11/1/2018, The Saker, Unz Review
Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
Apenas uns poucos dias depois de Donald Trump completar um ano como presidente dos EUA, acho que é razoável dizer que praticamente todo mundo, exceto os neoconservadores e alguns poucos apoiadores incondicionais, sentem-se muito assustados ante o que o ano que passou fez aos EUA e ao planeta. Os que odiavam Trump não o odeiam menos, e os que depositaram alguma esperança em Trump, como eu mesmo, têm hoje de aceitar que nada do que esperaram jamais se materializou. Acho que se imaginarmos um governo Hillary, a palavra "o mal" descreveria bem o que seria tal governo, muito provavelmente.
Por sua vez, se eu tivesse de escolher uma palavra para descrever o governo Trump, pelo menos até hoje, essa palavra teria de ser "estupidez". E nem me darei o trabalho, como planejara, de listar todas as coisas estúpidas que Trump disse e fez desde a posse (os que pensem de outro modo podem parar de ler bem aqui).
Devo dizer que não tenho qualquer prazer em escrever o que escrevo, porque eu também acalentei esperanças de que Trump cumpriria pelo menos algumas das promessas de campanha (ainda que praticamente todo o meu apoio a ele adviesse do fato de ele não ser Hillary, a qual, como continuo convencido até hoje, teria empurrado EUA e Rússia para a guerra, um país contra o outro). Além disso, cada vez que relembro o discurso de Trump na posse, tenho essa dolorosa sensação de oportunidade única e totalmente desperdiçada: poderia ter devolvido a soberania dos EUA ao povo dos EUA e retornado a uma política internacional civilizada e racional. Infelizmente não aconteceu, e essa é a realidade que todos temos de aceitar e com a qual somos obrigados a lidar.
Quero também deixar bem claro que quando digo que o governo Trump pode ser perfeitamente resumido na palavra "estupidez"/"estúpido", não falo de O Donald em pessoa. Falo de todo o governo (nem falo do Congresso, porque o Congresso sempre foi estúpido desde a mais remota memória que tenho dele). Se alguém se surpreender de eu chamar de "estúpido" um governo inteiro, mesmo que constituído de funcionários em muitos casos brilhantes, e advogados, acadêmicos, especialistas técnicos etc. também brilhantes, responderei simplesmente que não julgo um governo pela análise dos currículos dos que trabalham para ele, mas, simplesmente, pelos resultados que o governo tenha a apresentar, pelo que realmente faça. Se o que o governo Trump produziu foi exclusivamente uma montanha de coisas estúpidas, trata-se de governo estúpido.
"Estúpido" pode significar várias coisas. Por exemplo, pode significar ameaças estúpidas contra a República Popular Democrática da Coreia, RPDC, 'Coreia do Norte'. Essa é uma das categorias mais assustadoras da estupidez. Mas há também uma categoria muito boa de estupidez. Por exemplo, acho que a decisão de reconhecer Jerusalém como capital de Israel é estupidez realmente maravilhosa, que recebo com entusiasmo.
Por quê?
Porque é o tipo da estupidez que enfraquece tremendamente o Império Anglo-sionista!
Considere o dano que esse movimento de alta estupidez provocou não só à reputação internacional dos EUA (a qual, verdade seja dita, já estava próxima do zero, mesmo antes desse movimento), mas também à capacidade de os EUA conseguirem qualquer tipo de sucesso no Oriente Médio. A derrota militar dos EUA no Iraque e no Afeganistão e a derrota política dos EUA na Síria precisavam só de um pequeno toque extra, para tornarem os EUA realmente irrelevantes no Oriente Médio. Agora, graças a Donald Trump, não falta mais nada! Como se não bastasse, havia também um segredinho conhecido de todos, mas jamais declarado, e que agora virou fato público e confirmado:
EUA= ISRAEL & ISRAEL=EUA
Outra vez tudo isso é muito bom. Ainda melhor é o fato de que os únicos que discordam dessa realidade são Honduras, Guatemala, Palau, Ilhas Marshall, Kiribati, Togo, Nauru, Sudão do Sul e, claro, Israel.
A política exterior dos EUA tornou-se tão escancaradamente estúpida que até os regimes fantoches mais subservientes (para citar alguns: Grã-Bretanha, Noruega, República da Coreia ou Japão) estão hoje obrigados a condená-la, pelo menos em público. Grande parte do crédito por esse avanço excelente cabe a Nikki Haley que, logo depois desse voto catastrófico, houve por bem piorar ainda mais as coisas e pôs-se a chantagear a ONU e todos os estados membros. Na sequência, o próprio presidente Trump arrematou o desastre magnífico com rasgados elogios públicos àquela fala macabra da macabra Nikki Haley.
Foram atos de tal completa estupidez, tão, tão estúpidos, que, nesse caso, a decisão estúpida caiu como verdadeira bênção sobre o Oriente Médio: até o Hamas voltou finalmente a negociar diretamente com o Hezbollah e o Irã!
Assim como o mundo muito deve agradecer sinceramente ao presidente Obama por ter jogado Rússia e China uma nos braços da outra, todos podemos agora agradecer a Nikki Haley e a Trump por unificar a resistência contra o estado de Israel e contra todo o Império Anglo-sionista. Posso bem imaginar o júbilo em Teerã, quando os iranianos souberam da boa nova!
Mas as excelentes estupidezes não param por aí. O fato de as elites dos EUA estarem agora envolvidas em tiroteio monstro umas contra outras, com investigações, processos, escândalos, acusações, ameaças de impeachment, etc. também é uma bênção, porque enquanto estão ocupadas atirando, umas elites contra outras, nenhuma daquelas elites é capaz de se concentrar na luta contra seus opositores e inimigos reais.
Durante meses, o presidente Trump praticamente governou os EUA por "tuítos" que, claro, e por definição, são precisa e exatamente nada que se possa chamar com seriedade de "política exterior dos EUA" (exceto a ladainha infindável de acusações, ameaças e chiliques, que não dão nem para a saída, em matéria de política exterior). Dessa situação resultam oportunidades e riscos reais, a saber:
1. Riscos: quando não há comando verdadeiro, cada agência faz praticamente o que lhe dá na telha. Já vimos acontecer na segunda metade do governo Obama, quando a secretaria de Estado fazia uma coisa, o Pentágono fazia outra, e a CIA, outra. Resultou em situação altamente patética, com aliados dos EUA atacando uns os outros na Síria e no Iraque, porque os 'agentes' reportavam-se a diferentes agências. O risco, aí, é evidente: por exemplo, quando diplomatas dos EUA chegaram a um acordo com a Rússia na Síria, o Pentágono torpedeou o acordo logo no mesmo dia, atacando forças sírias. Os recentes ataques contra a base das Forças Aeroespaciais Russas em Khmeimim (e o mais recente ataque de drones contra aquela mesma base) são efeito de exatamente o mesmo tipo de desmando que continua a dividir as forças dos EUA. Há meses os russos denunciam que os EUA são "incapazes para acordos",[1] e pode haver aí alto risco e problema grave.
2. Oportunidades: quando não há comando, o Império Anglo-sionista fica sem meios para jogar toda a sua força contra qualquer alvo específico. Pense num carro ou num ônibus no qual os passageiros lutam entre eles para decidir quem senta ao volante. É péssimo para todos e praticamente garantido que o carro ou ônibus despencará no buraco ou se espatifará no muro. Além disso, dado que atualmente os EUA estão ameaçando, em diferente graus, nada menos que nove países (Afeganistão, Síria, Rússia, Irã, República Popular Democrática da Coreia, Venezuela, Turquia, Paquistão, China), fica-se sem saber quem ameaça e se o não governo de hoje conseguirá fazer o que ameaça fazer.
Não só isso. Se os EUA se envolverem seriamente em qualquer tipo de conflito com um desses países, a falta de comando abrirá grandes chances para que o outro lado aja.Considerando que as elites norte-americanas estão ocupadas gritando umas contra as outras e tentando umas derrubar outras, ao mesmo tempo em que todas ameaçam todas, é mínima a chance de que os EUA consigam ter foco suficiente para ameaçar a sério seja quem for. Mas vai muito além dos países que listei acima.Os franceses dizem que "quando o gato sai, os ratos fazem a festa", e é possível que aconteça exatamente assim: mais e mais países seguirão o exemplo das Filipinas, que sempre fora colônia subserviente dos EUA, e é hoje governada por presidente que não se incomoda com insultar publicamente os EUA, pelo menos quando Obama era o presidente (Duterte parece gostar mais de Trump do que de Obama). E também se veem
Não só isso. Se os EUA se envolverem seriamente em qualquer tipo de conflito com um desses países, a falta de comando abrirá grandes chances para que o outro lado aja.
Considerando que as elites norte-americanas estão ocupadas gritando umas contra as outras e tentando umas derrubar outras, ao mesmo tempo em que todas ameaçam todas, é mínima a chance de que os EUA consigam ter foco suficiente para ameaçar a sério seja quem for. Mas vai muito além dos países que listei acima.
Os franceses dizem que "quando o gato sai, os ratos fazem a festa", e é possível que aconteça exatamente assim: mais e mais países seguirão o exemplo das Filipinas, que sempre fora colônia subserviente dos EUA, e é hoje governada por presidente que não se incomoda com insultar publicamente os EUA, pelo menos quando Obama era o presidente (Duterte parece gostar mais de Trump do que de Obama). E também se veem sinais de que os sul-coreanos estão dando uns primeiros passos, ainda tímidos, na direção de dizer "não" ao Tio Sam.
Não estou tentando pintar quadro cor-de-rosa da situação, que é péssima sem dúvida alguma. Ter idiotas ignorantes encarregados de armas nucleares não é bom, ponto final. Mas quero deixar sugeridas duas coisas: primeira, que não importa o quanto Trump seja estúpido, Hillary teria sido infinitamente pior; e, segunda, que também há aspectos positivos no atual vácuo de poder que se fez em Washington, DC.
Se concordamos em que qualquer coisa que enfraqueça o Império Anglo-sionista é coisa boa (inclusive para o povo norte-americano!), como também é coisa boa o que quer que nos aproxime do fim do Império, nesse caso todos temos muito a agradecer pelo ano passado.
O Império começou a ruir, realmente, no governo de George W. Bush (obrigado, neoconservadores!), e o processo prosseguiu, sem sombra de dúvida, no governo de Obama. Mas Donald Trump é o presidente que realmente acelerou tremendamente o processo, o presidente que realmente levou o processo a nível qualitativamente novo. Os riscos à frente continuam tremendos, mas até aqui o Império está perdendo, e a Resistência continua a avançar. E isso é muito bom.*****
[1] "(...) os russos têm dito com frequência que o governo de Kiev é "incapaz para acordos", o que faz sentido, considerando-se que a Ucrânia ocupada pelos nazistas é, na essência, estado fracassado.
Mas dizer que os EUA, superpotência nuclear mundial, é "incapaz para acordos" é diagnóstico extremo e terrível. Significa basicamente que os norte-americanos enlouqueceram e perderam os meios morais mínimos necessários para firmar acordos, qualquer tipo de acordo. Afinal, governo que descumpra o que prometa ou tente burlar, mas que, pelo menos em teoria, conservasse a capacidade para respeitar a própria assinatura em acordos não seria descrito como "incapaz para acordos". Essa expressão que só é usada para descrever entidade que não tem sequer as condições mínimas indispensáveis para merecer a confiança necessária para que alguém possa iniciar negociações, porque não cumprirá o que for acordado. É diagnóstico absolutamente devastador." (24/9/2016, "Por que eventos recentes na Síria mostram que o governo Obama está em confusa agonia terminal", The Saker, traduzido em Blog do Alok) [NTs]).
Show!! Bem vindo de volta, fez muita falta!!
ResponderExcluirEnqto isto acontece com USraHell, a Equipe e o Presidentíssimo PUTIN nadam de braçadas.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirMuito obrigado pela publicação desses textos esclarecedores! Um forte abraço!
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