quinta-feira, 31 de março de 2016

Ataque sempre o país errado, por Dmitri Orlov


Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu


Há incontáveis táticas acessíveis aos que visam a tornar os problemas sempre piores, ao mesmo tempo em que fingem que os estariam resolvendo, mas apontar para qualquer outro lado é sempre a tática preferida. O motivo pelo qual tanto se interessam em tornar piores os problemas é que problemas sempre geram lucros – para alguém. E o motivo pelo qual tanto fingem que os resolvem está em que causar problemas e, em seguida, piorá-los, expõe os que lucram no pioramento como gente ruim, o que é mau.

Na arena internacional, esse tipo de mira aparentemente desencaminhada tende a assumir aspecto farsesco. Os que lucram no pioramento dos problemas do mundo são os membros dos establishments da política exterior e das forças armadas dos EUA, empresas fornecedoras da Defesa e políticos em todo o mundo, especialmente na União Europeia, que aqueles establishments já subornaram para que nada façam. A tática de mira desencaminhada é condicionada por um tique que se observa na opinião pública norte-americana, pelo qual ninguém, ali, se preocupa muito com o que se passe no resto do mundo. 

O cidadão norte-americano médio não tem nem ideia de onde ficam inúmeros países; confunde Suécia e Suíça; acha que o Irã é árabe; e confunde, como se fossem um só, todos os países que terminam em -stão. Tudo isso se somou, e o truque sempre à mão por lá evoluiu. Hoje se resume ao seguinte provérbio: "Ataque sempre o país errado." 

Querem alguns exemplos? Depois do 11/9, que, segundo a história oficial (provavelmente, só nonsense), foi ato de "suicidas-bombas" (alguns/as dos/as quais, é engraçado, continuam perfeitamente vivos/as até hoje), vindos na maioria da Arábia Saudita. Na retaliação, os EUA atacaram o/a Afeganistão-e-Iraque.

Quando irrompeu a Primavera Árabe (porque uma onda de calor na Rússia fizera subir muito os preços do trigo), o alvo óbvio para concentrar esforços e evitar consequências muito ruins para toda a região seria o Egito – o mais populoso dentre os países árabes. Assim sendo, EUA e OTAN decidiram atacar a Líbia.

Quando as coisas azedaram da Ucrânia, cujo vacilante governo não conseguia decidir se queria permanecer com a Rússia, sua tradicional parceira comercial, na mesma União Alfandegária, ou jogar as próprias fichas no lixo e assinar um acordo com a União Europeia baseado em promessas (naquele momento, vagas; imediatamente depois, traídas) de cooperação econômica, o lugar óbvio ao qual ir e tentar consertar as coisas era a Ucrânia. Assim sendo EUA e União Europeia resolveram ir e tentar arrumar as coisas na Rússia, apesar de a Rússia não estar apresentando problemas especificamente graves de desarrumação. 

A Rússia não gostou; e não é país que se cutuque com vara curta. Assim sendo, em resposta, os EUA e União Europeia infligiram dor severa nos próprios agricultores-tablishment da União Europeia.

O errado ficou sobejamente claro, tão logo os ucranianos que deram jeito de assumir o poder (incluídos neonazistas muito imundos) começaram a violar os direitos da maioria dos ucranianos falantes de russo, inclusive com massacres, o que levou grande número de russos a organizar referendos e a votar a favor de se separarem da Ucrânia. 

(Talvez meus leitores não saibam, mas a maioria dos ucranianos são falantes de russo; só há uma cidade no país inteiro – Lvov – onde a língua mais falada é o ucraniano. Vejam... acho a língua ucraniana muito linda, e sempre me soa engraçada quando ouço. Mas nunca me preocupei com falar ucraniano, porque qualquer ucraniano com QI acima da temperatura de banho de banheira compreende russo.) 

Assim sendo, EUA e União Europeia decidiram, para ir e tentar arrumar as coisas, continuar a pressionar sempre, sem parar, a Rússia.

Quando a Rússia pôs-se a insistir em solução política, não militar, para a crise na Ucrânia, e ajudou a negociar os tratados de Minsk com Ucrânia, França e Alemanha, coisa semelhante aconteceu. Aqueles acordos obrigavam o governo ucraniano a aprovar e implantar reformas constitucionais para assegurar a autonomia às regiões de russos no ocidente. O governo ucraniano recusou-se a cumprir os acordos. Assim sendo EUA e União Europeia puseram-se a pressionar o governo da Rússia.

Quando um grupo repugnante de terroristas autodenominados ISIS e constituído de extremistas salafistas takfiris começaram a tomar o poder em grandes áreas do Iraque, de onde se espalharam para a Síria, tornou-se indispensável tomar alguma atitude. Aqueles terroristas eram financiados pela Turquia (que até hoje continua a comprar petróleo deles e lhes dá abrigo em seu território) e pela Arábia Saudita. Assim sendo, EUA e OTAN decidiram pressionar a Síria.

Diante de tal e tão completa imbecilidade, a Rússia então decidiu agir mesmo e consertar pelo menos algo que estava sendo realmente esfacelado: a Síria. Agora, a Síria já está em recuperação, e, em Washington, membros da Descoordenadoria para Ações Que Dão Errado lá estão, coçando a cabeça.

Até aqui, ainda vai. Mas esse método de resolver os problemas tornando-os sempre piores tem, definitivamente, mais baixos que altos.

Para começar, sempre aconteceu de alguns cantões, mesmo os mais simplórios, mais geograficamente mal estacionados, da população, começam a perceber o que se passa. E começam a não querer reeleger candidatos do establishment. Rapidamente, se vai tornando cada dia mais difícil manter em operação a Descoordenadoria de Ações, porque o pessoal indispensável para descoordenar não é nem eleito nem reeleito e então (horror dos horrores!) pode acontecer até de ser eleito alguém que realmente se ponha a trabalhar para resolver – não para piorar – um problema.

Além disso, insistir em piorar os problemas mediante o recurso estratégico de sempre atacar o país errado quase sempre faz aumentar ensandecidamente o número de problemas, até que tudo fique totalmente fora de controle. Por exemplo, tomemos o recente grande ataque terrorista em Bruxelas, a poucos passos do quartel-general da OTAN, do qual o ISIS reivindicou os créditos. 

Recentemente, a Europa enfrenta influxo de grande escala de pessoas vindas do Oriente Médio e Norte da África, obrigados a deixar a própria casa e a própria terra por causa de atos prévios de Descoordenação e Pioramento de problemas, e bom número dessas pessoas expulsas da própria casa e da própria terra são terroristas do ISIS. Assim sendo, para se autoproteger, a OTAN está planejando combater contra o ISIS na Europa. 

Também não há quem não saiba que o influxo de emigrados para a Europa foi orquestrado pela Turquia. Assim sendo, a União Europeia decidiu, para pressionar, entregar bilhões de euros à Turquia e informar a Turquia que ela será bem-vinda como membro da União Europeia.

Por fim, esse padrão mantém uma aceleração que, com o tempo, torna-se mais e mais difícil de deter. Começa como apenas um grupo de plutocratas que praticam atos inacreditavelmente ignóbeis e sigilosos, mas muito lucrativos; na sequência grupo ainda maior de plutocratas faz coisas também inacreditavelmente ignóbeis, mas já completamente idiotas, autoincriminatórias, horrivelmente embaraçosas; e depois, já perto do fim, um grupo realmente gigante de plutocratas já está fazendo coisas totalmente suicidárias – mas ninguém consegue parar de fazer. 

Cabe a cada um de nós decidir, por nossa conta e risco e por nossos próprios meios, quando se entra nessa fase final. Pessoalmente, acho que não está longe.*****

Nenhum comentário:

Postar um comentário