[ru. НеT, "nyet"]
"Ainda hoje sou capaz de visualizá-lo - palidamente limpo, tristemente respeitável, incuravelmente pobre! Era Bartleby. (...) Imagine minha surpresa, ou melhor, minha consternação, quando, sem se mover de sua privacidade, Bartleby respondeu num tom de voz singularmente suave e firme: - 'Prefiro não fazer'. (...) – 'Prefere não fazer?!' - repeti, levantando-me alterado e cruzando a sala a passos largos. 'O que você quer dizer com isso? Você está maluco? Quero que você me ajude a comparar esta folha aqui, tome, empurrei o papel em sua direção. É uma ordem.' – 'Prefiro não fazer' - disse." (p. 15-18)
MELVILLE, Hermann [1819-1981], Bartleby, o Escrevente – Uma história de Wall Street e Outras Histórias, pp. 7-53, trad. Cassia Zanon, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, s/d inhttps://leidsoncvsenac.files. wordpress.com/2009/12/ miololivro.pdf *
MELVILLE, Hermann [1819-1981], Bartleby, o Escrevente – Uma história de Wall Street e Outras Histórias, pp. 7-53, trad. Cassia Zanon, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, s/d inhttps://leidsoncvsenac.files.
Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
Putin: "Oh, coitado desse idiota. Não é capaz de compreender que vamos dizer ‘nyet’ outra vez." |
Nesse mundo, supõe-se que as coisas funcionem do seguinte modo: nos EUA, as estruturas do poder (públicas e privadas) decidem o que querem que o resto do mundo faça. Comunicam seus desejos por canais oficiais e não oficiais, contando com cooperação automática. Se a cooperação não acontece imediatamente, aplicam pressões políticas, financeiras e econômicas. Se ainda assim não se produz o efeito desejado, tentam mudança de regime mediante revolução colorida ou golpe militar, ou organizam uma insurgência que leve a ataques terroristas e guerra civil na nação recalcitrante. Se nem isso funciona, bombardeiam o país até mandá-lo de volta à idade da pedra. Foi assim que sempre funcionou nos anos 1990s e 2000s. Recentemente porém, uma nova dinâmica emergiu.
De início era centrada na Rússia, mas o fenômeno em seguida espalhou-se pelo mundo e, agora, acaba de engolir os próprios EUA. Funciona do seguinte modo: os EUA decidem o que querem que a Rússia faça e comunicam seus desejos, contando com automática cooperação. A Rússia responde "Nyet." Os EUA imediatamente recorrem aos passos acima relacionados, mas sem a campanha de bombardeamento, antes de cujo início são contidos pela ferramenta de contenção nuclear da Rússia. A resposta continua: "Nyet." Poder-se-ia imaginar talvez que alguém inteligente dentro da estrutura de poder dos EUA refletiria e diria: "Consideradas as evidências que temos à vista, dar ordens à Rússia não funciona; tentemos negociar de boa-fé, em termos de igualdade, quem sabe?" E todos os demais batem na testa e dizem "Uau! Brilhante! Por que não pensamos nisso?!" Mas, não. A pessoa que pensou antes dos demais será demitida no mesmo dia, porque, sacomé, a hegemonia norte-americana global não é negociável. Assim sendo, o que acontece é que os norte-americanos se irritam, reagrupam-se e tentam outra vez, com o que oferecem ao mundo espetáculo engraçadíssimo.
Todo o imbróglio Edward Snowden foi especialmente engraçado de ver. Os EUA exigiram a extradição. Os russos disseram "Nyet, nossa Constituição russa nos impede." E então, hilárias, algumas vozes no ocidente puseram-se a exigir (sic) que a Rússia alterasse a própria Constituição! A resposta, que dispensa tradução, foi "Quá-quá-rá-quá-quá".
Menos engraçado é o impasse em torno da Síria: os norte-americanos só fazem exigir, sem parar, que a Rússia vá adiante com o plano dos EUA para derrubar Bashar Assad. A imutável resposta russa é: "Nyet, os sírios decidirão quem os governará, não Rússia e não EUA." Cada vez que ouvem essa resposta, os norte-americanos fazem cara de quem não consegue entender, coçam a cabeça e... fazem tudo outra vez.
Recentemente, John Kerry esteve em Moscou, numa "sessão de negociação" maratona com Putin e Lavrov. Acima, na abertura, há uma foto de Kerry em conversa com Putin e Lavrov em Moscou, há uma semana mais ou menos, e é impossível não ler o que dizem as respectivas expressões faciais. Lá está Kerry, de costas para a câmera, dizendo aquelas bobagens de sempre. O rosto de Lavrov diz claramente "Não acredito que eu tenha de ficar aqui sentado e ouvir todo esse bobajol outra vez..." O rosto de Putin diz: "Oh, coitado desse idiota. Não é capaz de compreender que vamos dizer ‘nyet’ outra vez." Kerry voou para casa com mais um "nyet."
Pior ainda, outros países estão agora começando também a entrar na mesma ação. Os norte-americanos disseram aos britânicos exatamente como queriam que votassem; os britânicos disseram "nyet" e votaram pelo Brexit. Os norte-americanos disseram aos europeus que eram obrigados a aceitar a horrenda dominação pelo poder das grandes empresas chamada hoje de Parceria Trans-Atlântico de Comércio e Investimento [ing. Transatlantic Trade and Investment Partnership (TTIP)], e os franceses disseram "nyet, não será aprovada." Os EUA organizaram mais um golpe militar na Turquia para substituir Erdoǧan por alguém que não daria mole à Rússia, e os turcos disseram também "nyet" a mais essa ideia.
E agora, horror dos horrores, lá está Donald Trump dizendo "nyet" ao diabo vezes quatro – à OTAN, à deslocalização dos empregos dos norte-americanos, a deixar entrar uma inundação de migrantes, à globalização, às armas para nazistas ucranianos, ao livre comércio...
O efeito psicológico corrosivo de tantos "nyet" na psique hegemonista norte-americana não pode ser subestimado. Se todos esperam que você pense e aja como hegemon, mas só consegue manter em operação o setor "pense", o resultado é o que se chama dissonância cognitiva. Se o seu negócio é abusar de nações e pessoas pelo mundo, mas as nações e pessoas não mais se deixam abusar, o seu negócio vira piada. E você, doido varrido, doido de amarrar.
A doideira resultante produziu recentemente um interessante sintoma: vários office-boys servidores do Departamento de Estado (diplomatas e outros) assinaram uma carta – imediatamente vazada – exigindo imediata campanha de bombardeio contra a Síria, para derrubar Bashar Assad. Di-plo-ma-tas. Diplomacia é a arte de falar e, pelas palavras, evitar guerras. Diplomatas que 'exigem' guerra não agem lá muito... diplomaticamente. Pode-se argumentar que são diplomatas incompetentes, mas não basta, porque não são só incompetentes (incontáveis diplomatas competentes deixaram o serviço diplomático durante o segundo governo Bush, quase todos desgostosos por ter de mentir incansavelmente sobre os motivos para a invasão dos EUA ao Iraque e aquela guerra). Os que assinaram a tal carta são belicistas doentios, pervertidos nada diplomáticos. É tamanho o poder daquela palavrinha russa, que aqueles supostos diplomatas enlouqueceram completamente.
Mas seria injusto destacar só o Departamento de Estado. É como se todo o corpo político norte-americano estivesse infectado por emanações pútridas. O miasma tudo permeia e torna a vida uma desgraça, uma miséria. Apesar dos crescentes problemas, muitas outras coisas nos EUA permanecem ainda administráveis, de certo modo, mas essa tal coisa – o esgotamento da capacidade para abusar de todos em todo o mundo – arruína o resto.
É verão, meados do verão, e o país está na praia. A toalha de praia está comida de traças e esfarrapada; o guarda-sol tem buracos e varetas quebradas, os refrigerantes no isopor são envenenados com químicas imundas e a leitura de verão é só tédio... e logo ali, além do mais, há uma baleia morta que se decompõe ao sol e cujo nome é "Nyet." Era o que faltava para arruinar, de vez, o meio ambiente!
Os troncos falantes da 'mídia' e políticos do establishment já estão dolorosamente cientes desse problema, e a reação deles, previsível, é culpar o que veem como fonte primeira de todos os males: a Rússia, convenientemente personificada por Putin.
"Quem não votar em Clinton, estará votando em Putin" – diz a mais recente sandice 'de campanha'. Outra, diz que Trump seria agente de Putin. Qualquer figura pública que não assuma posição militante a favor do establishment é automaticamente declarada "idiota putinista útil". Tomadas pelo valor manifesto, são bobagens, patetices, valem nada. Mas há uma explicação profunda para todas elas: o que as conecta entre si, todas essas imbecilidades, é o poder daquele "nyet." Votar em Sanders é uma modalidade de voto- "nyet": o establishment Democrata produziu uma candidata e mandou os eleitores votarem nela, e a maioria dos jovens norte-americanos responderam "nyet." O mesmo aconteceu com Trump: o establishment Republicano empoderou os seus Sete Anões e mandou sua gente votar em qualquer deles. Outra vez, a maioria da classe trabalhadora branca norte-americana humilhada e assaltada disse "nyet" e votou na Branca de Neve outsider.
É sinal estimulante, que tanta gente no mundo dominado por Washington esteja descobrindo o poder do "nyet." Oestablishment pode ainda parecer sólido, mas só pelo lado de fora. Por baixo da fina demão de tinta nova, o casco está podre, com água entrando por todas as frestas. Um "nyet" bem forte, que ecoe e vibre, com certeza fará rachar o casco, com o que se fará espaço para algumas mudanças muito necessárias. Quando acontecer, os norte-americanos lembrem, por favor, de agradecer à Rússia... ou... como tanto insistem, a Putin.*****
Uma pena que aqui no Brasil não dissemos NYET ao golpe e consequentemente aos EUA.
ResponderExcluirPoderia dizer se não fossem tão corruptos...
ExcluirExcesso de democracia.
ResponderExcluirOs EUA tentarão desorganizar a sociedade turca. Tentarão fomentar uma huerra civil.
ResponderExcluirDepuseram a presidente do Brasil, detalhe importante, eleita legitimamente, e não houve uma morte sequer nas manifestações. É espetacular essa tal democracia. O Pentágono governa o Brasil e assistimos junto com os militares o desmonte da 7a economia.
ResponderExcluirExcelente reflexão, concordo integralmente. Lamentavelmente pertenço ao lado do mundo para o qual os EUA podem e tornam a se voltar com toda garra. E, na América Latina, depois que Hugo Chavez foi assassinado e Fidel Castro envelheceu e cansou, não existe nyet por um motivo simples: somos uma imensa sociedade escravocrata com uma imensa maioria de povo com mentalidade de escravos e alguns com um gosto irresistível a ser feitores. E, se a ensandecida hilária chega ao poder, e acredito que chega, aí sim, aqueles di-plo-ma-tas norte americanos, com ela a frente, vão fazer de tudo para incendiar o mundo para voltar a ser hegemon. E sabe onde ela vai recolher as buchas de canhão? Adivinhem!
ResponderExcluirO povo sabe dizer não ao PT corrupto e toda esquerda brasileira,logo vai ter outros não a sindicatos ladrão, entidades de classe, vai ter o seu não, espere e verá...
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