quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

O extremismo temerário da Arábia Saudita

10/1/2016, Mohammad Javad Zarif, ministro de Relações Exteriores do Irã, New York Times

Depois de assinado o acordo nuclear provisório em novembro de 2013, a Arábia Saudita passou a dedicar seus recursos a derrotar o acordo, movida pelo temor de que a iranofobia que tanto maquinara estivesse vindo abaixo. Hoje em Riad há alguns que não apenas continuam a impedir a normalização, mas estão decididos a arrastar para o confronto toda a região.




Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu





O mundo celebrará em breve a implementação de um acordo histórico, que resolve a crise desnecessária, mas perigosa, em torno do programa nuclear do Irã. Todas as partes esperavam, e continuam a crer firmemente nisso, que a resolução da questão nuclear permita que nos foquemos na luta contra o grave desafio do extremismo que castiga nossa região – e o mundo.

O presidente Rouhani tem dito repetidas vezes que a mais alta prioridade da política exterior do Irã é amizade com nossos vizinhos, paz e estabilidade na região e cooperação global, especialmente na luta contra o extremismo. 



Em setembro de 2013, um mês depois de assumir o governo, o presidente Rouhani apresentou a iniciativa intitulada World Against Violence and Extremism, WAVE [O mundo contra a violência e o extremismo]. A iniciativa foi aprovada por consenso pela Assembleia Geral da ONU, criando esperanças de que seria possível todos nos empenharmos numa campanha global, de visão ampla, contra o terrorismo.



Infelizmente, alguns países põem-se hoje como obstáculo na via para qualquer engajamento mundial construtivo.

Depois de assinado o acordo nuclear provisório em novembro de 2013, a Arábia Saudita passou a dedicar seus recursos a derrotar o acordo, movida pelo temor de que a iranofobia que tanto maquinara estivesse vindo abaixo. Hoje em Riad há alguns que não apenas continuam a impedir a normalização, mas estão decididos a arrastar para o confronto toda a região.

A Arábia Saudita parece ter medo de que, removida a cortina de fumaça que pairava sobre toda a questão nuclear, seja possível ver, afinal, a verdadeira ameaça: o patrocínio ativo que aquele reino provê ao extremismo violento. O barbarismo é claro. 

No cenário interno, os carrascos do estado degolam com espadas, como se viu recentemente, 47 pessoas num só dia, inclusive Xeique Nimr al-Nimr, autoridade religiosa respeitada, que devotou a vida a ensinar não violência e respeito aos direitos civis. No cenário externo, homens mascarados também degolam, mas com facas.

Não esqueçamos que os perpetradores de tantos atos de terror, dos ataques do 11 de setembro ao massacre em San Bernardino e outros vários episódios de extremismo que houve entre um e outro daqueles eventos, além de quase todos os membros de grupos terroristas como Frente al-Nusra e Al-Qaeda, são ou cidadãos sauditas ou objeto de lavagem cerebral por demagogos pagos e mantidos com petrodólares, que vivem de promover mensagens anti-islâmicas de ódio e sectarismos.

A estratégia dos sauditas, de fazer descarrilar o acordo nuclear e perpetuar – e até exacerbar – a tensão na região tem três componentes: pressionar o Ocidente; fazer guerra ao Iêmen e patrocinar o terrorismo, para promover instabilidade regional; e provocar diretamente o Irã. A campanha militar de Riad no Iêmen e o apoio que dá a extremistas são bem conhecidos. Provocações contra o Irã não chegam às manchetes internacionais graças, primeiramente, à nossa contenção prudente.

O governo iraniano no mais alto nível condenou inequivocamente o assalto contra a embaixada e consulado saudita em Teerã, dia 2 de janeiro, e garantiu total segurança aos diplomatas sauditas. Tomamos medidas imediatas para ajudar a restaurar a ordem no complexo diplomático saudita e declaramos nossa determinação de levar os perpetradores a julgamento. Também tomamos medidas disciplinares contra os que falharam na proteção à embaixada, e iniciamos investigação interna para impedir que se repitam agressões desse tipo.

Bem diferente disso, o governo saudita ou seus delegados e serviçais só fizeram, ao longo dos últimos três anos, atacar repetidas vezes as representações diplomáticas do Irã no Iêmen, no Líbano e no Paquistão –assassinando diplomatas iranianos e cidadãos locais. E houve também outras provocações. 

Peregrinos iranianos na Arábia Saudita são sistematicamente agredidos – numa das vezes, funcionários do aeroporto saudita molestaram dois meninos iranianos em Jeddah, o que provocou forte reação popular. 

Também se deve atribuir à negligência saudita o estouro de multidão em pânico ocorrido durante o hajj recente, que deixou 464 iranianos mortos. Além disso, as autoridades sauditas recusaram-se a responder, durante vários dias, aos pedidos das famílias e das autoridades do governo iraniano que queriam acesso para poder repatriar os corpos.

Isso, para nem falar da prática rotineira de discurso de ódio, não só contra o Irã mas contra todos os muçulmanos xiitas, que é só o que se houve de pregadores a serviço do governo saudita. 

A indignação ante a degola de Xeique Nimr veio imediatamente depois de mais um sermão de ódio contra xiitas por um pregador da Grande Mesquita em Meca, o mesmo que, ano passado, dissera que enquanto houver xiitas sobre a Terra, "o desacordo que nos separa dos xiitas não será removido, e tampouco terá fim nosso suicídio na luta contra eles".

Em todos esses episódios, o Irã, confiado na própria força, recusou-se a retaliar ou romper – sequer rebaixamos – relações diplomáticas com a Arábia Saudita. Até agora, respondemos com moderação. Mas é impossível sustentar prudência unilateral.

O Irã não tem qualquer desejo de escalar a tensão na região. Precisamos de unidade para enfrentar as ameaças que os extremistas trazem para nós. Desde os primeiros dias depois de eleito, o presidente e eu indicamos publicamente nossa prontidão para iniciar um diálogo, promover a estabilidade e combater o extremismo desestabilizador. Caiu em ouvidos surdos na Arábia Saudita.

Agora a liderança saudita tem de se decidir: podem continuar a apoiar extremistas e a promover o ódio sectário; ou pode optar por desempenhar papel construtivo na promoção da estabilidade regional. Esperemos que prevaleça a racionalidade. *****

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