Agora se põem a 'denunciar' Trump e Sanders, para fazerem-se de salvadores
8/5/2016, Anis Shivani, Salon (apud Naked Capitalism)
8/5/2016, Anis Shivani, Salon (apud Naked Capitalism)
Entreouvido na Vila Vudu:
Aplicado ao golpe Brasil-2016, pode-se dizer o mesmo: "Elites sórdidas desgraçaram o Brasil. Agora se puseram a 'denunciar' Cunha/Maranhão como se esses fossem os únicos responsáveis pelo golpe para derrubar Dilma: queimam arquivos, para fazerem-se de salvadores".
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Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
Essa semana, na noite da primária de Indiana, li [New York Review] um dos mais repugnantes artigos políticos em que tive a infelicidade de tropeçar.
Foi um 'sinal de alarme', disparado por Andrew Sullivan, provavelmente o mais consumado hipócrita de toda a era Bush (ao lado de Christopher Hitchens, parceiro dele em inúmeros crimes; lembram-se do "islamofascismo"?). Sullivan declara que a eleição de Trump seria evento de nível "de extinção total" ["Democracias morrem, se são democráticas demais", New York Times, 1/5/2016]. OK. Talvez seja.
Mas a extinção que mais preocupa Sullivan é, claramente, a extinção das elites linha dura, nas quais ele está incluído, que sempre darão importância zero aos seres humanos comuns que não encontram emprego e que vivem nas piores condições de moradia que os EUA jamais vimos, e que estão tão desesperados à procura de uma saída da armadilha fatal em que foram metidos, que, para eles, até um sujeito como Trump começa a parecer racional.
Esse sinal pânico de alerta, construído para pôr todos os eleitores em rebanho organizado sob o comando de Hillary, é disparado hoje pelo homem que pôs fim à [revista] The New Republic como os EUA a conhecemos (que morreu então e, depois, morreu outra vez); que promoveu o dogma racista e imperialista durante o tempo em que comandou a revista nos anos 1990s; e que, em seguida, sondando o vento com o dedo (o que, para ele e para o arqui-hipócrita parceiro dele Hitchens significaria ser como George Orwell), converteu-se num dos mais ferrenhos propagandistas da guerra 'ao terror', da guerra do Iraque, do pacote completo de todas as guerras, sempre empenhado em denunciar a 5ª-coluna que haveria dentro dos EUA. Esse suposto jornalista, que jamais manifestou qualquer consistência no campo da esquerda, que só faz seguir caninamente qualquer um que lhe pareça ter qualquer poder em cada momento, dedica-se agora a 'alertar' os cidadãos norte-americanos contra ameaça mortal que seria Trump.
Não. O verdadeiro perigo que cresce hoje contra os cidadãos norte-americanos são as elites, as elites que converteram o processo democrático em piada; sempre tão pervertidas que envenenaram tão fundo as raízes da democracia nos EUA que, agora, todo o prédio está desabando (para consternação das mesmas elites).
Nos EUA, os dois partidos estão hoje em fase terminal de decadência, depois de 40 anos de darem as costas às dificuldades do trabalhador médio (os Republicanos já admitem que estão na UTI; os Democratas, pedindo que Sanders renuncie à disputa pela presidência também já estão bem perto de admitir que já apresentam sintomas da mesma peste). E os eleitores, de direita e de esquerda, afinal – e é como um suspiro de alívio e um alento – desistiram de dar atenção às distrações ditas 'culturais' que, até hoje, serviram para manter no poder aquelas elites.
Não. Os eleitores norte-americano foram empurrados ao mais completo desespero. Querem de volta os seus empregos, ainda que isso implique construir uma muralha para manter longe os muçulmanos; deportar os sem-documentos e iniciar guerras contra China e Japão – porque é tudo que aquelas elites lhes ofereceram. Até hoje aquelas elites opõem-se até a garantir um salário mínimo que permita sobreviver!
Pois Sullivan chega e diz a coisa com todas as letras: as coisas estão assim tão ruins, por causa do excesso de democracia, democracia demais! Exatamente o perigo interno que tanto tem assustado as elites norte-americanas nos dois partidos desde a "crise de excesso de democracia" em meados dos anos 1970s. É o mesmo lamento que os mestres de Sullivan na mesma torre de marfim, Samuel P. Huntington e outros, só fazem gritar cada vez mais alto desde que assumiram, como tarefa sua, pôr fim, para sempre, à exuberância e à eclosão de vida dos anos 1960s e começos dos 1970s.
Foi quando conceberam a revolução neoliberal, para pôr no comando, firmemente, elites "qualificadas", "letradas", "competentes", e o único modo de fazer o que queriam, como queriam, não suportaria a imprevisibilidade da democracia realmente ativada e a força de qualquer individualidade pró-democracia. E quem poderia aparecer, mais exemplarmente imprevisível que Trump?
Problema é que o planejamento daquelas elites previa certo 'distanciamento', certa "racionalidade", tão eficiente quanto qualquer sistema totalitário na missão de manter afastados os que não se encaixem no 'molde' do político 'capacitado para governar' com sucesso.
Então já se sabe: o problema, segundo as elites norte-americanas é excesso de democracia. Graças a você, Andrew Sullivan, nenhum graduado em Humanidades – e todo aquele Platão que você tanto cita! – jamais se prestou a serviço mais sujo, nos 400 anos de história da Harvard University.
Você, Andrew Sullivan e seus asseclas dentro do Partido Democrata, que tanto querem que os apoiadores de Bernie joguemos nosso peso a favor de Hillary Clinton – a candidata mais comprometida que jamais pediu votos a eleitores Democratas em todos os tempos –, vocês, que tanto se preocupam por causa do muro e da segregação de muçulmanos e o ataque às liberdades civis, será que poderiam, por favor, informar aos Democratas quem, afinal, começou tudo isso?! Foram vocês! Foram vocês mesmos!
Todos vocês, a elite Think-tank-plutocrática dos dois lados, nos dois partidos norte-americanos, repentinamente viraram nostálgicos de George W. Bush!
Porque Bush não usava – pelo menos, não sempre! – o vocabulário cru e violento e claro que Trump prefere para demonizar mexicanos e árabes e estrangeiros em geral. Mas Bush é o único que realmente implementou – com irrestrito apoio das elites Think-tank-plutocráticas! –planos para vigiar, discriminar contra (nos procedimentos para imigração), e realmente impor barreira intransponível contra muçulmanos que viessem "dos países errados". Tudo aquilo continua a existir hoje, em governo Democrata de Barack Obama – e pesa duramente contra muçulmanos que possam ter interesse em emigrar para nosso país.
Onde estavam vocês, elites, quando Barack Obama, Hillary Clinton e a elite do Partido Democrata falavam a mesma voz que os Republicanos, sempre sobre o mesmo assunto: fortalecer cada vez mais a 'segurança' das fronteiras; sobre a necessidade de se aprovarem leis duríssimas contra imigrantes, e propunham medidas tão inacreditavelmente punitivas contra qualquer tentativa de legalização, que a 'democracia' dos Democratas passou a só ser pensável em teoria, não mais na realidade?
Conclusão óbvia dessas ideias é o muro literal. Mas não foi Trump quem começou. Ele apenas deu os toques finais no discurso que vocês – elites norte-americanas distribuídas nos dois partidos – já havia incendiado e mantido em chamas durante mais de vinte anos.
Quem iniciou a demonização dos imigrantes foi Bill Clinton. Os imigrantes legais não mais se qualificavam para qualquer dos benefícios sociais – pela primeira vez desde a liberação das leis de imigração em 1965! Bill Clinton pôs fim ao estado de bem-estar, sempre batendo no discurso racista contra afro-norte-americanos, e excluiu para sempre milhões de pessoas, da rede de proteção social nesse país. Não, não. Quem começou tudo isso não foi Trump. Foram Paul Begala e Karl Rove – representantes dos dois partidos norte-americanos e dos interesses da mesma elite – que envenenaram os discursos.
Elites dos dois partidos insistiram em que não se tocassem na raiz das causas da insatisfação social ante os problemas econômicos. Daí nasceram e prosperaram o discurso e a candidatura de Trump, já prevista, de fato, há muito tempo.
Paul Krugman, comparsa de Hillary, nunca passou de neoliberal cujas 'receitas' sempre preservam os parâmetros ortodoxos mais estritos. Pois nos anos Bush e Obama inventaram que esse personagem seria alguma espécie de perigoso agitador de esquerda! Mas não porque Krugman algum dia tivesse pregado qualquer das medidas ditas "radicais" que Bernie prega hoje, para promover justiça e igualdade econômico-social. Ah, não, não, Krugman foi sempre fiel à mais ortodoxa das ortodoxias da profissão de economista. Pois, hoje, o homem aí está, ofendidíssimo porque Trump já chegou tão longe!
Mas os mais agressivos são, hoje, os guerreiros da guerra cultural da suposta esquerda norte-americana, que diariamente inventam mais uma nova batalha a batalhar, contra ofensas ditas culturais que Trump teria cometido – e que nada têm a ver com a vida das pessoas comuns mas, no máximo, com sensibilidades hiper-mega-over sensíveis que só existem nas ecosferas da Academia, das editoras comerciais e da mídia-empresa.
Os apoiadores de Hillary têm a mentalidade autoritária de pequenos proprietários. São a imagem especular dos apoiadores "realistas" de Trump; a diferença é que os apoiadores de Trump não ultrapassam as faixas médias de renda e estão inseguros, ansiosos; e os apoiadores de Hillary ocupam faixas de renda acima da média, são prósperos; mas nem por isso menos inseguros.
Para manipular todos esses, as elites Democratas e Republicanas jogaram jogo duplo, todas elas, durante 40 anos e até agora conseguiram safar-se. Aquelas elites assumiram para elas, bem compreensivelmente, todo o poder político e econômico. Perverteram a livre imprensa comercial e até os mais básicos processos democráticos, como garantir transparência aos votos de quem vote em eleições.
Elites nos dois partidos colaboraram para arquitetar uma revolução de declínio econômico para os trabalhadores, até que a situação alcançou proporções já completamente insuportáveis. O mercado de ações talvez vá bem, e o desemprego talvez até esteja teoricamente baixo, mas as pessoas não conseguem pagar para comer e morar, não conseguem pagar as dívidas do crédito educativo e outras dívidas.
A vida desses norte-americanos nesse país que já nem nós mesmos reconhecemos, está repleta de tal miséria, de tais sofrimentos, que já não há sequer uma palavra do que digam candidatos como Hillary Clinton ou Jeb Bush que faça sentido para os cidadãos.
Agora, acredito sinceramente, não há nem um réis de mel coado de diferença entre eles. Quando realmente havia diferença, e escolher entre eles efetivamente fazia diferença – vale dizer, os progressistas claramente escolhiam Bernie, não Hillary, e Bernie tinha vantagem equivalente ao dobro do que Hillary tem hoje – as elites correram para o lado de Hillary, mesmo sabendo que Hillary implica o risco muito maior de pôr Trump na presidência dos EUA. E agora querem que nós prestemos atenção aos gritos de pânico de vocês?
Para as elites, o jogo acabou. E acabou, não importa o que aconteça com a campanha de Sanders. O partido Republicano como o conhecíamos desde o consenso de Reagan (nos idos de 1976) acabou. O partido Democrata ainda não sabe, mas o neoliberalismo de Bill Clinton (e o que veio depois, na cumplicidade com Bush júnior, e na continuação das políticas imperialistas de Bush júnior com Barack Obama) também está acabado, ou já muito avançado na trilha rumo ao fim.
As elites estão em estado de pânico cataclísmico, não sabem para onde se viram, se para a direita, se para a esquerda, não têm ideia de o que fazer com Trump, não sabem o que fazer com seguidores de Bernie que resistem a se deixaram imolar; não têm nem ideia de como montar outra vez as peças de Humpty Dumpty.
E essas mesmas elites, sejam de esquerda sejam conservadoras, os mesmos jornalistas e celebridades, sempre tão confortáveis ao lado de Bush, tão logo começou a guerra ao terror? Essas, logo se acostumarão também com Trump. O nível dessa escalada fascista logo estará sendo apresentado por The Times e outras instituições, como algo com que nossa democracia poderia facilmente lidar, assim como passaram aqueles oito anos macabros sempre a repetir que nossa democracia facilmente daria conta de Bush.
Nós, os cidadãos, nem precisamos sujar as mãos no serviço de implementar controles e equilibrações [ing. checks and balances]; as elites terão máximo prazer de trabalhar por nós, em nosso nome. Adiante, tão logo ele comece a conversar com as elites, já ninguém nem sentirá assim tanto medo de Trump. Calma, ele já disse que quer fazer a América grande novamente! Que problema haveria nisso?
A eleição de Trump porá fim ao partido Republicano como os EUA o conhecemos, mas, e muito mais estimulante, também porá fim ao partido Democrata como os EUA o conhecemos. Os limites da esquerda acadêmica e do serviço de usar seus discursos supostos "culturais" para manter controlada a insatisfação com a economia também aparecerão à vista de todos. Trump ameaça a estabilidade do discurso belicista de Sullivan e de sua gangue. Trump, de fato, ameaça o monopólio da narrativa, que até hoje as elites sempre tiveram firmemente nas mãos: aí está a verdadeira causa de pânico.
Oh, Hillary, tenha boa sorte com suas respostas programadas por pesquisas de comportamento, como robô, na luta contra Trump. Cada uma das "ofensas" calculadas que se planejam aí contra a agressividade de Trump contra mulheres, contra minorias, contra muçulmanos... terão o mesmo sucesso que as "ofensas" calculadas pelos marketeiros políticos que trabalharam para os 16 Republicanos que Trump já atropelou até agora.
Não, Hillary, você não derrotará Trump, porque você não sabe dizer a verdade; a única língua que você conhece é esse papo-fraco das elites.
Trump tampouco diz a verdade, mas ele responde a algo que captou no ar e que tem um grão de verdade. Você, Hillary, nem isso! Você só fala a EUA – meritocráticos, democráticos, pluralistas – que não existem.*****
Seria menos pernicioso que Trump vencesse do que a hilária assassina, mas ela vencerá porque é o dinheiro que vence eleições e a fortuna de Trump são trocados perto do financiamento do mais do mesmo: BillClinton, Bush, Obama e a besta Clinton
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