terça-feira, 10 de maio de 2016

A nova normalidade: Guerra Fria 2.0, por Pepe Escobar

5/6/2016, Pepe Escobar, SputnikNews

Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu



Todos estamos vivendo tempos de Guerra Híbrida. Da R2P ("responsabilidade para proteger") às 'revoluções coloridas'; de ataques a moedas, a manipulação no mercado de ações.


De golpes 'brandos' organizados e perpetrados pelo complexo judiciário-financeiro-político-midiático – como se vê hoje em andamento no Brasil – a apoio a jihadistas 'moderados', estágios variados de Guerra Híbrida operam hoje a polinização cruzada de vários vírus e geram uma máquina operada por vírus mutantes.



O conceito de Guerra Híbrida, concebido na Av. Beltway em Washington, já foi virado de pernas para o ar pelos próprios conceptualizadores. 



A OTAN, fingindo surpresa até por o conceito existir, interpreta o que chama de "invasão" da Ucrânia pelos russos, como Guerra Híbrida. Assim, os teóricos iniciais criadores da Guerra Híbrida, como a corporação RAND, recebem alvará para avançar, inventando cenários de jogos de guerra nos quais a Rússia seria capaz de invadir e ocupar os estados do Báltico – Estônia, Latvia, e Lituânia – em menos de 60 horas.




E de cenário inventado em cenário inventado, vai aumentando cada vez mais a histeria militar ocidental concentrada agora no novo comandante da OTAN, conhecido como "Dr. Fantástico", general Gen. Curtis Scaparrotti, que providenciou para fazer sua entrada de modo que não envergonhasse seu predecessor no cargo no cargo, Breedlove/BreedÓDIO.



Pode-se dizer que quase achando graça em todo aquele circo conceitual, os russos respondem com ações. Mandaram ainda mais soldados para perto da fronteira ocidental da Rússia? OK. Aqui vai nossa resposta assimétricapara vocês. E, não demora, deem bom-dia também ao nosso novo brinquedinho: os S-500s.



O que Hillary quer



A noção de que Moscou teria qualquer interesse em capturar estados bálticos é ridícula em si. Mas caso é que, ante os miseráveis fracassos da ocupação direta do Afeganistão (os Talibã jamais sairão de lá) e da 'responsabilidade de proteger' a Líbia (que é hoje estado falhado devastado por milícias incontroláveis), a  OTAN está desesperadamente carente de algum "sucesso". É onde entre a retórica belicista e a manipulação dos conceitos – e, isso, quando Washington já está realmente distribuindo ações de Guerra Híbrida por todo o tabuleiro.



A realidade acontece por trás do espelho da OTAN. A Rússia está muito à frente do Pentágono/OTAN "anti-acesso/área proibida" [ing. anti-access/area denial, A2AD]: os mísseis e submarinos russos podem facilmente impedir que jatos de ataque da OTAN voem na Europa Central e que navios da OTAN "patrulhem" o Mar Báltico. É coisa que dói fundo na "nação indispensável" – dói mesmo! 



A histeria retórica incansável mascara o jogo de apostas muito altas que está em curso. E é onde entra a candidata Hillary Clinton, que disputa a presidência dos EUA. Ao longo de toda sua campanha, Clinton não se cansa de promover "um alto objetivo estratégico de nossa aliança transatlântica ". O tal "alto objetivo estratégico" é precisamente a Parceria Trans-Atlântico para Comércio e Investimento [ing. Transatlantic Trade and Investment Partnership (TTIP)] – uma OTAN-no-comércio para complementar a OTAN política e militar.




O fato de a parceria TTIP, depois dos recentes vazamentos holandeses, correr agora o risco de se afundar em território dos Mortos Vivos pode ser revés apenas temporário. O "projeto" imperial é claro; configurar a OTAN, que já foi convertida em Robocop global (Afeganistão, Líbia, Síria), numa aliança político-econômico-comercial integrada. Sempre, é claro, sob comando de Washington. E incluindo vassalos/contribuidores periféricos chaves, como as petromonarquias do Golfo e Israel.

O "inimigo" imperial, é claro, terá de ser o único projeto autêntico disponível para o século 21: a integração da Eurásia – que vai das Novas Rotas da Seda puxadas pelos chineses, à União Europeia puxada pela Rússia; à integração dos BRICS, que inclui o seu Novo Banco de Desenvolvimento, atuando em harmonia com o Banco Chinês-Asiático para Investimento e Infraestrutura [ing. Infrastructure Investment Bank (AIIB)]; um Irã ressurgente e ainda independente conectado à Eurásia; e todos os demais polos independentes do Movimento dos Não Alinhados (MNA).


Essa é a derradeira confrontação, em curso no século 21, que assumirá múltiplas formas, localizadas, de Guerra Híbrida – como está acontecendo não só em toda a Eurásia mas também em todo o Sul Global. Tudo está interconectado – de Maidan às negociações secretas da parceria TTIP; de provocar a China no Mar do Sul da China a uma guerra dos preços do petróleo e um ataque contra o rublo; de espionagem da Agência de Segurança Nacional dos EUA contra a Petrobrás brasileira até alimentar golpe 'legalista', em câmara lenta, para forçar mudança de regime ("golpe") no Brasil; e a União Europeia assolada por duas pragas provocadas: uma crise de refugiados (provocada pelas guerras da OTAN (e instrumentalizada pela Turquia) até o terrorismo salafista-jihadista também cevado e disseminado pelas mesmas guerras da mesma OTAN.



Mesmo com França e Alemanha ainda vacilantes – e já pagando preço altíssimo pelas sanções contra a Rússia – o "projeto" de Washington depende de uma União Europeia sempre ameaçada e mantida como refém perpétua da OTAN. E, afinal, como refém da OTAN no comércio – por causa daqueles imperativos geoestratégicos dos EUA contra a integração da Eurásia.



Tudo isso implica outra necessidade: a guerra conceitual – quem faz Guerra Híbrida são os malditos russos, não nós – tem de ser vencida a qualquer custo, para que o cidadão europeu médio viva acossado por medo perene. Paralelamente, é também essencial fazer o espetáculo completo: daí uma das mais massivas operações militares planejadas pelos EUA em solo europeu desde o fim da Guerra Fria – complete, com Marinha e Força Aérea exibindo suas capacidades nucleares.


Aí está o novo normal: Guerra Fria 2.0, 24h por dia, 7dias por semana.*****


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