
O Aiatolá Khamenei disse que a hegemonia mundial e o governo norte-americano consideram o Oriente Médio muito importante e têm enormes interesses nessa parte do mundo. E a nação iraniana tem sido importante defesa contra a abordagem opressora dos EUA. O estabelecimento da República Islâmica realmente enlouqueceu os EUA.
O Aiatolá Khamenei lembrou também que os EUA fracassaram no esforço para "subversão de linha dura" contra o sistema islâmico – a guerra e o embargo econômico –, além, também da "subversão soft" do sistema da Revolução Islâmica, com ataques culturais. Lembrou que as conspirações norte-americanas continuarão, mas que a nação e as autoridades imunizarão o país e o sistema da Revolução Islâmica, que colherão sucesso após sucesso, com unidade, fé, racionalidade, prudência, vigilância e colhendo todas as oportunidades.
O Aiatolá Khamenei conclamou autoridades e ativistas em diferentes campos a buscar a autopurificação, a espiritualidade e a fina gratidão pelas incontáveis bênçãos divinas; disse que essa é a principal tarefa de todos, mas especialmente dos governantes.
O Aiatolá Khamenei disse que acolhe e reconhece as bênçãos divinas e não descuida de nenhuma delas, porque o que recebemos de Deus pertence a Deus. Por isso temos de agradecer e usar o que Ele nos dá como escada para o progresso e a sublimidade. E a gratidão leva o Divino e multiplicar suas bênçãos.
O Aiatolá Khamenei deu graças a Deus pela independência e a dignidade nacional do Irã, pela juventude talentosa e entusiasmada, que ganha novas possibilidades de vida sob os auspícios do Islã e da Revolução Islâmica, pela autoconfiança nacional, pelos preciosos recursos e reservas, pelas muitas oportunidades para servir ao povo e pelo ambiente religioso do país, como algumas das incontáveis bênçãos que o Irã recebe – porque a gratidão fará crescer sempre os frutos da graça de Deus.*****
* As traduções "principismo" e "principista(s)", para Principlism e Principlists, aqui usadas, não são boas, porque "principismo", em port. do Brasil, sempre carrega traço semântico forte de "apego exagerado a princípios", no sentido de "conservador obcecado, radical" – que não é a acepção que o termo tem no original. Assim também "principista(s)", em port. do Brasil é, quase, um fanático apegado obcecadamente a princípios – que também não é a acepção que o termo tem no original. Talvez de possa falar de Contamos com os falantes do persa, para que ajudem nessas traduções. Todos os comentários e correção são bem-vindos.
Como definição de trabalho, temos que "Principismo é a doutrina sociopolítico-religiosa baseada nos ensinamentos divinos manifestados no Santo Corão, e as palavras e ensinamentos do mais nobre mensageiro de Alá, Hazrat Maomé e sua infalível família – Que Alá Reze por Eles. Aquela doutrina foi revivida na era contemporânea pelo falecido fundador da República Islâmica do Irã, Imã Khomeini e seguida por seu sucessor, o Líder da Revolução Islâmica, Aiatolá Sayed Ali Khamenei". [NTs, com informações de "Líder da Revolução Islâmica expõe o Principismo", 19/6/2006, Gabinete do Supremo Líder Ali Housseini Khamenei, Teerã, em http://leader.ir/en/content/ 3533/IR-Leader-expounds- Principismo (excertos adiante)].
[1] Para opinião posta em termos diferentes, não necessariamente mais claros, ver "Entenda: o Irã está votando", 26/2/2016, Pepe Escobar, RT, traduzido no Blog do Alok [NTs].
Já não confio desde que li a entrevista com coronel Remer:
ResponderExcluirhttp://radioislam.org/remer/portugu.htm
Richard - MS