Sugiro a leitura desta notícia com um mínimo de espírito crítico e porque não, malandragem. O esforço para se demonizar Kadafi e assim justificar a barbárie cometida pelos neo-cruzados na Líbia chega a ser comovente. Eles só se esqueceram que este comportamento é bastante incomum na cultura islâmica além de ser altamente contraproducente na batalha pela conquista da opinião pública internacional. Kadafi pode ser o que for, mas não é bobo. O pior é que, se eles publicam, muitos devem acreditar.
notícia obviamente publicada hoje (26/04/2011) na Folha:
Tropas de Gaddafi usam Viagra e camisinha como arma contra crianças na Líbia
Soldados das tropas do ditador líbio Muammar Gaddafi estão atacando sexualmente crianças, segundo a ONG Save the Children. Em entrevista ao UOL Notícias, o dinamarquês Michael Mahrt, conselheiro da instituição, disse que os relatos de estupro se repetem em todos os acampamentos de refugiados.
“Não podemos confirmar as histórias. Mas, por todos os lugares que passamos, as crianças e seus pais nos contam sobre estupros cometidos por soldados. Por isso, tomamos a história como verdadeira”, contou, pelo telefone.
Funcionários da ONG conversaram com mais de 300 crianças em quatro acampamentos diferentes. “Sabemos que em situação de trauma de guerra, as crianças podem inventar histórias. No entanto, elas ainda não estão assim. Elas estão diagnosticadas com um nível elevado de estresse. Além disso, os relatos são consistentes e contados da mesma maneira por crianças que não se conhecem”, explicou.
Mahrt não tem informações suficientes para dizer como estes ataques são feitos. No entanto, relatos vindos da Líbia dão conta de que muitos soldados são obrigados por seus superiores a estuprar as crianças nas vilas por onde passam.
Segundo o médico Suleiman Rejadi, entrevistado pelo canal de TV Al Jazeera, camisinhas e comprimidos de Viagra foram encontrados nos bolsos de cadáveres de soldados das tropas de Gaddafi. “Estou certo de que eram estupradores”, disse o médico.
Segundo Mahrt, além da violência sexual e das lembranças de terem visto parentes e amigos sendo assassinados, as crianças líbias também convivem com o trauma de terem sido usadas como escudo. “Muitos garotos, ainda bem novos, foram recrutados para lutar na guerra, como soldados”, contou.
O conselheiro passou duas semanas em Bengazi, conversando com crianças que estavam em acampamentos de refugiados. A maioria das famílias havia fugido de Misrata, Ajdabiya e, principalmente, Ras Lanuf.
“A situação nos acampamentos é boa. As famílias têm acesso à água potável, comida e assistência médica. Infelizmente, as crianças não têm escola e vão ficar sem aulas, pelo menos, até o fim da guerra”, lamentou.
terça-feira, 26 de abril de 2011
Enquanto a oposição se esfola, Dilma anuncia 75 mil bolsas de intercâmbio para estudantes
Ela não está para brincadeiras...
extraído da Folha.com
A presidente Dilma Rousseff anunciou hoje que o governo federal tem a "disposição" de conceder 75 mil bolsas de estudo no exterior para estudantes brasileiros até 2014. Sem entrar em detalhes, Dilma afirmou que a prioridade será para cursos na área de Ciências Exatas.
"Vamos recorrer a um mecanismo que vários países do mundo recorreram, que é enviar brasileiros e brasileiras para fazer, ou de forma parcial, ou de forma completa, cursos no exterior, nas áreas de Ciências, sobretudo de Ciências Exatas", disse a presidente durante discurso na abertura da primeira reunião do CDES (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social) de seu governo, no Palácio do Planalto.
O tema começou a ser tratado com mais profundidade no governo com a visita do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ao país, em março. Na ocasião, um dos acordos diplomáticos firmados entre os dois países foi um acordo de cooperação prevendo o intercâmbio de alunos e professores entre Brasil e EUA. O próprio Obama chegou a citar um número de 100 mil intercâmbios entre os dois países ao longo dos próximos anos.
Hoje, em seu discurso, Dilma também citou o número de 100 mil bolsas --25 mil além do prometido pela presidente. Esse montante seria alcançado por meio de colaboração do setor privado. Para uma plateia formada majoritariamente por empresários, Dilma fez um apelo à iniciativa privada.
"Queria fazer um convite e um desafio aos senhores: eu acredito que o setor privado pode comparecer com uma ajuda aos estudantes brasileiros e ao Brasil, de forma que nos permita chegar a 100 mil bolsas em 2014", disse.
extraído da Folha.com
A presidente Dilma Rousseff anunciou hoje que o governo federal tem a "disposição" de conceder 75 mil bolsas de estudo no exterior para estudantes brasileiros até 2014. Sem entrar em detalhes, Dilma afirmou que a prioridade será para cursos na área de Ciências Exatas.
"Vamos recorrer a um mecanismo que vários países do mundo recorreram, que é enviar brasileiros e brasileiras para fazer, ou de forma parcial, ou de forma completa, cursos no exterior, nas áreas de Ciências, sobretudo de Ciências Exatas", disse a presidente durante discurso na abertura da primeira reunião do CDES (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social) de seu governo, no Palácio do Planalto.
O tema começou a ser tratado com mais profundidade no governo com a visita do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ao país, em março. Na ocasião, um dos acordos diplomáticos firmados entre os dois países foi um acordo de cooperação prevendo o intercâmbio de alunos e professores entre Brasil e EUA. O próprio Obama chegou a citar um número de 100 mil intercâmbios entre os dois países ao longo dos próximos anos.
Hoje, em seu discurso, Dilma também citou o número de 100 mil bolsas --25 mil além do prometido pela presidente. Esse montante seria alcançado por meio de colaboração do setor privado. Para uma plateia formada majoritariamente por empresários, Dilma fez um apelo à iniciativa privada.
"Queria fazer um convite e um desafio aos senhores: eu acredito que o setor privado pode comparecer com uma ajuda aos estudantes brasileiros e ao Brasil, de forma que nos permita chegar a 100 mil bolsas em 2014", disse.
Os adoradores de dinheiro e o deus mercado
aos poucos, as pessoas vão despertando... mesmo envoltos pela névoa corporativa que domina o império..
Reproduzo aqui artigo publicado no site da Carta Maior.
Discurso feito pelo jornalista Chris Hedges(*) em Union Square, em 15 de abril passado, na cidade de Nova York, durante um protesto feito em frente a uma das agências do Bank of America.
Estamos aqui hoje em frente a um de nossos templos das finanças. Um templo no qual a cobiça e o lucro são os bens supremos, onde o valor de cada pessoa é determinado por sua capacidade de misturar riqueza e poder à custa de outras, onde as leis são manipuladas, se reescrevem e se violam, onde o ciclo infinito do consumo define o progresso humano, onde a fraude e os crimes são os instrumentos dos negócios.
As duas forças mais destrutivas da natureza humana – a cobiça e a inveja –impulsionam os homens de finanças, os banqueiros, os mandarins corporativos e os dirigentes de nossos dois principais partidos políticos, todos eles beneficiários deste sistema. Colocam-se no centro de sua criação. Desdenham ou ignoram os gritos dos que se encontram abaixo deles. Retiram nossos direitos e nossa dignidade e frustram nossa capacidade de resistência. Fazem-nos prisioneiros em nosso próprio país. Vêem os seres humanos e o mundo natural como simples mercadorias a serem exploradas até ao esgotamento e ao colapso. O sofrimento humano, as guerras, as mudanças climáticas, a pobreza, tudo serve ao custeio dos negócios. Nada é sagrado. O Senhor dos Lucros é o Senhor da Morte.
Os fariseus das altas finanças que podem nos ver esta manhã de suas salas e seus escritórios pelas esquinas debocham da virtude. A vida para eles só tem o significado do proveito próprio. O sofrimento dos pobres não os preocupa. As seis milhões de famílias expulsas de suas casas não os preocupam. As dezenas de milhões de aposentados, cujas economias para a aposentadoria foram anuladas pela fraude e pela desonestidade de Wall Street não os preocupam. Que não se consiga deter as emissões de carbono, isso não os preocupa. A justiça não os preocupa. A verdade não os preocupa. Uma criança faminta não os preocupa.
Fiódor Dostoyevski em “Crime e Castigo” concebeu o mal absoluto por trás dos anseios humanos não como alguma coisa vulgar, mas como algo extraordinário, como o desejo que permite a homens e mulheres se servirem de sistemas de autoglorificação e cobiça. No romance, Raskolnikov acredita – como os que vivem nos tempos atuais – que o gênero humano pode se dividir em dois grupos. O primeiro se compõe de gente comum, humilde e submissa. Gente comum que faz pouco mais do que se reproduzir segundo a sua própria imagem, envelhecer e morrer. E Raskolnikov despreza essas formas inferiores de vida humana.
O segundo grupo, acredita Raskolnikov, é extraordinário. São os Napoleões do mundo, os que desprezam o direito e os costumes, os que se desvencilham das convenções e tradições para criar um futuro mais refinado, mais glorioso. Raskolnikov argumenta que, mesmo vivendo todos no mesmo mundo, podemos nos libertar das conseqüências de viver com outros, conseqüências que nem sempre estarão a nosso favor. Os Raskolnikovs do mundo põem uma fé desenfreada e total no intelecto humano. Desdenham os atributos de compaixão, empatia, beleza, justiça e verdade. E essa visão demencial da existência humana leva Raskolnikov a assassinar uma agiota e a roubar o seu dinheiro.
Quando Dante entra na selva escura no Inferno (canto III) ouve os gritos daqueles que “pelo mundo transitaram sem merecer louvor ou execração”, os rejeitados pelo céu e pelo inferno, os que dedicaram suas vidas somente em busca da felicidade. São os “bons”, os que nunca causaram confusões, os que preencheram suas vidas de coisas vãs e vazias, inofensivas talvez, para divertirem-se, que nunca tiveram uma posição perante nada, nunca arriscaram nada e foram somente figurantes. Jamais analisaram suas vidas criticamente, nunca sentiram necessidades, nunca quiseram ver. Os sacerdotes desses templos corporativos, em nome do lucro, matam ainda com mais inclemência, fineza e astúcia do que Raskolnikov.
As corporações deixam que 50.000 pessoas morram a cada ano porque não podem pagar uma assistência médica adequada. Já mataram milhares de iraquianos, afegãos, palestinos e paquistaneses e a isso contemplaram com alegria enquanto quadruplicava o preço das ações dos fabricantes de armamentos. Transformam o câncer numa epidemia nas minas de carvão da Virgínia Ocidental, onde as famílias respiram ar contaminado, bebem água envenenada e observam os Montes Apalaches irem pelos ares, convertendo-os em uma planície deserta enquanto as companhias carboníferas acumulam milhões e milhões de dólares.
E após saquear o tesouro dos Estados Unidos, essas corporações requerem, em nome da moralidade, que se eliminem programas alimentares para crianças, a ajuda para a calefação, a assistência médica para nossos idosos e a boa educação pública. Reivindicam que toleremos uma classe inferior permanente que deixará em cada seis trabalhadores um sem trabalho, que condena dezenas de milhões de estadunidenses à pobreza e que lança os doentes mentais às grades de calefação. Os que não têm poder, aqueles que as corporações consideram gente comum, são atirados ao lado como lixo humano. É o que exige o “deus mercado”.
E os que perseguem o arco iris brilhante da sociedade de consumo, os que apóiam a ideologia pervertida da cultura consumista, se convertem, como já o sabia Dante, em covardes morais. Têm a cabeça feita por nossos sistemas corporativos de informação e se mantêm passivos enquanto nossos poderes legislativo, executivo e judicial de governo – instrumentos do Estado corporativo – nos retiram a capacidade de resistir. Democratas ou republicanos, liberais ou conservadores. Não há diferença. Barack Obama serve aos interesses corporativos com a mesma diligência de George W. Bush. E colocar nossa fé em algum partido ou instituição estabelecida como mecanismo de reforma é deixarmo-nos hipnotizar pelo mito das sombras nas paredes da caverna de Platão.
Devemos desafiar essa geringonça da cultura do consumo e recuperar a primazia da piedade e da justiça em nossas vidas. E isso requer coragem, não só a coragem física, mas também a coragem moral, o que é mais difícil... A coragem moral de ouvir nossa consciência. Se tivermos que salvar ao nosso país e ao nosso planeta, devemos ultrapassar a exaltação do próprio ego e incorporar a isso o ego do nosso próximo. O auto-sacrifício desafia a doença da ideologia corporativa. O auto-sacrifício destrói os ídolos da cobiça e da inveja. O auto-sacrifício exige que nos rebelemos contra o abuso, contra a ofensa e a injustiça que nos impõem os mandarins do poder corporativo. Há uma profunda verdade na advertência bíblica: “Aquele que ama a sua vida a perderá”
A vida não tem a ver só conosco. Jamais poderemos ter justiça enquanto o nosso próximo não tiver justiça. E jamais poderemos recuperar a nossa liberdade até que estejamos dispostos a sacrificar nosso conforto por uma rebelião aberta. O presidente (Obama) nos decepcionou. Nosso processo de democracia eleitoral nos decepcionou. Não restam estruturas ou instituições que não tenham sido contaminadas ou destruídas pelas corporações. E isto significa que tudo dependerá de nós mesmos. A desobediência civil, que significa dificuldades e sofrimentos, que será longa e difícil, que significa essencialmente auto-sacrifício, é o único recurso que resta.
Os banqueiros e os gestores de fundos de alto risco, as elites corporativas e governamentais, são a versão moderna dos hebreus desencaminhados que se prostraram diante do bezerro de ouro. A centelha da riqueza brilha diante de seus olhos e os impulsiona cada vez mais rápido para a destruição. E querem que nos prostremos também diante do seu altar. Enquanto nos inspirarmos na cobiça, ela nos manterá cúmplices e em silêncio. Na medida, porém, que desafiemos a religião do capitalismo sem escrúpulos, uma vez que exijamos que a sociedade atenda verdadeiramente as necessidades dos cidadãos e que o ecossistema sustente a vida, ao invés das necessidades do mercado, uma vez que aprendamos a dialogar com uma nova humildade e a viver com uma nova simplicidade, uma vez que amemos ao nosso próximo como a nós mesmos, romperemos as correntes que nos aprisionam e faremos com que a esperança seja percebida.
(*) - Christopher Lynn Hedges é jornalista, autor e correspondente de guerra dos Estados Unidos, especializado em políticas e sociedades dos EUA e Oriente Médio. Seu livro mais recente se intitula “A Morte da Classe Liberal” (2010)
(**)-Fonte: http://www.truthout.org/throw-out-money-changers/1303110000
Tradução do espanhol feita por Izaías Almada.
Reproduzo aqui artigo publicado no site da Carta Maior.
Discurso feito pelo jornalista Chris Hedges(*) em Union Square, em 15 de abril passado, na cidade de Nova York, durante um protesto feito em frente a uma das agências do Bank of America.
Estamos aqui hoje em frente a um de nossos templos das finanças. Um templo no qual a cobiça e o lucro são os bens supremos, onde o valor de cada pessoa é determinado por sua capacidade de misturar riqueza e poder à custa de outras, onde as leis são manipuladas, se reescrevem e se violam, onde o ciclo infinito do consumo define o progresso humano, onde a fraude e os crimes são os instrumentos dos negócios.
As duas forças mais destrutivas da natureza humana – a cobiça e a inveja –impulsionam os homens de finanças, os banqueiros, os mandarins corporativos e os dirigentes de nossos dois principais partidos políticos, todos eles beneficiários deste sistema. Colocam-se no centro de sua criação. Desdenham ou ignoram os gritos dos que se encontram abaixo deles. Retiram nossos direitos e nossa dignidade e frustram nossa capacidade de resistência. Fazem-nos prisioneiros em nosso próprio país. Vêem os seres humanos e o mundo natural como simples mercadorias a serem exploradas até ao esgotamento e ao colapso. O sofrimento humano, as guerras, as mudanças climáticas, a pobreza, tudo serve ao custeio dos negócios. Nada é sagrado. O Senhor dos Lucros é o Senhor da Morte.
Os fariseus das altas finanças que podem nos ver esta manhã de suas salas e seus escritórios pelas esquinas debocham da virtude. A vida para eles só tem o significado do proveito próprio. O sofrimento dos pobres não os preocupa. As seis milhões de famílias expulsas de suas casas não os preocupam. As dezenas de milhões de aposentados, cujas economias para a aposentadoria foram anuladas pela fraude e pela desonestidade de Wall Street não os preocupam. Que não se consiga deter as emissões de carbono, isso não os preocupa. A justiça não os preocupa. A verdade não os preocupa. Uma criança faminta não os preocupa.
Fiódor Dostoyevski em “Crime e Castigo” concebeu o mal absoluto por trás dos anseios humanos não como alguma coisa vulgar, mas como algo extraordinário, como o desejo que permite a homens e mulheres se servirem de sistemas de autoglorificação e cobiça. No romance, Raskolnikov acredita – como os que vivem nos tempos atuais – que o gênero humano pode se dividir em dois grupos. O primeiro se compõe de gente comum, humilde e submissa. Gente comum que faz pouco mais do que se reproduzir segundo a sua própria imagem, envelhecer e morrer. E Raskolnikov despreza essas formas inferiores de vida humana.
O segundo grupo, acredita Raskolnikov, é extraordinário. São os Napoleões do mundo, os que desprezam o direito e os costumes, os que se desvencilham das convenções e tradições para criar um futuro mais refinado, mais glorioso. Raskolnikov argumenta que, mesmo vivendo todos no mesmo mundo, podemos nos libertar das conseqüências de viver com outros, conseqüências que nem sempre estarão a nosso favor. Os Raskolnikovs do mundo põem uma fé desenfreada e total no intelecto humano. Desdenham os atributos de compaixão, empatia, beleza, justiça e verdade. E essa visão demencial da existência humana leva Raskolnikov a assassinar uma agiota e a roubar o seu dinheiro.
Quando Dante entra na selva escura no Inferno (canto III) ouve os gritos daqueles que “pelo mundo transitaram sem merecer louvor ou execração”, os rejeitados pelo céu e pelo inferno, os que dedicaram suas vidas somente em busca da felicidade. São os “bons”, os que nunca causaram confusões, os que preencheram suas vidas de coisas vãs e vazias, inofensivas talvez, para divertirem-se, que nunca tiveram uma posição perante nada, nunca arriscaram nada e foram somente figurantes. Jamais analisaram suas vidas criticamente, nunca sentiram necessidades, nunca quiseram ver. Os sacerdotes desses templos corporativos, em nome do lucro, matam ainda com mais inclemência, fineza e astúcia do que Raskolnikov.
As corporações deixam que 50.000 pessoas morram a cada ano porque não podem pagar uma assistência médica adequada. Já mataram milhares de iraquianos, afegãos, palestinos e paquistaneses e a isso contemplaram com alegria enquanto quadruplicava o preço das ações dos fabricantes de armamentos. Transformam o câncer numa epidemia nas minas de carvão da Virgínia Ocidental, onde as famílias respiram ar contaminado, bebem água envenenada e observam os Montes Apalaches irem pelos ares, convertendo-os em uma planície deserta enquanto as companhias carboníferas acumulam milhões e milhões de dólares.
E após saquear o tesouro dos Estados Unidos, essas corporações requerem, em nome da moralidade, que se eliminem programas alimentares para crianças, a ajuda para a calefação, a assistência médica para nossos idosos e a boa educação pública. Reivindicam que toleremos uma classe inferior permanente que deixará em cada seis trabalhadores um sem trabalho, que condena dezenas de milhões de estadunidenses à pobreza e que lança os doentes mentais às grades de calefação. Os que não têm poder, aqueles que as corporações consideram gente comum, são atirados ao lado como lixo humano. É o que exige o “deus mercado”.
E os que perseguem o arco iris brilhante da sociedade de consumo, os que apóiam a ideologia pervertida da cultura consumista, se convertem, como já o sabia Dante, em covardes morais. Têm a cabeça feita por nossos sistemas corporativos de informação e se mantêm passivos enquanto nossos poderes legislativo, executivo e judicial de governo – instrumentos do Estado corporativo – nos retiram a capacidade de resistir. Democratas ou republicanos, liberais ou conservadores. Não há diferença. Barack Obama serve aos interesses corporativos com a mesma diligência de George W. Bush. E colocar nossa fé em algum partido ou instituição estabelecida como mecanismo de reforma é deixarmo-nos hipnotizar pelo mito das sombras nas paredes da caverna de Platão.
Devemos desafiar essa geringonça da cultura do consumo e recuperar a primazia da piedade e da justiça em nossas vidas. E isso requer coragem, não só a coragem física, mas também a coragem moral, o que é mais difícil... A coragem moral de ouvir nossa consciência. Se tivermos que salvar ao nosso país e ao nosso planeta, devemos ultrapassar a exaltação do próprio ego e incorporar a isso o ego do nosso próximo. O auto-sacrifício desafia a doença da ideologia corporativa. O auto-sacrifício destrói os ídolos da cobiça e da inveja. O auto-sacrifício exige que nos rebelemos contra o abuso, contra a ofensa e a injustiça que nos impõem os mandarins do poder corporativo. Há uma profunda verdade na advertência bíblica: “Aquele que ama a sua vida a perderá”
A vida não tem a ver só conosco. Jamais poderemos ter justiça enquanto o nosso próximo não tiver justiça. E jamais poderemos recuperar a nossa liberdade até que estejamos dispostos a sacrificar nosso conforto por uma rebelião aberta. O presidente (Obama) nos decepcionou. Nosso processo de democracia eleitoral nos decepcionou. Não restam estruturas ou instituições que não tenham sido contaminadas ou destruídas pelas corporações. E isto significa que tudo dependerá de nós mesmos. A desobediência civil, que significa dificuldades e sofrimentos, que será longa e difícil, que significa essencialmente auto-sacrifício, é o único recurso que resta.
Os banqueiros e os gestores de fundos de alto risco, as elites corporativas e governamentais, são a versão moderna dos hebreus desencaminhados que se prostraram diante do bezerro de ouro. A centelha da riqueza brilha diante de seus olhos e os impulsiona cada vez mais rápido para a destruição. E querem que nos prostremos também diante do seu altar. Enquanto nos inspirarmos na cobiça, ela nos manterá cúmplices e em silêncio. Na medida, porém, que desafiemos a religião do capitalismo sem escrúpulos, uma vez que exijamos que a sociedade atenda verdadeiramente as necessidades dos cidadãos e que o ecossistema sustente a vida, ao invés das necessidades do mercado, uma vez que aprendamos a dialogar com uma nova humildade e a viver com uma nova simplicidade, uma vez que amemos ao nosso próximo como a nós mesmos, romperemos as correntes que nos aprisionam e faremos com que a esperança seja percebida.
(*) - Christopher Lynn Hedges é jornalista, autor e correspondente de guerra dos Estados Unidos, especializado em políticas e sociedades dos EUA e Oriente Médio. Seu livro mais recente se intitula “A Morte da Classe Liberal” (2010)
(**)-Fonte: http://www.truthout.org/throw-out-money-changers/1303110000
Tradução do espanhol feita por Izaías Almada.
segunda-feira, 25 de abril de 2011
O mistério dos mistérios: de onde vem toda esta força de José Serra?
Extraído do site da carta Maior:
GUERRA SUJA EXPÕE LEGADO DE SERRA
Serra & Kassab deram mais um giro na política de destruição do PSDB de SP criando um cenário de guerra fratricida no coração do governo Alckmin. O esvaziamento municipal das bases do partido, iniciado na semana passada com a saída de sete vereadores da legenda, teve novo capítulo nesta 2º feira com a desfiliação de Walter Feldman, um dos fundadores da sigla e serrista notório.
Jogado às feras pelo desafeto, Alckmin revira o saco de maldades, amplo, e expõe à luz do sol as mazelas entranhadas na administração serrista nas áreas da educação, transportes, urbanismo etc. A autópsia do ‘grande gestor' ganhou contornos de crime de prevaricação e talvez explique o revide dos serristas no final da tarde da 2ºfeira , com a saída de Feldman.
Segundo a insuspeita 'Folha de SP' (25-04) Alckmin desativou um gigantesco esquema de ‘terceirização' de recursos educacionais que deveriam servir à rede pública mas foram transferidas pela dupla Serra & Paulo Renato a convênios privados na prestação de serviços de ensino de inglês. Detalhe da ‘eficiência do projeto': serviços terceirizados para aulas não obrigatórias, fora do horário regular dos estudantes. Custo do acepipe aos cofres públicos: R$ 41 milhões por ano. Total destinado a mesma finalidade nos centros de inglês do Estado (sim, eles existem): R$ 810 mil.
Em síntese, Serra e Paulo Renato gastaram R$ 507 reais por aluno fora da rede num projeto no mínimo mal desenhado. Reservaram ao ensino público equivalente R$ 14 por aluno. É a velha metodologia tucana: sucatear o que é público para legitimar o privado. A guerra suja dentro do PSDB de São Paulo soa como um balão de ensaio: Serra quer se impor nacionalmente como única alternativa tucana em 2014. Seus métodos são conhecidos. A disputa assume contornos de uma embate sem volta entre a corda e o pescoço. Resta saber quem será o pescoço.
(Carta Maior; 3º feira, 26/04/2011)
GUERRA SUJA EXPÕE LEGADO DE SERRA
Serra & Kassab deram mais um giro na política de destruição do PSDB de SP criando um cenário de guerra fratricida no coração do governo Alckmin. O esvaziamento municipal das bases do partido, iniciado na semana passada com a saída de sete vereadores da legenda, teve novo capítulo nesta 2º feira com a desfiliação de Walter Feldman, um dos fundadores da sigla e serrista notório.
Jogado às feras pelo desafeto, Alckmin revira o saco de maldades, amplo, e expõe à luz do sol as mazelas entranhadas na administração serrista nas áreas da educação, transportes, urbanismo etc. A autópsia do ‘grande gestor' ganhou contornos de crime de prevaricação e talvez explique o revide dos serristas no final da tarde da 2ºfeira , com a saída de Feldman.
Segundo a insuspeita 'Folha de SP' (25-04) Alckmin desativou um gigantesco esquema de ‘terceirização' de recursos educacionais que deveriam servir à rede pública mas foram transferidas pela dupla Serra & Paulo Renato a convênios privados na prestação de serviços de ensino de inglês. Detalhe da ‘eficiência do projeto': serviços terceirizados para aulas não obrigatórias, fora do horário regular dos estudantes. Custo do acepipe aos cofres públicos: R$ 41 milhões por ano. Total destinado a mesma finalidade nos centros de inglês do Estado (sim, eles existem): R$ 810 mil.
Em síntese, Serra e Paulo Renato gastaram R$ 507 reais por aluno fora da rede num projeto no mínimo mal desenhado. Reservaram ao ensino público equivalente R$ 14 por aluno. É a velha metodologia tucana: sucatear o que é público para legitimar o privado. A guerra suja dentro do PSDB de São Paulo soa como um balão de ensaio: Serra quer se impor nacionalmente como única alternativa tucana em 2014. Seus métodos são conhecidos. A disputa assume contornos de uma embate sem volta entre a corda e o pescoço. Resta saber quem será o pescoço.
(Carta Maior; 3º feira, 26/04/2011)
sábado, 23 de abril de 2011
Fidel, genial!!!
Reproduzo Artigo publicado no Página/12 em 19/04/2011. A tradução é do Cepat. Publicado originalmente em português em IHU-Online, e extraído do site da Carta Maior.
Escutei no domingo, às 10h, os debates dos delegados do Sexto Congresso do Partido. Eram tantas as comissões que, como é lógico, não pude ouvir todos os que falaram.
Haviam se reunido em cinco comissões para discutir numerosos temas. Eu também aproveitava os recessos para respirar com calma e consumir algum energético de procedência agrícola. Eles, seguramente, com mais apetite por seu trabalho e devido à sua idade.
Chamou-me a atenção a preparação desta nova geração, com tão elevado nível cultural, tão diferente daquela que estava sendo alfabetizada precisamente em 1961, quando os aviões norte-americanos de bombardeio, em mãos mercenárias, atacavam a Pátria. A maior parte dos delegados do Congresso do Partido eram crianças ou não tinham nem nascido.
Não me importava tanto o que diziam, como a forma com que o diziam. Estavam tão preparados e seu vocabulário era tão rico, que eu quase não os entendia. Discutiam cada palavra, e até a presença ou a ausência de uma vírgula no parágrafo em discussão.
Sua tarefa é ainda mais difícil que aquela assumida por nossa geração quando se proclamou o socialismo em Cuba, a 90 milhas dos Estados Unidos.
Por isso, persistir nos princípios revolucionários é, na minha opinião, o principal legado que podemos lhes deixar. Não há margem para o erro neste instante da história humana. Ninguém deve desconhecer essa realidade.
A direção do Partido deve ser a soma dos melhores talentos políticos de nosso povo, capaz de enfrentar a política do império que coloca em perigo a espécie humana e produz gansgters como os da OTAN, capazes de lançar em apenas 29 dias, com a inglória operação Odisseia ao Amanhecer, mais de 4.000 missões de bombardeio sobre um país da África.
É dever da nova geração de homens e mulheres revolucionários ser modelo de dirigentes modestos, estudiosos e incansáveis lutadores pelo socialismo. Sem dúvida, constitui um desafio difícil na época bárbara das sociedades de consumo superar o sistema de produção capitalista, que fomenta e promove os instintos egoístas do ser humano.
A nova geração é chamada a retificar e mudar sem vacilações tudo o que deve ser retificado e mudado, e seguir demonstrando que o socialismo é também a arte de realizar o impossível: construir e levar a cabo a Revolução dos humildes, pelos humildes e para os humildes, e defendê-la durante meio século da mais poderosa potência que já existiu.
Escutei no domingo, às 10h, os debates dos delegados do Sexto Congresso do Partido. Eram tantas as comissões que, como é lógico, não pude ouvir todos os que falaram.
Haviam se reunido em cinco comissões para discutir numerosos temas. Eu também aproveitava os recessos para respirar com calma e consumir algum energético de procedência agrícola. Eles, seguramente, com mais apetite por seu trabalho e devido à sua idade.
Chamou-me a atenção a preparação desta nova geração, com tão elevado nível cultural, tão diferente daquela que estava sendo alfabetizada precisamente em 1961, quando os aviões norte-americanos de bombardeio, em mãos mercenárias, atacavam a Pátria. A maior parte dos delegados do Congresso do Partido eram crianças ou não tinham nem nascido.
Não me importava tanto o que diziam, como a forma com que o diziam. Estavam tão preparados e seu vocabulário era tão rico, que eu quase não os entendia. Discutiam cada palavra, e até a presença ou a ausência de uma vírgula no parágrafo em discussão.
Sua tarefa é ainda mais difícil que aquela assumida por nossa geração quando se proclamou o socialismo em Cuba, a 90 milhas dos Estados Unidos.
Por isso, persistir nos princípios revolucionários é, na minha opinião, o principal legado que podemos lhes deixar. Não há margem para o erro neste instante da história humana. Ninguém deve desconhecer essa realidade.
A direção do Partido deve ser a soma dos melhores talentos políticos de nosso povo, capaz de enfrentar a política do império que coloca em perigo a espécie humana e produz gansgters como os da OTAN, capazes de lançar em apenas 29 dias, com a inglória operação Odisseia ao Amanhecer, mais de 4.000 missões de bombardeio sobre um país da África.
É dever da nova geração de homens e mulheres revolucionários ser modelo de dirigentes modestos, estudiosos e incansáveis lutadores pelo socialismo. Sem dúvida, constitui um desafio difícil na época bárbara das sociedades de consumo superar o sistema de produção capitalista, que fomenta e promove os instintos egoístas do ser humano.
A nova geração é chamada a retificar e mudar sem vacilações tudo o que deve ser retificado e mudado, e seguir demonstrando que o socialismo é também a arte de realizar o impossível: construir e levar a cabo a Revolução dos humildes, pelos humildes e para os humildes, e defendê-la durante meio século da mais poderosa potência que já existiu.
O declínio do capitalismo e o fim do crescimento global
Reproduzo o artigo de Jorge Beinstein, comunicação ao Primeiro Encontro Internacional sobre "O direito dos povos à revolta", Caracas 7-8-9 Outubro de 2010 e publicado originalmente no site da Carta Maior:
O início do século XXI assinala um paradoxo crucial: o capitalismo assumiu claramente uma dimensão global, mas iniciou igualmente o seu declínio. As turbulências de 2007-2008 podem ser consideradas como o ponto de partida para o crepúsculo do sistema; a multiplicidade de crises que explodiram nesse período (financeira, produtiva, alimentaria, energética) convergiram com outras como a ambiental ou a do Complexo Industrial Militar do Império, atolado nas suas guerras asiáticas. Esse somatório de crises não resolvidas travam, impedem, a reprodução ampliada do sistema. O artigo é de Jorge Beinstein.
Jorge Beinstein (*)
A "recuperação" foi apenas, um alívio passageiro obtida por uma sobredose de "estímulos" que preparou o caminho para uma recaída que se anuncia terrível.
As fanfarronices dos longínquos anos 1990 sobre o milênio capitalista neoliberal passaram a ser curiosidades históricas; talvez suas últimas manifestações (e já defensivas) foram as campanhas midiáticas, que nos assinalavam o rápido fim das "turbulência financeiras” e o imediato retorno da marcha triunfante da globalização.
No início do último trimestre de 2010, as expectativas optimistas do alto comando do planeta (chefes de estado, presidentes de bancos centrais, gurus da moda e outras estrelas dos “media”) começaram a dar lugar a um pessimismo avassalador. Falam da trajetórias das economias centrais em forma de W, como se após o esvaziamento iniciado em 2007-2008 tivesse ocorrido uma recuperação real, hoje seguido por uma segunda queda, e em cujo término chegaríamos a uma expansão duradoura do sistema, algo como uma segunda penitência que permitiria às elites purgar seus pecados (financeiros) e retomar o caminho ascendente.
A "recuperação" foi apenas um alívio passageiro obtido por uma sobredose de "estímulos" que preparou o caminho para uma recaída que se anuncia terrível. Como o paciente não tem cura, a sua doença não é o resultado de um acidente, de uma mau comportamento ou de um ataque de um vírus (que a super ciência da civilização mais sofisticada da história, mais cedo ou mais tarde, possa controlar), mas sim o passar inexorável do tempo, o envelhecimento irreversível que chegou à etapa senil.
A modernidade capitalista já quase não tem horizontes de referência, o seu futuro visível se retrai a uma velocidade inesperada, a sua possível sobrevivência parece apenas ser possível na forma de cenários monstruosos, marcados por genocídios, militarizações e destruições ambientais, cuja magnitude não tem precedentes na história humana.
O capitalismo tornou-se finalmente mundial, no sentido mais estrito do termo, logrando chegar até os recantos mais escondidos. Nesse sentido, pode dizer-se que a civilização burguesa de raiz ocidental é agora a única civilização no planeta (incluindo adaptações culturais muito diversas). Mas a vitória da globalização chega ao mesmo tempo em que começa o seu declínio; em outras palavras, se olharmos para este novo século a partir da perspectiva do domínio global de longo prazo do capitalismo, aparece-nos como a primeira etapa de seu declínio e, em consequência, a condição necessária, mas não suficiente, está instalada para a emergência do post capitalismo.
Despesas militares mundiais em 2010. Estamos entrando numa nova era caracterizada pela esfriamento do capitalismo global e pelos fracassos das tentativas para relançar as economias imperialistas, o que coincide com o atolamento na guerra colonial da Eurásia. Nesta área, os Estados Unidos e seus aliados estão a sofrer um desastre geopolítico o qual apresenta, numa primeira aproximação, a imagem de um império cercado. Mas por trás dessa imagem se desenvolve um processo surdo de relançamento imperialista, de nova ofensiva apoiada por seu aparato militar e uma ampla gama de dispositivos de comunicação e ideológicos que a acompanham. Os Estados Unidos vão configurando na sua marcha uma renovada estratégia global e uma política de estado cujos primeiros passos foram dados já no fim da presidência de George W. Bush e que tomou forma com a chegada de Obama à Casa Branca. O império decadente, como outros impérios decadentes do passado, tenta superar o seu declínio econômico utilizando ao máximo aquilo que considera a sua vantagem comparativa: o aparato militar. Sua agressividade aumenta o ritmo do seu declínio industrial, comercial e financeiro, suas ilusões militaristas são a compensação psicológica para suas dificuldades diplomáticas e económicas e incentiva o desenvolvimento de aventuras perigosas, de massacres nas áreas periféricas e de atitudes neofascistas.
A nova estratégia inclui o lançamento de uma combinação de ações militares, comunicacionais e diplomáticas, destinadas a fustigar os inimigos e concorrentes, provocar disputas e desestabilizações, criando conflitos e situações mais ou menos caóticas capazes de debilitar as potências medias e grandes e a partir daí restaurar posições de força actualmente em declínio. Como exemplo, podemos citar a extensão da agressão contra o Afeganistão-Paquistão, as ameaças (e preparativos) de guerra contra o Irão e contra a Coreia do Norte, a provocação de contradições entre o Japão e a China, etc..
Além disso, desde o fim da era Bush, se desenvolvem grandes ofensivas sobre a África e especialmente sobre a América Latina, o tradicional quintal do fundo, hoje atravessado por governos esquerdizantes, mais ou menos progressistas que acabaram por configurar um espaço relativamente independente do amo colonial. Aí, a ofensiva dos EUA, aparece como um conjunto de acções concertadas com uma forte dose de pragmatismo, destinadas a recontrolar a região. Sua essência fica revelada quando se detecta o seu objetivo; não se trata agora principalmente de ocupar mercados, de dominar indústrias, de extrair benefícios financeiros, pois já não estamos no século XX. A mirada imperial aponta em direção a recursos naturais estratégicos (petróleo, grandes territórios agrícolas produtores de biocombustíveis, água, lítio, etc). Em muitos casos as populações locais com suas instituições, sindicatos e o conjunto das suas redes sociais constituem obstáculos a seus projetos, barreiras a eliminar ou a reduzir ao estado vegetativo (nesse sentido, o que ocorreu no Iraque pode ser considerado um caso exemplar).
É necessário tomar consciência de que o poder imperial colocou em marcha uma estratégia de conquista de longo prazo no estilo daquela que implementou na Eurásia; trata-se de uma tentativa depredadora-genocida cujo único precedente na região foi o que ocorreu há quinhentos anos com a conquista colonial.
O fenómeno é tão profundo e imenso que se torna quase invisível aos olhares progressistas, maravilhados com os êxitos fáceis obtidos durante a década passada. Os “progressistas” buscam vias de negociação, equilíbrios “civilizados”, oscilando de fracasso em fracasso porque o interlocutor racional para suas propostas só existe na sua imaginação.
Hoje, o sistema de poder do império se apoia numa “razão de estado” baseada no desespero, produzida por um cérebro senil, em última instância, uma razão delirante que vê os acordos, as negociações diplomáticas ou as manobras políticas de seus próprios aliados-lacaios como portas abertas para os seus planos agressivos. A única coisa que realmente lhe interessa é recuperar os territórios perdidos, desestabilizar os espaços não controlados, golpear e golpear para voltar a golpear. A sua lógica se constrói sobre uma sonhada vaga de reconquista cuja magnitude por vezes ultrapassa os próprios estrategas imperiais (e obviamente, a um amplo leque de dirigentes políticos norteamericanos).
Mas o império está doente, é gigantesco mas está cheio de pontos fracos, o tempo corre contra ele, traz novos males económicos, novas degradações sociais e amplifica as áreas de autonomia e rebelião.
O esgotamento dos estímulos
No final de 2010 assistiu-se ao esgotamento dos incentivos financeiros injetados nas potências centrais, processo iniciado a partir do aprofundamento da crise global em 2007-2008.
O caso norte-americano foi descrito de maneira contundente por Bud Comrad, economista chefe da Casey Research: "Em 2009, o governo federal teve um déficit fiscal de cerca de 1,5 trilhões de dólares; por seu turno, a Reserva Federal gastou cerca de 1,5 trilhões de dólares para comprar dívidas de hipotecas e, assim, evitar o colapso deste mercado. Isso significa que o governo gastou US$ 3 trilhões para uma pequena recuperação avaliada em 3% do PIB, cerca de 400 bilhões de dólares em crescimento económico. Pois bem, gastar 3 trilhões de dólares para obter 400 bilhões é um péssimo negócio… " [1] .
Com as políticas de "estímulo" (uma espécie de neokeynesianismo-neoliberal) não chegou a recuperação durável das grandes potências; o que realmente chegou foi uma avalanche de dívidas públicas: entre 2007 (último ano antes da crise) e 2010, a relação entre a dívida pública e o produto interno bruto passará de 64% a 84% na Alemanha, de 64% a 94% na França, de 63% a 100% nos Estados Unidos e de 44% a 90% na Inglaterra [2] .
Logo a seguir aconteceu o que inevitavelmente teria que acontecer: iniciou-se a segunda etapa da crise a partir da explosão da dívida pública grega que antecipava outras na União Europeia, afetando não só os países devedores mais vulneráveis mas também os seus principais credores, diante dos quais se levantava a ameaça de uma sobreacumulação de ativos de crédito-lixo: em fins de 2009, as dívidas dos chamados “PIIGS” (Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha, ou seja, os países europeus expostos pelo sistema mediático como os mais vulneráveis) em relação a França, Inglaterra e Alemanha somavam uns 2 trilhões de dólares, soma equivalente ao 70% do Produto Interno Bruto da França ou a 75% do da Inglaterra.
Se a primeira fase da crise foi marcada por incentivos do governo para o setor privado e a expansão da dívida pública, a segunda fase começa com o início do fim da generosidade do Estado (além de algumas possíveis futuras tentativas de reativação): a chegada dos cortes de gastos, reduções salariais, aumentos nas taxas de juros, em síntese, a porta de entrada para uma época de contração ou estagnação econômica que se irá mantendo no tempo e se estendendo no espaço.
Estamos nos movendo para o arrefecimento do motor da economia global; os países do G7 sentem-se esmagados pela dívida na sequência de uma reativação débil e efémera graças às políticas de subsídios. Suas dívidas públicas e privadas vieram crescendo até aproximarem-se agora do seu ponto de saturação; em 1990 as dívidas totais do G7 (públicas + privadas) representavam cerca de 160% da soma dos seus Produtos Internos Brutos; no ano 2000 tinham subido a 180% e em 2010 superavam 380% (110% para as dívidas pública e 270% para as dívidas privadas) [3] .
A escolha a enfrentar agora é simples: tentar acumular mais dívidas, o que lhes permitiria adiar a recessão por um tempo curto (com alta probabilidade de descontrole e elevada turbulência no sistema global), ou entrar em breve num período de recessão (com esperança de controle) que se anuncia muito prolongada; na realidade não se trata de duas alternativas antagónicas, mas sim de um único horizonte negro ao qual se pode chegar por distintos caminhos e a várias velocidades.
Hipertrofia financeira
A chuva de estímulos, transferências massivas de renda para as elites dominantes (com rendimentos aceleradamente decrescentes) aparece como o capítulo mais recente de um amplo ciclo de hipertrofia financeira originada nos anos 1970 (e talvez um pouco antes) quando o mundo capitalista, imerso em uma gigantesca crise de sobreprodução, teve que utilizar, a partir do seu centro imperial, os Estados Unidos, as suas duas muletas históricas: o militarismo e o capital financeiro. Por trás de ambos fenômenos se encontrava um velho conhecido: o Estado, aumentando os seus gastos bélicos, flexibilizando os seus controles sobre os negócios financeiros, introduzindo reformas no mercado laboral que abaixavam os salários em relação aos aumentos da produtividade.
O processo foi encabeçado pela superpotência hegemônica mas integrando os dois espaços sub-imperialistas associados (Europa Ocidental e Japão). É necessário esclarecer que a unipolaridade no mundo capitalista, com as suas consequências económicas, políticas, culturais e militares, se iniciou em 1945 e não em 1991, embora a partir desta última data (com o derrube da URSS) se tenha tornado planetária.
Tratou-se de uma mudança de época, de uma transformação que permitiu controlar a crise embora degradando o sistema de forma irreversível. As grandes burguesias centrais se deslocaram na sua maior parte para as cúpulas dos negócios especulativos, fundindo interesses financeiros e produtivos, convertendo a produção e o comércio em complexas redes de operações governadas cada vez mais por comportamentos de curto prazo. A hegemonia parasitária, rasgo distintivo da era senil do capitalismo tomou conta dos grandes negócios globais e engendrou uma subcultura, na realidade uma degeneração cultural desintegradora, baseada no individualismo consumista que foi desestruturando os fundamentos ideológicos e institucionais da ordem burguesa. Daí derivaram os fenômenos de crise de legitimidade dos sistemas políticos e dos aparelhos institucionais em geral servindo de caldo de cultura para as deformações mafiosas das burguesias centrais e periféricas (complexo leque de lumpem-burguesias globais).
Teto energético e “destruição criadora”
Do ponto de vista das relações entre o sistema econômico e a sua base material, a depredação (como comportamento central do sistema) começou a tomar o lugar da reprodução. Na realidade, o núcleo cultural depredador existiu desde o grande avanço histórico do capitalismo industrial (em fins do século XVIII, principalmente na Inglaterra) e ainda antes durante o longo período pré-capitalista ocidental. Marcou para sempre os sistemas tecnológicos e o desenvolvimento científico, começando pelo seu pilar energético (carvão mineral e depois o petróleo) e seguindo por uma ampla variedade de explorações mineiras de recursos naturais não renováveis (essa exacerbação depredadora é um dos rasgos distintivos da civilização burguesa comparada com as civilizações anteriores); no entanto, durante as etapas de juventude e maturidade do sistema a depredação estava subordinada à reprodução ampliada do sistema.
A mutação parasitária dos anos 1970-1980-1990 não permitiu superar a crise de sobreprodução mas sim torná-la crónica, embora controlada, amortecida, exacerbando a pilhagem dos recursos naturais não renováveis e introduzindo grandes escalas técnicas que possibilitaram a sobre-exploração de recursos renováveis, violentando, destruindo os seus ciclos de reprodução (é o caso da agricultura baseada em transgénicos e herbicidas de alto poder destrutivo, como o glifosato). Isso ocorria quando vários desses recursos (por exemplo, hidrocarbonetos), se aproximavam do seu nível máximo de extração.
A avalanche do “curto-prazismo” (da financeirização cultural do capitalismo) liquidou toda possibilidade de planificação a longo prazo de uma possível reconversão energética, o que coloca o tema da viabilidade histórico-civilizacional das vias de reconversão (economia de energia, recursos energéticos renováveis, etc). Viabilidade no contexto das relações de poder existentes, das suas estruturas industriais e agrícolas, em síntese, do capitalismo concreto, inseparável da obtenção de “lucros-aqui-e agora”. Não nos referimos já à probabilidade da sobrevivência das gerações futuras.
O sistema tecnológico do capitalismo não estava preparado para uma reconversão energética, a questão não era uma preocupação prioritária para as elites dominantes (o que não lhes impedia de “preocupar-se” com o problema). Não é a primeira vez na história do declínio das civilizações que os interesses imediatos das classes superiores entram em antagonismo com a sobrevivência a longo prazo.
O tecto energético que encontrou a reprodução do capitalismo converge com outros tectos de recursos não renováveis que afectarão rapidamente um amplo espectro de actividades mineiras. A isto se soma a exploração selvagem dos recursos naturais renováveis. Apresenta-se assim um cenário de esgotamento geral de recursos naturais a partir do sistema tecnológico disponível, mais concretamente, do sistema social e seus paradigmas, quer dizer, do capitalismo como estilo de vida (consumista, individualista, autoritário-centralizador-depredador).
Da crise crônica de sobreprodução para a crise geral de subprodução. O longo ciclo do capitalismo industrial.
Por outro lado, a crise de recursos naturais, indissociável do desastre ambiental, converge com a crise da hegemonia parasitária. Nas primeiras décadas da crise crônica, o processo de financeirização impulsionou a expansão consumista (sobretudo nos países ricos), a concretização de importantes projetos industriais e de subsídios públicos para a procura interna, de grandes aventuras militares imperialistas; mas ao fim do caminho as euforias se dissiparam para deixar a descoberto imensas montanhas de dívidas públicas e privadas. A festa financeira (que teve durante o seu trajecto numerosos acidentes) se converte em teto financeiro que bloqueia o crescimento.
As turbulências de 2007-2008 podem ser consideradas como o ponto de partida para o crepúsculo do sistema; a multiplicidade de crises que explodiram nesse período (financeira, produtiva, alimentaria, energética) convergiram com outras como a ambiental ou a do Complexo Industrial Militar do Império, atolado nas suas guerras asiáticas. Esse somatório de crises não resolvidas travam, impedem, a reprodução ampliada do sistema.
Vista a partir do longo prazo, a sucessão de crises de sobreprodução no capitalismo ocidental durante o século XIX não marcou um simples encadeamento de quedas e recuperações a níveis cada vez mais altos de desenvolvimento das forças produtivas; o que acontecia é que a cada depressão o sistema se recompunha mas acumulando no seu trajecto massas crescentes de parasitismo.
O cancro financeiro irrompeu de forma triunfal, dominante entre fins do século XIX e começos do século XX, obtendo o controlo absoluto do sistema sete ou oito décadas depois; mas o seu desenvolvimento havia começado muito tempo antes, financiando estruturas industriais e comerciais cada vez mais concentradas e os estados imperialistas de onde se expandiam as burocracias civis e militares. A hegemonia da ideologia do progresso e do discurso produtivista serviu para ocultar o fenómeno, instalou a ideia de que o capitalismo, ao invés das civilizações anteriores, não acumulava parasitismo mas somente forças produtivas que, ao expandir-se, criavam problemas de inadaptação, superáveis no interior do sistema mundial, resolvidos através de processos de “destruição criadora”. O parasitismo capitalista em grande escala, quando se tornava evidente, era considerado como uma forma de “atraso” ou uma “degeneração” passageira na marcha ascendente da modernidade.
Essa maré ideológica influenciou também boa parte do pensamento anticapitalista (em última instância “progressista”) dos séculos XIX e XX, convencido de que a corrente imparável do desenvolvimento das forças produtivas terminaria por afrontar as relações capitalistas de produção, saltando por cima delas, esmagando-as com uma avalanche revolucionária de operários industriais dos países mais “avançados” aos quais se seguiriam os dos chamados “países atrasados”. A ilusão do progresso indefinido ocultou a perspectiva da decadência e dessa maneira deixou a meio caminho o pensamento crítico, lhe retirou radicalidade, com consequências culturais negativas para os movimentos de emancipação dos oprimidos do centro e da periferia.
Por seu lado, o militarismo moderno tem as suas raízes mais recentes no século XIX, desde as guerras napoleônicas, chegando à guerra franco-prussiana, até irromper, na primeira guerra mundial, como “Complexo Militar Industrial” (embora seja possível encontrar antecedentes importantes no Ocidente nas primeiras indústrias de armamento de tipo moderno, aproximadamente a partir do século XVI). No seu começo, ele foi apercebido como um instrumento privilegiado das estratégias imperialistas e como reactivador económico do capitalismo, mas este é apenas um aspecto do fenómeno que ocultava ou subestimava a sua profunda natureza parasitária, o fato de que por trás do monstro militar ao serviço da reprodução do sistema se ocultava um monstro muito mais poderoso a longo prazo: o do consumo improdutivo, causador de défices públicos que, no fim do seu percurso, não incentivam mais a expansão mas sim a estagnação ou a contracção da economia.
Actualmente, o Complexo Militar Industrial norte-americano (em torno do qual se reproduzem os seus sócios da NATO) gasta em termos reais mais de um trilhão de dólares, contribui de maneira crescente para o déficit fiscal e, por conseguinte, para o endividamento do Império (e a prosperidade dos negócios financeiros beneficiários do dito défice). A sua eficácia militar é declinante mas a sua burocracia é cada vez maior, a corrupção penetrou em todas as suas actividades e já não é o grande gerador de empregos, como em outras épocas, pois o desenvolvimento da tecnologia industrial-militar reduziu significativamente esta função (a época do keynesianismo militar como eficaz estratégia anti-crise pertence ao passado). Ao mesmo tempo, é possível constatar que nos Estados Unidos se produziu uma integração de negócios entre a esfera industrial-militar, as redes financeiras, as grande empresas energéticas, os grupos mafiosos, as “empresas” de segurança e outras actividades muito dinâmicas, conformando assim o espaço dominante do sistema de poder imperial.
Nem a crise energética em torno da chegada do “Peak Oil” (a faixa de máxima produção petrolífera mundial, a partir da qual se desenvolve o seu declínio) deveria ser restringida à história das últimas décadas; é necessário entendê-la como a fase declinante do amplo ciclo da exploração moderna dos recursos naturais não renováveis, desde o começo do capitalismo industrial que pôde realizar o seu arranque e posterior expansão graças a esses combustíveis energéticos abundantes, baratos e facilmente transportáveis, desenvolvendo em primeiro lugar o ciclo do carvão, sob hegemonia inglesa no século XIX, e logo o ciclo do petróleo, sob hegemonia norte-americana no século XX. Este ciclo energético condicionou todo o desenvolvimento tecnológico do sistema e foi a vanguarda da dinâmica depredadora do capitalismo estendida ao conjunto dos recursos naturais e do ecossistema em geral.
Em síntese, o desenvolvimento da civilização burguesa durante os dois últimos séculos (com raízes num passado ocidental muito mais antigo) terminou por engendrar um processo irreversível de decadência; a depredação ambiental e a expansão parasitária, estreitamente interrelacionadas, estão na base do fenômeno. A dinâmica do desenvolvimento econômico do capitalismo, marcada por uma sucessão de crises de sobreprodução, constitui o motor do processo depredador-parasitário que conduz inevitavelmente a uma crise prolongada de subprodução (o capitalismo obrigado a crescer e a depredar indefinidamente para não perecer, termina por destruir a sua base material). Existe uma interrelação dialética perversa entre a expansão da massa global de lucros, sua velocidade crescente, a multiplicação das estruturas burocráticas civis e militares de controlo social, a concentração mundial de rendimentos, a subida da maré parasitária e a depredação do ecossistema.
Isso significa que a superação necessária do capitalismo não aparece como o passo indispensável para prosseguir “a marcha do progresso”, mas, em primeiro lugar, como tentativa de sobrevivência humana e do seu contexto ambiental.
A decadência é a última etapa de um amplo super ciclo histórico, sua fase declinante, seu envelhecimento irreversível (sua senilidade). Extremando os reducionismos, tão praticados pelas “ciências sociais”, poderíamos falar de “ciclos” de distinta duração: energético, alimentar, militar, financeiro, produtivo, estatal, etc., e assim descrever em cada caso percursos que se iniciam no Ocidente, entre fins do século XVIII e começos do século XIX, com raízes anteriores e envolvendo espaços geográficos crescentes até assumir finalmente uma dimensão planetária, para, em seguida, cada um deles entrar em declínio. A coincidência histórica de todos esses declínios e a fácil detecção de densas interrelações entre todos esses ciclos nos sugerem a existência de um único super ciclo que os inclui a todos. Trata-se do ciclo da civilização burguesa que se expressa através de uma multiplicidade de “aspectos” (produtivo, moral, político, militar, ambiental, etc.).
Declínio do Império, relançamento militarista, ilusões periféricas e insurreição global
Toda a história do capitalismo gira, desde fins do século XVIII, em torno do domínio, primeiro inglês e em seguida estadunidense. Capitalismo mundial, imperialismo e predomínio anglo-norteamericano constituem um só fenômeno (agora decadente).
A articulação sistêmica do capitalismo aparece historicamente indissociável do articulador imperial, mas num futuro previsível não aparece nenhum novo imperialismo global ascendente; em consequência, o planeta burguês vai perdendo uma peça decisiva do seu processo de reprodução. A União Europeia e o Japão são tão decadentes como os Estados Unidos. A China baseou a sua espectacular expansão numa grande ofensiva exportadora para os mercados, agora em declínio, dessas três potências centrais.
O capitalismo vai ficando à deriva a menos que prognostiquemos o surgimento próximo de um tipo de mão invisível universal (e burguesa) capaz de impor a ordem (monetária, comercial, político-militar,etc.). Neste caso estaríamos extrapolando ao nível da humanidade futura a referência à mão invisível (realmente inexistente) do mercado capitalista afirmada pela teoria económica liberal.
O declínio da maior civilização jamais conhecida na história humana apresenta vários cenários para o futuro: alternativas de auto-destruição e de regeneração, de genocídio e de solidariedade, de desastre ecológico e de reconciliação do homem com seu meio ambiente. Estamos retomando um velho debate sobre alternativas interrompido pela euforia neoliberal; a crise rompe o bloqueio e nos permite pensar o futuro.
Voltemos à reflexão inicial deste texto: o início do século XXI assinala um paradoxo crucial: o capitalismo assumiu claramente uma dimensão global, mas iniciou igualmente o seu declínio.
Por outro lado, cem anos de revoluções e contra revoluções periféricas produziram grandes mudanças culturais: agora na periferia (completamente modernizada, isto é, completamente subdesenvolvida) existe um enorme potencial de autonomia nas classes baixas. Ali se apresenta o que de maneira talvez demasiado simplista poderíamos definir como património histórico democrático forjado ao longo do século XX. Os povos periféricos submergidos construíram sindicatos, organizações camponesas, participaram em votações de todo o tipo, fizeram revoluções (muitas delas com bandeiras socialistas), reformas democratizantes; na maior parte das vezes fracassaram. Tudo isto forma parte da sua memória, não desapareceu; pelo contrário, é experiência acumulada, processada em geral de maneira subterrânea, invisível para os observadores superficiais. Isto foi reforçado pela própria modernização que, por exemplo, lhes fornece instrumentos comunicacionais que lhes permite interactuar, intercambiar informações, socializar reflexões. Finalmente, a decadência geral do sistema, o possível começo do fim da sua hegemonia cultural, abre um gigantesco espaço para a criatividade dos oprimidos.
A guerra euro-asiática engendrou um imenso pântano geopolítico do qual os ocidentais não sabem como sair, consolidou e estendeu espaços de rebelião e autonomia cuja contenção é cada dia mais difícil, situação perante a qual o Império redobra as suas ameaças e agressões. A Coreia do Norte não pôde ser dobrada, nem tão pouco o Irão, a resistência palestina segue de pé e Israel, pela primeira vez na sua história, sofreu uma derrota militar no sul do Líbano; a guerra do Iraque não pôde ser ganha pelos Estados Unidos o que os coloca ali numa situação na qual todos os caminhos conduzem à perda do poder nesse país.
No outro extremo da periferia, América Latina, o despertar popular transcende os governos progressistas e deteriora estrategicamente as poucas oligarquias direitistas que ainda controlam o poder político. O projeto estadunidense de restauração de “governos amigos” tropeça num escolho fundamental: a profunda degradação das elites aliadas, sua incapacidade para governar em vários dos países candidatos à viragem para a direita, sendo que o Império não pode (não está em condições) de deter ou desacelerar a sua ofensiva, à espera de melhores contextos políticos. O ritmo da sua crise sobredetermina a sua estratégia regional; em última instância, isto não é completamente diferente da situação na Ásia onde a dinâmica imperial combina a sofisticação e a variedade de técnicas e estruturas operativas disponíveis com um comportamento absolutamente rude.
Se observarmos o conjunto da periferia atual a partir do longo prazo histórico, vemos um poder imperial desorientado enfrentando uma onda gigantesca e plural de povos submergidos desde o Afeganistão até a Bolívia, desde a Colômbia até as Filipinas, expressão da crise da modernidade subdesenvolvida. É o começo de um despertar popular muito superior ao do século XX.
Em meio a estas tensões aparece um leque colorido de ilusões periféricas fundadas na possibilidade de gerar uma desconexão encabeçada pelas nações chamadas emergentes; o que é no fundo uma fantasia que não toma em consideração o facto decisivo de que todas as “emergências” (as da Rússia, China, Brasil, Índia, etc) se apoiam na sua inserção nos mercados dos países ricos. Se esses estados que vêm praticando neokeynesianismos mais ou menos audazes, compensando o esfriamento global, quisessem aprofundar esses impulsos de mercado interno e/ou interperiféricos, se encontariam, cedo ou tarde, com as barreiras sociais dos seus próprios sistemas económicos, ou, para descrevê-lo de outra maneira, com os seus próprios capitalismos realmente existentes, em especial, os interesses das suas burguesias financeirizadas e transnacionalizadas.
À medida que a crise se aprofunde, que as debilidades do capitalismo periférico se tornem mais visíveis, que as bases sociais internas das burguesias imperialistas se deteriorem e que o desespero imperial se agudize, a vaga popular global já em marcha não terá outro caminho senão o da sua radicalização, sua transformação em insurreição revolucionária. Complexa, possuindo distintas velocidades e com construções (contra)culturais diversas, avançando a partir de distintas identidades, até à superação do inferno. É somente a partir dessa perspectiva que é possível pensar o postcapitalismo, o renascimento (a reconfiguração) da utopia comunista, já não como resultado da “ciência” social elitista, a partir da superação pelo interior da civilização burguesa através de um tipo de “abolição suave” mas sim da sua negação integral em tanto que expansão ilimitada da pluralidade, recuperando as velhas culturas igualitárias, solidárias, elevando-as até um colectivismo renovado.
Os movimentos insurgentes da periferia atual costumam ser apresentados pelos meios globais de comunicação como causa perdidas, como resistências primitivas à modernização ou como o resultado da atividade de misteriosos grupos de terroristas. A resistência no Afeganistão e na Palestina ou a insurreição colombiana aparecem nessa propaganda protagonizando guerras que nunca poderiam ganhar frente a aparelhos super poderosos; não faltam os pacificadores profissionais que aconselham os combatentes a pôr de lado a sua intransigência e negociar alguma forma de rendição vantajosa “antes que seja tarde demais”. O século XX deveria ser uma boa escola para aqueles que se impressionam com o gigantismo e a eficácia dos aparelhos militares (e dos aparelhos burocráticos em geral) porque este século viu o nascimento vitorioso dos grandes aparelhos modernos, como é hoje o Complexo Militar Industrial dos Estados Unidos, e também foi testemunha da sua ruína, da sua derrota diante de povos em armas, diante da criatividade e da insubmissão dos de baixo.
Nos anos 1990, os neoliberais nos explicavam que a globalização constituía um fenômeno irreversível, que o capitalismo havia adquirido uma dimensão planetária que arrasava com todos os obstáculos nacionais ou locais. Não se davam conta de que essa irreversibilidade, transformada pouco depois em decadência global do sistema, abria as portas a um sujeito inesperado: a insurreição global do século XXI; o tempo (a marcha da crise) joga a seu favor. O império e seus aliados diretos e indiretos quiseram fazê-la abortar, começando por tentar apagar a sua dimensão universal, tratando mediaticamente de transformá-la (fragmentá-la) em uma modesta coleção de resíduos locais sem futuro, mas essas supostas resistências residuais possuem uma vitalidade surpreendente, se reproduzem, sobrevivem a todas as tentativas de extermínio e quando visionamos o percurso futuro do declínio civilizacional em curso, a profunda degradação do mundo burguês, o seu caminhar para a barbárie antecipando crimes ainda maiores, então a globalização da insurreição popular aparece como o caminho mais seguro para a emancipação das maiorias submergidas, o que é também a sua única possibilidade de sobrevivência digna.
NOTAS:
(1) Bud Comrad, 'Beyond the Point of No Return', GooldSeek, 12 de Maio de 2010.
(2) 'La explosion de la deuda pública. Previsiones de la OCDE para 2010', AFP,25-11-2009.
(3) Fonte: FMI, OCDE, McKinsey Global Institute.
[*] Doutorado em economia e professor catedrático das universidades de Buenos Aires e Córdoba, na Argentina, e de Havana, em Cuba. É autor de 'Capitalismo senil: a grande crise da economia global', publicado no Brasil pela editora Record (2001). Dirige o Instituto de Pesquisa Científica da Universidade da Bacia do Prata e publica regularmente em Le Monde Diplomatique (em castelhano). Este texto é uma comunicação ao Primeiro Encontro Internacional sobre "O direito dos povos à revolta", Caracas 7-8-9 Outubro de 2010.
O início do século XXI assinala um paradoxo crucial: o capitalismo assumiu claramente uma dimensão global, mas iniciou igualmente o seu declínio. As turbulências de 2007-2008 podem ser consideradas como o ponto de partida para o crepúsculo do sistema; a multiplicidade de crises que explodiram nesse período (financeira, produtiva, alimentaria, energética) convergiram com outras como a ambiental ou a do Complexo Industrial Militar do Império, atolado nas suas guerras asiáticas. Esse somatório de crises não resolvidas travam, impedem, a reprodução ampliada do sistema. O artigo é de Jorge Beinstein.
Jorge Beinstein (*)
A "recuperação" foi apenas, um alívio passageiro obtida por uma sobredose de "estímulos" que preparou o caminho para uma recaída que se anuncia terrível.
As fanfarronices dos longínquos anos 1990 sobre o milênio capitalista neoliberal passaram a ser curiosidades históricas; talvez suas últimas manifestações (e já defensivas) foram as campanhas midiáticas, que nos assinalavam o rápido fim das "turbulência financeiras” e o imediato retorno da marcha triunfante da globalização.
No início do último trimestre de 2010, as expectativas optimistas do alto comando do planeta (chefes de estado, presidentes de bancos centrais, gurus da moda e outras estrelas dos “media”) começaram a dar lugar a um pessimismo avassalador. Falam da trajetórias das economias centrais em forma de W, como se após o esvaziamento iniciado em 2007-2008 tivesse ocorrido uma recuperação real, hoje seguido por uma segunda queda, e em cujo término chegaríamos a uma expansão duradoura do sistema, algo como uma segunda penitência que permitiria às elites purgar seus pecados (financeiros) e retomar o caminho ascendente.
A "recuperação" foi apenas um alívio passageiro obtido por uma sobredose de "estímulos" que preparou o caminho para uma recaída que se anuncia terrível. Como o paciente não tem cura, a sua doença não é o resultado de um acidente, de uma mau comportamento ou de um ataque de um vírus (que a super ciência da civilização mais sofisticada da história, mais cedo ou mais tarde, possa controlar), mas sim o passar inexorável do tempo, o envelhecimento irreversível que chegou à etapa senil.
A modernidade capitalista já quase não tem horizontes de referência, o seu futuro visível se retrai a uma velocidade inesperada, a sua possível sobrevivência parece apenas ser possível na forma de cenários monstruosos, marcados por genocídios, militarizações e destruições ambientais, cuja magnitude não tem precedentes na história humana.
O capitalismo tornou-se finalmente mundial, no sentido mais estrito do termo, logrando chegar até os recantos mais escondidos. Nesse sentido, pode dizer-se que a civilização burguesa de raiz ocidental é agora a única civilização no planeta (incluindo adaptações culturais muito diversas). Mas a vitória da globalização chega ao mesmo tempo em que começa o seu declínio; em outras palavras, se olharmos para este novo século a partir da perspectiva do domínio global de longo prazo do capitalismo, aparece-nos como a primeira etapa de seu declínio e, em consequência, a condição necessária, mas não suficiente, está instalada para a emergência do post capitalismo.
Despesas militares mundiais em 2010. Estamos entrando numa nova era caracterizada pela esfriamento do capitalismo global e pelos fracassos das tentativas para relançar as economias imperialistas, o que coincide com o atolamento na guerra colonial da Eurásia. Nesta área, os Estados Unidos e seus aliados estão a sofrer um desastre geopolítico o qual apresenta, numa primeira aproximação, a imagem de um império cercado. Mas por trás dessa imagem se desenvolve um processo surdo de relançamento imperialista, de nova ofensiva apoiada por seu aparato militar e uma ampla gama de dispositivos de comunicação e ideológicos que a acompanham. Os Estados Unidos vão configurando na sua marcha uma renovada estratégia global e uma política de estado cujos primeiros passos foram dados já no fim da presidência de George W. Bush e que tomou forma com a chegada de Obama à Casa Branca. O império decadente, como outros impérios decadentes do passado, tenta superar o seu declínio econômico utilizando ao máximo aquilo que considera a sua vantagem comparativa: o aparato militar. Sua agressividade aumenta o ritmo do seu declínio industrial, comercial e financeiro, suas ilusões militaristas são a compensação psicológica para suas dificuldades diplomáticas e económicas e incentiva o desenvolvimento de aventuras perigosas, de massacres nas áreas periféricas e de atitudes neofascistas.
A nova estratégia inclui o lançamento de uma combinação de ações militares, comunicacionais e diplomáticas, destinadas a fustigar os inimigos e concorrentes, provocar disputas e desestabilizações, criando conflitos e situações mais ou menos caóticas capazes de debilitar as potências medias e grandes e a partir daí restaurar posições de força actualmente em declínio. Como exemplo, podemos citar a extensão da agressão contra o Afeganistão-Paquistão, as ameaças (e preparativos) de guerra contra o Irão e contra a Coreia do Norte, a provocação de contradições entre o Japão e a China, etc..
Além disso, desde o fim da era Bush, se desenvolvem grandes ofensivas sobre a África e especialmente sobre a América Latina, o tradicional quintal do fundo, hoje atravessado por governos esquerdizantes, mais ou menos progressistas que acabaram por configurar um espaço relativamente independente do amo colonial. Aí, a ofensiva dos EUA, aparece como um conjunto de acções concertadas com uma forte dose de pragmatismo, destinadas a recontrolar a região. Sua essência fica revelada quando se detecta o seu objetivo; não se trata agora principalmente de ocupar mercados, de dominar indústrias, de extrair benefícios financeiros, pois já não estamos no século XX. A mirada imperial aponta em direção a recursos naturais estratégicos (petróleo, grandes territórios agrícolas produtores de biocombustíveis, água, lítio, etc). Em muitos casos as populações locais com suas instituições, sindicatos e o conjunto das suas redes sociais constituem obstáculos a seus projetos, barreiras a eliminar ou a reduzir ao estado vegetativo (nesse sentido, o que ocorreu no Iraque pode ser considerado um caso exemplar).
É necessário tomar consciência de que o poder imperial colocou em marcha uma estratégia de conquista de longo prazo no estilo daquela que implementou na Eurásia; trata-se de uma tentativa depredadora-genocida cujo único precedente na região foi o que ocorreu há quinhentos anos com a conquista colonial.
O fenómeno é tão profundo e imenso que se torna quase invisível aos olhares progressistas, maravilhados com os êxitos fáceis obtidos durante a década passada. Os “progressistas” buscam vias de negociação, equilíbrios “civilizados”, oscilando de fracasso em fracasso porque o interlocutor racional para suas propostas só existe na sua imaginação.
Hoje, o sistema de poder do império se apoia numa “razão de estado” baseada no desespero, produzida por um cérebro senil, em última instância, uma razão delirante que vê os acordos, as negociações diplomáticas ou as manobras políticas de seus próprios aliados-lacaios como portas abertas para os seus planos agressivos. A única coisa que realmente lhe interessa é recuperar os territórios perdidos, desestabilizar os espaços não controlados, golpear e golpear para voltar a golpear. A sua lógica se constrói sobre uma sonhada vaga de reconquista cuja magnitude por vezes ultrapassa os próprios estrategas imperiais (e obviamente, a um amplo leque de dirigentes políticos norteamericanos).
Mas o império está doente, é gigantesco mas está cheio de pontos fracos, o tempo corre contra ele, traz novos males económicos, novas degradações sociais e amplifica as áreas de autonomia e rebelião.
O esgotamento dos estímulos
No final de 2010 assistiu-se ao esgotamento dos incentivos financeiros injetados nas potências centrais, processo iniciado a partir do aprofundamento da crise global em 2007-2008.
O caso norte-americano foi descrito de maneira contundente por Bud Comrad, economista chefe da Casey Research: "Em 2009, o governo federal teve um déficit fiscal de cerca de 1,5 trilhões de dólares; por seu turno, a Reserva Federal gastou cerca de 1,5 trilhões de dólares para comprar dívidas de hipotecas e, assim, evitar o colapso deste mercado. Isso significa que o governo gastou US$ 3 trilhões para uma pequena recuperação avaliada em 3% do PIB, cerca de 400 bilhões de dólares em crescimento económico. Pois bem, gastar 3 trilhões de dólares para obter 400 bilhões é um péssimo negócio… " [1] .
Com as políticas de "estímulo" (uma espécie de neokeynesianismo-neoliberal) não chegou a recuperação durável das grandes potências; o que realmente chegou foi uma avalanche de dívidas públicas: entre 2007 (último ano antes da crise) e 2010, a relação entre a dívida pública e o produto interno bruto passará de 64% a 84% na Alemanha, de 64% a 94% na França, de 63% a 100% nos Estados Unidos e de 44% a 90% na Inglaterra [2] .
Logo a seguir aconteceu o que inevitavelmente teria que acontecer: iniciou-se a segunda etapa da crise a partir da explosão da dívida pública grega que antecipava outras na União Europeia, afetando não só os países devedores mais vulneráveis mas também os seus principais credores, diante dos quais se levantava a ameaça de uma sobreacumulação de ativos de crédito-lixo: em fins de 2009, as dívidas dos chamados “PIIGS” (Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha, ou seja, os países europeus expostos pelo sistema mediático como os mais vulneráveis) em relação a França, Inglaterra e Alemanha somavam uns 2 trilhões de dólares, soma equivalente ao 70% do Produto Interno Bruto da França ou a 75% do da Inglaterra.
Se a primeira fase da crise foi marcada por incentivos do governo para o setor privado e a expansão da dívida pública, a segunda fase começa com o início do fim da generosidade do Estado (além de algumas possíveis futuras tentativas de reativação): a chegada dos cortes de gastos, reduções salariais, aumentos nas taxas de juros, em síntese, a porta de entrada para uma época de contração ou estagnação econômica que se irá mantendo no tempo e se estendendo no espaço.
Estamos nos movendo para o arrefecimento do motor da economia global; os países do G7 sentem-se esmagados pela dívida na sequência de uma reativação débil e efémera graças às políticas de subsídios. Suas dívidas públicas e privadas vieram crescendo até aproximarem-se agora do seu ponto de saturação; em 1990 as dívidas totais do G7 (públicas + privadas) representavam cerca de 160% da soma dos seus Produtos Internos Brutos; no ano 2000 tinham subido a 180% e em 2010 superavam 380% (110% para as dívidas pública e 270% para as dívidas privadas) [3] .
A escolha a enfrentar agora é simples: tentar acumular mais dívidas, o que lhes permitiria adiar a recessão por um tempo curto (com alta probabilidade de descontrole e elevada turbulência no sistema global), ou entrar em breve num período de recessão (com esperança de controle) que se anuncia muito prolongada; na realidade não se trata de duas alternativas antagónicas, mas sim de um único horizonte negro ao qual se pode chegar por distintos caminhos e a várias velocidades.
Hipertrofia financeira
A chuva de estímulos, transferências massivas de renda para as elites dominantes (com rendimentos aceleradamente decrescentes) aparece como o capítulo mais recente de um amplo ciclo de hipertrofia financeira originada nos anos 1970 (e talvez um pouco antes) quando o mundo capitalista, imerso em uma gigantesca crise de sobreprodução, teve que utilizar, a partir do seu centro imperial, os Estados Unidos, as suas duas muletas históricas: o militarismo e o capital financeiro. Por trás de ambos fenômenos se encontrava um velho conhecido: o Estado, aumentando os seus gastos bélicos, flexibilizando os seus controles sobre os negócios financeiros, introduzindo reformas no mercado laboral que abaixavam os salários em relação aos aumentos da produtividade.
O processo foi encabeçado pela superpotência hegemônica mas integrando os dois espaços sub-imperialistas associados (Europa Ocidental e Japão). É necessário esclarecer que a unipolaridade no mundo capitalista, com as suas consequências económicas, políticas, culturais e militares, se iniciou em 1945 e não em 1991, embora a partir desta última data (com o derrube da URSS) se tenha tornado planetária.
Tratou-se de uma mudança de época, de uma transformação que permitiu controlar a crise embora degradando o sistema de forma irreversível. As grandes burguesias centrais se deslocaram na sua maior parte para as cúpulas dos negócios especulativos, fundindo interesses financeiros e produtivos, convertendo a produção e o comércio em complexas redes de operações governadas cada vez mais por comportamentos de curto prazo. A hegemonia parasitária, rasgo distintivo da era senil do capitalismo tomou conta dos grandes negócios globais e engendrou uma subcultura, na realidade uma degeneração cultural desintegradora, baseada no individualismo consumista que foi desestruturando os fundamentos ideológicos e institucionais da ordem burguesa. Daí derivaram os fenômenos de crise de legitimidade dos sistemas políticos e dos aparelhos institucionais em geral servindo de caldo de cultura para as deformações mafiosas das burguesias centrais e periféricas (complexo leque de lumpem-burguesias globais).
Teto energético e “destruição criadora”
Do ponto de vista das relações entre o sistema econômico e a sua base material, a depredação (como comportamento central do sistema) começou a tomar o lugar da reprodução. Na realidade, o núcleo cultural depredador existiu desde o grande avanço histórico do capitalismo industrial (em fins do século XVIII, principalmente na Inglaterra) e ainda antes durante o longo período pré-capitalista ocidental. Marcou para sempre os sistemas tecnológicos e o desenvolvimento científico, começando pelo seu pilar energético (carvão mineral e depois o petróleo) e seguindo por uma ampla variedade de explorações mineiras de recursos naturais não renováveis (essa exacerbação depredadora é um dos rasgos distintivos da civilização burguesa comparada com as civilizações anteriores); no entanto, durante as etapas de juventude e maturidade do sistema a depredação estava subordinada à reprodução ampliada do sistema.
A mutação parasitária dos anos 1970-1980-1990 não permitiu superar a crise de sobreprodução mas sim torná-la crónica, embora controlada, amortecida, exacerbando a pilhagem dos recursos naturais não renováveis e introduzindo grandes escalas técnicas que possibilitaram a sobre-exploração de recursos renováveis, violentando, destruindo os seus ciclos de reprodução (é o caso da agricultura baseada em transgénicos e herbicidas de alto poder destrutivo, como o glifosato). Isso ocorria quando vários desses recursos (por exemplo, hidrocarbonetos), se aproximavam do seu nível máximo de extração.
A avalanche do “curto-prazismo” (da financeirização cultural do capitalismo) liquidou toda possibilidade de planificação a longo prazo de uma possível reconversão energética, o que coloca o tema da viabilidade histórico-civilizacional das vias de reconversão (economia de energia, recursos energéticos renováveis, etc). Viabilidade no contexto das relações de poder existentes, das suas estruturas industriais e agrícolas, em síntese, do capitalismo concreto, inseparável da obtenção de “lucros-aqui-e agora”. Não nos referimos já à probabilidade da sobrevivência das gerações futuras.
O sistema tecnológico do capitalismo não estava preparado para uma reconversão energética, a questão não era uma preocupação prioritária para as elites dominantes (o que não lhes impedia de “preocupar-se” com o problema). Não é a primeira vez na história do declínio das civilizações que os interesses imediatos das classes superiores entram em antagonismo com a sobrevivência a longo prazo.
O tecto energético que encontrou a reprodução do capitalismo converge com outros tectos de recursos não renováveis que afectarão rapidamente um amplo espectro de actividades mineiras. A isto se soma a exploração selvagem dos recursos naturais renováveis. Apresenta-se assim um cenário de esgotamento geral de recursos naturais a partir do sistema tecnológico disponível, mais concretamente, do sistema social e seus paradigmas, quer dizer, do capitalismo como estilo de vida (consumista, individualista, autoritário-centralizador-depredador).
Da crise crônica de sobreprodução para a crise geral de subprodução. O longo ciclo do capitalismo industrial.
Por outro lado, a crise de recursos naturais, indissociável do desastre ambiental, converge com a crise da hegemonia parasitária. Nas primeiras décadas da crise crônica, o processo de financeirização impulsionou a expansão consumista (sobretudo nos países ricos), a concretização de importantes projetos industriais e de subsídios públicos para a procura interna, de grandes aventuras militares imperialistas; mas ao fim do caminho as euforias se dissiparam para deixar a descoberto imensas montanhas de dívidas públicas e privadas. A festa financeira (que teve durante o seu trajecto numerosos acidentes) se converte em teto financeiro que bloqueia o crescimento.
As turbulências de 2007-2008 podem ser consideradas como o ponto de partida para o crepúsculo do sistema; a multiplicidade de crises que explodiram nesse período (financeira, produtiva, alimentaria, energética) convergiram com outras como a ambiental ou a do Complexo Industrial Militar do Império, atolado nas suas guerras asiáticas. Esse somatório de crises não resolvidas travam, impedem, a reprodução ampliada do sistema.
Vista a partir do longo prazo, a sucessão de crises de sobreprodução no capitalismo ocidental durante o século XIX não marcou um simples encadeamento de quedas e recuperações a níveis cada vez mais altos de desenvolvimento das forças produtivas; o que acontecia é que a cada depressão o sistema se recompunha mas acumulando no seu trajecto massas crescentes de parasitismo.
O cancro financeiro irrompeu de forma triunfal, dominante entre fins do século XIX e começos do século XX, obtendo o controlo absoluto do sistema sete ou oito décadas depois; mas o seu desenvolvimento havia começado muito tempo antes, financiando estruturas industriais e comerciais cada vez mais concentradas e os estados imperialistas de onde se expandiam as burocracias civis e militares. A hegemonia da ideologia do progresso e do discurso produtivista serviu para ocultar o fenómeno, instalou a ideia de que o capitalismo, ao invés das civilizações anteriores, não acumulava parasitismo mas somente forças produtivas que, ao expandir-se, criavam problemas de inadaptação, superáveis no interior do sistema mundial, resolvidos através de processos de “destruição criadora”. O parasitismo capitalista em grande escala, quando se tornava evidente, era considerado como uma forma de “atraso” ou uma “degeneração” passageira na marcha ascendente da modernidade.
Essa maré ideológica influenciou também boa parte do pensamento anticapitalista (em última instância “progressista”) dos séculos XIX e XX, convencido de que a corrente imparável do desenvolvimento das forças produtivas terminaria por afrontar as relações capitalistas de produção, saltando por cima delas, esmagando-as com uma avalanche revolucionária de operários industriais dos países mais “avançados” aos quais se seguiriam os dos chamados “países atrasados”. A ilusão do progresso indefinido ocultou a perspectiva da decadência e dessa maneira deixou a meio caminho o pensamento crítico, lhe retirou radicalidade, com consequências culturais negativas para os movimentos de emancipação dos oprimidos do centro e da periferia.
Por seu lado, o militarismo moderno tem as suas raízes mais recentes no século XIX, desde as guerras napoleônicas, chegando à guerra franco-prussiana, até irromper, na primeira guerra mundial, como “Complexo Militar Industrial” (embora seja possível encontrar antecedentes importantes no Ocidente nas primeiras indústrias de armamento de tipo moderno, aproximadamente a partir do século XVI). No seu começo, ele foi apercebido como um instrumento privilegiado das estratégias imperialistas e como reactivador económico do capitalismo, mas este é apenas um aspecto do fenómeno que ocultava ou subestimava a sua profunda natureza parasitária, o fato de que por trás do monstro militar ao serviço da reprodução do sistema se ocultava um monstro muito mais poderoso a longo prazo: o do consumo improdutivo, causador de défices públicos que, no fim do seu percurso, não incentivam mais a expansão mas sim a estagnação ou a contracção da economia.
Actualmente, o Complexo Militar Industrial norte-americano (em torno do qual se reproduzem os seus sócios da NATO) gasta em termos reais mais de um trilhão de dólares, contribui de maneira crescente para o déficit fiscal e, por conseguinte, para o endividamento do Império (e a prosperidade dos negócios financeiros beneficiários do dito défice). A sua eficácia militar é declinante mas a sua burocracia é cada vez maior, a corrupção penetrou em todas as suas actividades e já não é o grande gerador de empregos, como em outras épocas, pois o desenvolvimento da tecnologia industrial-militar reduziu significativamente esta função (a época do keynesianismo militar como eficaz estratégia anti-crise pertence ao passado). Ao mesmo tempo, é possível constatar que nos Estados Unidos se produziu uma integração de negócios entre a esfera industrial-militar, as redes financeiras, as grande empresas energéticas, os grupos mafiosos, as “empresas” de segurança e outras actividades muito dinâmicas, conformando assim o espaço dominante do sistema de poder imperial.
Nem a crise energética em torno da chegada do “Peak Oil” (a faixa de máxima produção petrolífera mundial, a partir da qual se desenvolve o seu declínio) deveria ser restringida à história das últimas décadas; é necessário entendê-la como a fase declinante do amplo ciclo da exploração moderna dos recursos naturais não renováveis, desde o começo do capitalismo industrial que pôde realizar o seu arranque e posterior expansão graças a esses combustíveis energéticos abundantes, baratos e facilmente transportáveis, desenvolvendo em primeiro lugar o ciclo do carvão, sob hegemonia inglesa no século XIX, e logo o ciclo do petróleo, sob hegemonia norte-americana no século XX. Este ciclo energético condicionou todo o desenvolvimento tecnológico do sistema e foi a vanguarda da dinâmica depredadora do capitalismo estendida ao conjunto dos recursos naturais e do ecossistema em geral.
Em síntese, o desenvolvimento da civilização burguesa durante os dois últimos séculos (com raízes num passado ocidental muito mais antigo) terminou por engendrar um processo irreversível de decadência; a depredação ambiental e a expansão parasitária, estreitamente interrelacionadas, estão na base do fenômeno. A dinâmica do desenvolvimento econômico do capitalismo, marcada por uma sucessão de crises de sobreprodução, constitui o motor do processo depredador-parasitário que conduz inevitavelmente a uma crise prolongada de subprodução (o capitalismo obrigado a crescer e a depredar indefinidamente para não perecer, termina por destruir a sua base material). Existe uma interrelação dialética perversa entre a expansão da massa global de lucros, sua velocidade crescente, a multiplicação das estruturas burocráticas civis e militares de controlo social, a concentração mundial de rendimentos, a subida da maré parasitária e a depredação do ecossistema.
Isso significa que a superação necessária do capitalismo não aparece como o passo indispensável para prosseguir “a marcha do progresso”, mas, em primeiro lugar, como tentativa de sobrevivência humana e do seu contexto ambiental.
A decadência é a última etapa de um amplo super ciclo histórico, sua fase declinante, seu envelhecimento irreversível (sua senilidade). Extremando os reducionismos, tão praticados pelas “ciências sociais”, poderíamos falar de “ciclos” de distinta duração: energético, alimentar, militar, financeiro, produtivo, estatal, etc., e assim descrever em cada caso percursos que se iniciam no Ocidente, entre fins do século XVIII e começos do século XIX, com raízes anteriores e envolvendo espaços geográficos crescentes até assumir finalmente uma dimensão planetária, para, em seguida, cada um deles entrar em declínio. A coincidência histórica de todos esses declínios e a fácil detecção de densas interrelações entre todos esses ciclos nos sugerem a existência de um único super ciclo que os inclui a todos. Trata-se do ciclo da civilização burguesa que se expressa através de uma multiplicidade de “aspectos” (produtivo, moral, político, militar, ambiental, etc.).
Declínio do Império, relançamento militarista, ilusões periféricas e insurreição global
Toda a história do capitalismo gira, desde fins do século XVIII, em torno do domínio, primeiro inglês e em seguida estadunidense. Capitalismo mundial, imperialismo e predomínio anglo-norteamericano constituem um só fenômeno (agora decadente).
A articulação sistêmica do capitalismo aparece historicamente indissociável do articulador imperial, mas num futuro previsível não aparece nenhum novo imperialismo global ascendente; em consequência, o planeta burguês vai perdendo uma peça decisiva do seu processo de reprodução. A União Europeia e o Japão são tão decadentes como os Estados Unidos. A China baseou a sua espectacular expansão numa grande ofensiva exportadora para os mercados, agora em declínio, dessas três potências centrais.
O capitalismo vai ficando à deriva a menos que prognostiquemos o surgimento próximo de um tipo de mão invisível universal (e burguesa) capaz de impor a ordem (monetária, comercial, político-militar,etc.). Neste caso estaríamos extrapolando ao nível da humanidade futura a referência à mão invisível (realmente inexistente) do mercado capitalista afirmada pela teoria económica liberal.
O declínio da maior civilização jamais conhecida na história humana apresenta vários cenários para o futuro: alternativas de auto-destruição e de regeneração, de genocídio e de solidariedade, de desastre ecológico e de reconciliação do homem com seu meio ambiente. Estamos retomando um velho debate sobre alternativas interrompido pela euforia neoliberal; a crise rompe o bloqueio e nos permite pensar o futuro.
Voltemos à reflexão inicial deste texto: o início do século XXI assinala um paradoxo crucial: o capitalismo assumiu claramente uma dimensão global, mas iniciou igualmente o seu declínio.
Por outro lado, cem anos de revoluções e contra revoluções periféricas produziram grandes mudanças culturais: agora na periferia (completamente modernizada, isto é, completamente subdesenvolvida) existe um enorme potencial de autonomia nas classes baixas. Ali se apresenta o que de maneira talvez demasiado simplista poderíamos definir como património histórico democrático forjado ao longo do século XX. Os povos periféricos submergidos construíram sindicatos, organizações camponesas, participaram em votações de todo o tipo, fizeram revoluções (muitas delas com bandeiras socialistas), reformas democratizantes; na maior parte das vezes fracassaram. Tudo isto forma parte da sua memória, não desapareceu; pelo contrário, é experiência acumulada, processada em geral de maneira subterrânea, invisível para os observadores superficiais. Isto foi reforçado pela própria modernização que, por exemplo, lhes fornece instrumentos comunicacionais que lhes permite interactuar, intercambiar informações, socializar reflexões. Finalmente, a decadência geral do sistema, o possível começo do fim da sua hegemonia cultural, abre um gigantesco espaço para a criatividade dos oprimidos.
A guerra euro-asiática engendrou um imenso pântano geopolítico do qual os ocidentais não sabem como sair, consolidou e estendeu espaços de rebelião e autonomia cuja contenção é cada dia mais difícil, situação perante a qual o Império redobra as suas ameaças e agressões. A Coreia do Norte não pôde ser dobrada, nem tão pouco o Irão, a resistência palestina segue de pé e Israel, pela primeira vez na sua história, sofreu uma derrota militar no sul do Líbano; a guerra do Iraque não pôde ser ganha pelos Estados Unidos o que os coloca ali numa situação na qual todos os caminhos conduzem à perda do poder nesse país.
No outro extremo da periferia, América Latina, o despertar popular transcende os governos progressistas e deteriora estrategicamente as poucas oligarquias direitistas que ainda controlam o poder político. O projeto estadunidense de restauração de “governos amigos” tropeça num escolho fundamental: a profunda degradação das elites aliadas, sua incapacidade para governar em vários dos países candidatos à viragem para a direita, sendo que o Império não pode (não está em condições) de deter ou desacelerar a sua ofensiva, à espera de melhores contextos políticos. O ritmo da sua crise sobredetermina a sua estratégia regional; em última instância, isto não é completamente diferente da situação na Ásia onde a dinâmica imperial combina a sofisticação e a variedade de técnicas e estruturas operativas disponíveis com um comportamento absolutamente rude.
Se observarmos o conjunto da periferia atual a partir do longo prazo histórico, vemos um poder imperial desorientado enfrentando uma onda gigantesca e plural de povos submergidos desde o Afeganistão até a Bolívia, desde a Colômbia até as Filipinas, expressão da crise da modernidade subdesenvolvida. É o começo de um despertar popular muito superior ao do século XX.
Em meio a estas tensões aparece um leque colorido de ilusões periféricas fundadas na possibilidade de gerar uma desconexão encabeçada pelas nações chamadas emergentes; o que é no fundo uma fantasia que não toma em consideração o facto decisivo de que todas as “emergências” (as da Rússia, China, Brasil, Índia, etc) se apoiam na sua inserção nos mercados dos países ricos. Se esses estados que vêm praticando neokeynesianismos mais ou menos audazes, compensando o esfriamento global, quisessem aprofundar esses impulsos de mercado interno e/ou interperiféricos, se encontariam, cedo ou tarde, com as barreiras sociais dos seus próprios sistemas económicos, ou, para descrevê-lo de outra maneira, com os seus próprios capitalismos realmente existentes, em especial, os interesses das suas burguesias financeirizadas e transnacionalizadas.
À medida que a crise se aprofunde, que as debilidades do capitalismo periférico se tornem mais visíveis, que as bases sociais internas das burguesias imperialistas se deteriorem e que o desespero imperial se agudize, a vaga popular global já em marcha não terá outro caminho senão o da sua radicalização, sua transformação em insurreição revolucionária. Complexa, possuindo distintas velocidades e com construções (contra)culturais diversas, avançando a partir de distintas identidades, até à superação do inferno. É somente a partir dessa perspectiva que é possível pensar o postcapitalismo, o renascimento (a reconfiguração) da utopia comunista, já não como resultado da “ciência” social elitista, a partir da superação pelo interior da civilização burguesa através de um tipo de “abolição suave” mas sim da sua negação integral em tanto que expansão ilimitada da pluralidade, recuperando as velhas culturas igualitárias, solidárias, elevando-as até um colectivismo renovado.
Os movimentos insurgentes da periferia atual costumam ser apresentados pelos meios globais de comunicação como causa perdidas, como resistências primitivas à modernização ou como o resultado da atividade de misteriosos grupos de terroristas. A resistência no Afeganistão e na Palestina ou a insurreição colombiana aparecem nessa propaganda protagonizando guerras que nunca poderiam ganhar frente a aparelhos super poderosos; não faltam os pacificadores profissionais que aconselham os combatentes a pôr de lado a sua intransigência e negociar alguma forma de rendição vantajosa “antes que seja tarde demais”. O século XX deveria ser uma boa escola para aqueles que se impressionam com o gigantismo e a eficácia dos aparelhos militares (e dos aparelhos burocráticos em geral) porque este século viu o nascimento vitorioso dos grandes aparelhos modernos, como é hoje o Complexo Militar Industrial dos Estados Unidos, e também foi testemunha da sua ruína, da sua derrota diante de povos em armas, diante da criatividade e da insubmissão dos de baixo.
Nos anos 1990, os neoliberais nos explicavam que a globalização constituía um fenômeno irreversível, que o capitalismo havia adquirido uma dimensão planetária que arrasava com todos os obstáculos nacionais ou locais. Não se davam conta de que essa irreversibilidade, transformada pouco depois em decadência global do sistema, abria as portas a um sujeito inesperado: a insurreição global do século XXI; o tempo (a marcha da crise) joga a seu favor. O império e seus aliados diretos e indiretos quiseram fazê-la abortar, começando por tentar apagar a sua dimensão universal, tratando mediaticamente de transformá-la (fragmentá-la) em uma modesta coleção de resíduos locais sem futuro, mas essas supostas resistências residuais possuem uma vitalidade surpreendente, se reproduzem, sobrevivem a todas as tentativas de extermínio e quando visionamos o percurso futuro do declínio civilizacional em curso, a profunda degradação do mundo burguês, o seu caminhar para a barbárie antecipando crimes ainda maiores, então a globalização da insurreição popular aparece como o caminho mais seguro para a emancipação das maiorias submergidas, o que é também a sua única possibilidade de sobrevivência digna.
NOTAS:
(1) Bud Comrad, 'Beyond the Point of No Return', GooldSeek, 12 de Maio de 2010.
(2) 'La explosion de la deuda pública. Previsiones de la OCDE para 2010', AFP,25-11-2009.
(3) Fonte: FMI, OCDE, McKinsey Global Institute.
[*] Doutorado em economia e professor catedrático das universidades de Buenos Aires e Córdoba, na Argentina, e de Havana, em Cuba. É autor de 'Capitalismo senil: a grande crise da economia global', publicado no Brasil pela editora Record (2001). Dirige o Instituto de Pesquisa Científica da Universidade da Bacia do Prata e publica regularmente em Le Monde Diplomatique (em castelhano). Este texto é uma comunicação ao Primeiro Encontro Internacional sobre "O direito dos povos à revolta", Caracas 7-8-9 Outubro de 2010.
sexta-feira, 22 de abril de 2011
Quem diria, o "Poste" é uma das 100 pessoas mais influentes do mundo, segundo a Revista Time
Revista "Time" inclui Dilma entre os 100 mais influentes do mundo
DE SÃO PAULO - A presidente Dilma Rousseff foi escolhida uma das 100 pessoas mais influentes do ano pela revista americana "Time".
O perfil de Dilma foi escrito pela ex-presidente do Chile Michelle Bachelet.
"A nova presidente do Brasil é uma lutadora corajosa que se levantou contra a ditadura militar e que dedicou sua vida a construir uma alternativa democrática para o desenvolvimento, a igualdade social e os direitos das mulheres", diz Bachelet no texto publicado ontem no site da revista.
A chilena afirma que não é fácil ser a primeira mulher a governar seu país. "É ainda mais difícil governar um país tão grande e globalmente relevante como o Brasil."
Para Bachelet, que deixou a Presidência no ano passado, o Brasil vive um momento único da sua história, que exige um "líder de sólida experiência e firmes ideais".
"Dilma oferece precisamente essa combinação virtuosa de sabedoria e convicção que seu país precisa", completa.
A oitava edição da lista inclui personalidades como o presidente da França, Nicolas Sarkozy, o atacante argentino Lionel Messi, o cantor Justin Bieber, o príncipe William e sua noiva, Kate Middleton.
No ano passado, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi listado como um dos mais influentes. Ele também tinha aparecido no ranking de 2004.
DE SÃO PAULO - A presidente Dilma Rousseff foi escolhida uma das 100 pessoas mais influentes do ano pela revista americana "Time".
O perfil de Dilma foi escrito pela ex-presidente do Chile Michelle Bachelet.
"A nova presidente do Brasil é uma lutadora corajosa que se levantou contra a ditadura militar e que dedicou sua vida a construir uma alternativa democrática para o desenvolvimento, a igualdade social e os direitos das mulheres", diz Bachelet no texto publicado ontem no site da revista.
A chilena afirma que não é fácil ser a primeira mulher a governar seu país. "É ainda mais difícil governar um país tão grande e globalmente relevante como o Brasil."
Para Bachelet, que deixou a Presidência no ano passado, o Brasil vive um momento único da sua história, que exige um "líder de sólida experiência e firmes ideais".
"Dilma oferece precisamente essa combinação virtuosa de sabedoria e convicção que seu país precisa", completa.
A oitava edição da lista inclui personalidades como o presidente da França, Nicolas Sarkozy, o atacante argentino Lionel Messi, o cantor Justin Bieber, o príncipe William e sua noiva, Kate Middleton.
No ano passado, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi listado como um dos mais influentes. Ele também tinha aparecido no ranking de 2004.
FHC e sua brilhante tese: ele só precisa dizer como fazer.
PT supera PSDB em briga pela nova classe média
Fatia é a que mais declara preferir os petistas; tucanos vão melhor na elite
Eleitor que ascendeu socialmente durante os oito anos do governo Lula é o mais fiel ao PT, diz pesquisa Datafolha
BERNARDO MELLO FRANCO
DE SÃO PAULO
O PT largou na frente do PSDB na disputa pelos votos da chamada nova classe média, faixa que reúne as famílias com renda mensal entre três e dez salários mínimos.
Dados da última pesquisa Datafolha mostram que os eleitores deste segmento social, também conhecido como classe C, são os que mais dizem preferir o PT entre todos os partidos políticos.
O PSDB tem o melhor desempenho entre os brasileiros mais ricos, com renda familiar acima de dez salários.
A nova classe média virou sonho de consumo das duas legendas, que se revezam no poder desde 1995.
Nas últimas semanas, os ex-presidentes Lula (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB) a descreveram como o principal alvo a ser perseguido por seus partidos.
Proporcionalmente, os eleitores que formam a base da classe C são os que mais dizem preferir o PT.
A sigla é citada como a mais admirada por 32% dos entrevistados com renda de três a cinco salários mínimos (entre R$ 1.636 e R$ 2.725).
GRATIDÃO
Para o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, o resultado reflete a "gratidão" de brasileiros recém-saídos da pobreza, que ascenderam socialmente nos anos Lula.
"São eleitores que acabaram de ganhar acesso aos bens de consumo e creditam sua ascensão social nos últimos anos a Lula e ao PT."
Os petistas alcançam seu segundo melhor resultado (29%) entre os eleitores com renda familiar de cinco a dez salários (R$ 2.726 a R$ 5.450).
Na fatia mais pobre, com orçamento até dois salários (R$ 1.090), a sigla tem 23%. Esta é a faixa mais alheia ao jogo partidário: 58% não têm uma legenda favorita.
O menor índice do PT é justamente entre os mais ricos, com rendimento acima de dez salários (R$ 5.450).
Nesta faixa, que compõe as chamadas classes A e B, o partido é citado como o mais admirado por apenas 16%. Isso inclui a elite econômica e a classe média tradicional.
O PSDB alcança seu melhor índice (10%) entre os eleitores da classe B, com renda entre dez e vinte salários (R$ 5.451 a R$ 10.900).
O pior resultado dos tucanos aparece entre os mais pobres. O partido é citado como o favorito por apenas 4% dos brasileiros das classes D e E.
Na classe C, as citações oscilam entre 6% e 8%, conforme a faixa salarial.
Em artigo recente, o ex-presidente FHC disse que o PSDB "falará sozinho" se tentar disputar o "povão" com o PT e deve se concentrar na nova classe média.
"É um desafio grande", diz Paulino. "O PSDB terá que encontrar um discurso para esses eleitores, que querem garantias de que continuarão a melhorar de vida."
Pouco mais da maioria dos entrevistados (54%) diz não preferir nenhuma legenda. Estes eleitores tendem a escolher os candidatos sem considerar seus partidos.
O PT aparece à frente das outras siglas em todas as faixas de renda. No total, registra 26% de preferência, contra 6% do PMDB (sem candidato à Presidência desde 1994) e 5% do PSDB.
No debate da reforma política, o PT defende a adoção da lista fechada, em que o eleitor só pode votar na sigla em eleições parlamentares. Nas condições atuais, isso daria mais vagas a petistas.
extraído da Folha de São Paulo (21/04/2011)
Fatia é a que mais declara preferir os petistas; tucanos vão melhor na elite
Eleitor que ascendeu socialmente durante os oito anos do governo Lula é o mais fiel ao PT, diz pesquisa Datafolha
BERNARDO MELLO FRANCO
DE SÃO PAULO
O PT largou na frente do PSDB na disputa pelos votos da chamada nova classe média, faixa que reúne as famílias com renda mensal entre três e dez salários mínimos.
Dados da última pesquisa Datafolha mostram que os eleitores deste segmento social, também conhecido como classe C, são os que mais dizem preferir o PT entre todos os partidos políticos.
O PSDB tem o melhor desempenho entre os brasileiros mais ricos, com renda familiar acima de dez salários.
A nova classe média virou sonho de consumo das duas legendas, que se revezam no poder desde 1995.
Nas últimas semanas, os ex-presidentes Lula (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB) a descreveram como o principal alvo a ser perseguido por seus partidos.
Proporcionalmente, os eleitores que formam a base da classe C são os que mais dizem preferir o PT.
A sigla é citada como a mais admirada por 32% dos entrevistados com renda de três a cinco salários mínimos (entre R$ 1.636 e R$ 2.725).
GRATIDÃO
Para o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, o resultado reflete a "gratidão" de brasileiros recém-saídos da pobreza, que ascenderam socialmente nos anos Lula.
"São eleitores que acabaram de ganhar acesso aos bens de consumo e creditam sua ascensão social nos últimos anos a Lula e ao PT."
Os petistas alcançam seu segundo melhor resultado (29%) entre os eleitores com renda familiar de cinco a dez salários (R$ 2.726 a R$ 5.450).
Na fatia mais pobre, com orçamento até dois salários (R$ 1.090), a sigla tem 23%. Esta é a faixa mais alheia ao jogo partidário: 58% não têm uma legenda favorita.
O menor índice do PT é justamente entre os mais ricos, com rendimento acima de dez salários (R$ 5.450).
Nesta faixa, que compõe as chamadas classes A e B, o partido é citado como o mais admirado por apenas 16%. Isso inclui a elite econômica e a classe média tradicional.
O PSDB alcança seu melhor índice (10%) entre os eleitores da classe B, com renda entre dez e vinte salários (R$ 5.451 a R$ 10.900).
O pior resultado dos tucanos aparece entre os mais pobres. O partido é citado como o favorito por apenas 4% dos brasileiros das classes D e E.
Na classe C, as citações oscilam entre 6% e 8%, conforme a faixa salarial.
Em artigo recente, o ex-presidente FHC disse que o PSDB "falará sozinho" se tentar disputar o "povão" com o PT e deve se concentrar na nova classe média.
"É um desafio grande", diz Paulino. "O PSDB terá que encontrar um discurso para esses eleitores, que querem garantias de que continuarão a melhorar de vida."
Pouco mais da maioria dos entrevistados (54%) diz não preferir nenhuma legenda. Estes eleitores tendem a escolher os candidatos sem considerar seus partidos.
O PT aparece à frente das outras siglas em todas as faixas de renda. No total, registra 26% de preferência, contra 6% do PMDB (sem candidato à Presidência desde 1994) e 5% do PSDB.
No debate da reforma política, o PT defende a adoção da lista fechada, em que o eleitor só pode votar na sigla em eleições parlamentares. Nas condições atuais, isso daria mais vagas a petistas.
Assinar:
Postagens (Atom)