sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Entenda: o Irã está votando, por Pepe Escobar

26/2/2016, Pepe Escobar, RT


Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu



As eleições parlamentares no Irã, essa semana, são crucialmente importantes, porque determinarão se a abertura ao estilo persa conduzida pelo presidente Hassan Rouhani – e ministro das Relações Exteriores Javad Zarif – poderá prosseguir, apoiada por Parlamento (Majlis) favorável. 


As eleições do Irã não mobilizaram só importantes atores políticos, como o presidente [Mohammad] Khatami, do"diálogo das civilizações" e o imensamente controverso presidente [Mahmoud] Ahmadinejad; as eleições para o Parlamento atingem uma infinidade de facções envolvidas em complexas alianças praticamente inabordáveis por observadores externos.

Estão em jogo os frutos que o business e o país podem colher depois do acordo nuclear e do fim das sanções da ONU e da União Europeia (importantes sanções impostas pelos EUA não foram levantadas); a integração progressiva do Irã nas Novas Rotas da Seda puxadas pela China; a estratégia do Irã para recuperar sua fatia de mercado no comércio global de petróleo, combinada aos investimentos gigantescos necessários para modernizar a indústria iraniana de energia; acordos e mais acordos assinados com parceiros europeus – para nem falar dos asiáticos; a total, não apenas parcial, reentrada do Irã nos mercados consumidores globais e, por fim, mas não menos importante, um passo avante que pode vir a revelar-se decisivo na direção da reeleição de Rouhani nas próximas eleições presidenciais.

Assim sendo, esqueçam a conhecida e proverbialmente patética empenhada ação para desinformar o ocidente, especialmente a já corriqueira demonização – pelos neoconservadores e sionistas nos EUA – de tudo que tenha a ver com o Irã. Leia aqui mesmo o que é necessário saber para poder realmente avaliar o que as eleições parlamentares iranianas trarão.


O comparecimento às urnas é importante?


É. Nas eleições parlamentares de 2012, 64% do eleitorado votou. Quanto mais clara a aprovação pelos eleitores ao sistema Rouhani, melhor.


Como funcionam as eleições?


O nome do jogo é "listas". Na cabeça das listas aparecem personagens pop. Os eleitores escolhem, em larga medida, baseados no apelo que tenha o nome que encabeça a lista.


Haverá candidatos reformistas?



Alguns – embora uns poucos dentre os mais populares tenham sido impedidos de concorrer. O super-reformista e ex-presidente Khatami foi banido da mídia iraniana oficial. Mas Khatami distribuiu um vídeo importante, no qual exorta os eleitores a votar na lista dos reformistas.


Como é a disputa em Teerã?


Disputa gigante: nada menos de 1.121 candidatos concorrendo a 30 assentos parlamentares.



Quem são os favoritos?



Dentre os reformistas, Mohammad Reza Aref, vice-presidente de Khatami, de 2001 a 2005. Não concorreu às eleições presidenciais de 2013 – por sugestão de Khatami –, e sua ausência abriu caminho para a vitória de Rouhani. Essencialmente, é moderado. Há também Kazem Jalali, membro de uma facção conservadora, "Seguidores do Líder".



Há algum tipo de frente unida anti-linha-dura?



Com certeza, sim. Reúne os reformistas; todos os tipos de apoiadores de Rouhani e Zarif; os conservadores moderados (grupo no qual se inclui o poderoso presidente do Parlamento, Ali Larijani); e os supracitados "Seguidores do Líder".



E quanto aos conservadores?



Não percam de vista Gholam-Ali Haddad-Adel, principal conselheiro do Supremo Líder Aiatolá Ali Khamenei; a filha dele é casada com o filho de Khamenei, Mojtaba; encabeça a lista de 30 candidatos dos conservadores de Teerã.

Todos são conservadores?



De fato, não. A lista deles reúne nomes linha-dura – como Hojattoleslam Morteza Agha-Tehrani (ex-conselheiro de Ahmadinejad) e Ismail Kowsari (membro chave do Conselho Nacional de Segurança e da Comissão de Política Exterior). Fato chave é que não gostam nada-nada da abertura de Rouhani.



Essas eleições mudarão a política exterior de Rouhani?



Não.



As eleições interferirão no acordo nuclear de Viena?



Não.



Assim sendo, o que realmente importa, de fato?



O que realmente importa são as eleições para a Assembleia dos Especialistas – paralelas às eleições para o Parlamento.



Por quê?



Porque os 88 membros da Assembleia dos Especialistas, segundo a Constituição do Irã, escolhem o futuro Supremo Líder. Khamenei está com 76, melhorou de saúde, mas há alta probabilidade de que a Assembleia eleita agora – com mandato de oito anos – venha a ter de escolher o futuro Supremo Líder.



Quem concorre?



Há uma lista de 16 nomes reformistas liderada pelo famoso Aiatolá Hashemi Rafsanjani, codinome "O Tubarão", intitulada "Especialistas do Povo". Inclui o próprio presidente – Rouhani –, e um ex-ministro da Inteligência de Rouhani, Seyed Mahmoud Alavi.



Quem foi excluído?



Outro grande nome, Hassan Khomeini, neto do Aiatolá Khomeini. É muito popular no Irã. As razões de ter sido excluído das eleições são ainda quase impenetráveis. O que mais intriga é que os cartazes de propaganda eleitoral dessa lista "Especialistas do Povo" mostram Rafsanjani, Khamenei, Rouhani e Hassan Khomeini rezando juntos. Isso, em termos iranianos, é como pedir votos para os Rolling Stones tocando Satisfaction.



E quanto aos conservadores?



Ativos, a pleno vapor. Têm duas listas – uma delas apresentada pela Sociedade (crucialmente importante) dos Professores do Seminário de Qom, de clérigos muito conservadores. Importante é que as duas listas aparecem recheadas de nomes dos linha-dura de alto escalão – como o Presidente do Conselho dos Guardiões Aiatolá Jannati; o linha-dura super hardcore Aiatolá Mesbah Yazdi; e o atual presidente da Assembleia e secretário da Sociedade dos Professores de Seminário, Mohammad Yazdi. E há até uma terceira lista.



Do que, afinal, se trata?



É batalha camuflada entre "O Tubarão" Rafsanjani e os ultra-linha-ultra-dura. É útil lembrar que Rafsanjani – o mais íntimo dos conselheiros do Aiatolá Khomeini – foi decisivo para eleger Khamenei ao posto de Supremo Líder. Já presidiu a Assembleia dos Especialistas, de 2007 a 2011.



E se os linha-dura vencerem?



Nesse caso, pode acontecer de elegerem um linha-dura ao posto de Supremo Líder. Não é bom. Rafsanjani, dadas as atuais circunstâncias, é escolha mais progressista, considerando que nunca demonizou os líderes do 'movimento verde' e tem enfrentado diretamente os linha-dura.



O Supremo Líder manifestou-se?



Não. É o árbitro.



E quanto aos Guardas Revolucionários?



Tendem na direção de candidatos linha-dura; crucialmente, querem alguém que não trema diante de Washington, Telavive e Riad.   



Essas eleições são etapa decisiva para o Irã, na trajetória para converter-se em próxima grande história global de sucesso?



Claro que sim. Mas preferentemente, em futuro próximo, garantindo a Rouhani mais um mandato, e sem algum linha-duríssima como Supremo Líder.*****

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