03.04.2017, Hiroyuki Hamada, Counterpunch
Traduzido por E.Silva
Já era esperado, mas levou certo tempo pra minha ficha cair quando fiquei sabendo que a propaganda da organização Capacetes Brancos (1), bancada pelos Estados Unidos, havia mesmo ganho o Oscar de melhor curta documentário. E isso, é claro, indica que não é apenas aceitável inverter fatos e chamar um grupo de pessoas com atividades criminosas documentadas de “heróis”, mas é aceitável também premiá-las com um reconhecimento humanístico, artístico ou cultural. E tudo isso só para favorecer uma guerra colonial contra um país que não quer mais seguir as linhas traçadas pelo Império (2) (3).
Quanto custa contar tão grande mentira? Qual o preço humano de tornar as pessoas cúmplices de um projeto de morte e de sofrimento. Que consequências pagamos ao apagar fatos e inverter a história quando nos vemos a nós mesmos como seres culturais? Mas todas essas questões são talvez banais quando comparadas às 500 000 mortes, deslocamento de metade da população e todas as destruições infligidas pelos ataques do Império contra a Síria até o momento.
Esta é uma imensa operação que envolve diversas camadas do establishment e da sociedade em geral. Como podem tantas pessoas dizer que não estão vendo os fatos e aceitar as mentiras e as enganações?
Os governos ocidentais mentem sobre as dinâmicas do poder em jogo na Síria enquanto apoiam terroristas ao seu serviço. A mídia palreia as narrativas oficiais, fabrica fatos e análises. Artistas contribuem criando histórias para ajudar as pessoas a visualizar as mentiras como parte da manufaturada “realidade”. Todos estes esforços são apoiados por interesses financeiros que tiram proveito dos esforços de guerra e da subsequente colonização neoliberal da Síria. E devemos notar que a Síria é apenas um exemplo entre nações como Líbia, Iraque, Afeganistão, Iémen, Nicarágua, Ucrânia e tantas outras (4).
Detesto criticar essas pessoas que finalmente estão levantando suas vozes contra o governo dos Estados Unidos depois de terem ficado em silêncio durante oito anos sob Obama – afinal de contas eu tampouco sabia o quão “eficiente” Obama ia ser ao serviço dos poderes corporativos. Eu também achei que ia ser legal ter um presidente negro pela primeira vez. Mas, milhares de assassinatos por drones, inclusive de civis inocentes, imensos resgates financeiros de bancos, cadeia para funcionários que denunciam os crimes do governo, sete guerras e vigilância global? Como pudemos fechar os olhos diante disso?
Mas, tudo bem, foi isso mesmo.
Mas agora eu tenho de expressar minha objeção quando, ao sugerir que devemos resistir ao conjunto do sistema como ele é, sou taxado de “Apoiador de Trump”, “amante de Putin” ou “apologista de Assad” por aqueles que gostariam de promover as agendas de seus partidos políticos, as quais não se encaixam muito bem no âmbito imperial.
Que desculpas têm essa gente para apoiar um partido estado corporativo guiado por agências de espionagem, Wall Street e pelo Complexo Militar-Industrial?
Com que autoridade querem determinar a forma certa de governo para o povo sírio? A questão se torna urgente quando o que eles apoiam para o povo sírio são grupos terroristas afiliados a Al-Qaeda e suas violentas teocracias, enquanto que a maioria do povo sírio apoia o governo secular do presidente Assad.
Como pode alguém ser tão sugestionável ao ponto de se tornar um apologista do criminoso Império? Como isso é possível? E eles dizem resistir a Trump e acabar com a discriminação de imigrantes, o racismo, à discriminação de gênero e por aí vai. Como? Acreditando no militarismo, no colonialismo, no corporativismo, no establishment? Os partidos corporativos têm financiado a máquina de guerra em massa com mil bases militares, dezessete agências de espionagem e usando mais da metade de nossos impostos para colonizar outras nações para dar lucro a grandes corporações que nos sugam até a última gota aqui mesmo nos EUA. E ataques contra imigrantes, racismo e discriminação de gênero são ferramentas, bem como o resultados, de tais explorações operadas por estes mesmos partidos. Então como isso é possível?
É tão evidente. Vemos o mesmo povo que deplora como são tratados os imigrantes nos Estados Unidos, apoiando a guerra colonial contra a Síria, as violentas políticas estrangeiras dos Estados Unidos contra as nações da América latina, a demonização da Rússia e por aí vai. Como é possível que essas pessoas não vejam como se ligam os pontinhos?
Pessoas vêm para os Estados Unidos porque a pilhagem das conquistas imperiais está amontoada aqui. Estas conquistas destruíram suas economias, comunidades e culturas. Se há gente que mereça gozar da prosperidade do Império, essa gente é, em primeiro lugar, o povo imigrante. Vamos dar-lhes as boas-vindas e deixá-los tomar conta da nação que é tanto deles quanto nossa. Se isso não estiver acontecendo, os Estados Unidos devem parar de interferir em outros países.
Estou farto das tentativas do establishment para nos convencer de que as coisas são complicadas demais para ser compreendidas, isso no objetivo de nos cegar, dos nos silenciar, de nos excluir, explorar e subjugar. De onde partiu mesmo a conversa? As premissas são falsas. Os fatos são mentiras. A História é uma mentira. As conclusões, as políticas, os motivos e os resultados também são mentiras.
Acho que temos apenas de criar um sistema funcional que seja efetivo para todos nós e, educadamente, de maneira cordata, com o devido processo, peça a estes criminosos de guerra, a estes aproveitadores da guerra e a estes políticos corruptos que fiquem em suas prisões. A única razão legítima para a existência de forças armadas é apoiar o povo em tal processo democrático.
Notes.
(4) http://www.counterpunch. org/2016/05/13/the-great-leap- backward-americas-illegal- wars-on-the-world/
Hiroyuki Hamada é um artista. Ele tem feito exibições por todos os Estados Unidos, sendo na Europa representado por Lori Bookstein Fine Art. Ele foi agraciado com várias residências, entre as quais Provincetown Fine Arts Work Center, o Edward F. Albee Foundation/William Flanagan Memorial Creative Person’s Center, o Skowhegan School of Painting and Sculpture, e o MacDowell Colony. Em 1998, Hamada foi recipiendário do prêmio Pollock Krasner Foundation, e em 2009 e ele recebeu o Arts Fellowship da New Yourk Foundation. Ele vive e trabalha em Nova Iorque.
Um comentário:
Deveria haver um movimento organizado, internacional, para boicotar todos os produtos produzidos nos EUA. No mínimo.
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