Os dirigentes do MST, João Pedro Stedile e João Paulo Rodrigues deram coletiva de imprensa nesta tarde do dia 2 de fevereiro, na sede do sindicato dos jornalistas de São paulo. A coletiva teve por objetivo divulgar para opinião publica dois documentos. O primeiro foi a Carta de Caruaru, que é um balanço politico da situação do país e da reforma agraria realizado pela reunião nacional de 400 dirigentes da coordenação nacional, de todos os estados, terminada nesta sabado passado em Caruaru.
E o segundo é uma carta entregue em mãos à presidente Dilma, no dia 17 de dezembro passado, com copias aos ministros da área, cobrando do governo seus compromissos com a reforma agraria.
Os dirigentes responderam a perguntas dos jornalistas e a integra das perguntas respostas foi transmitido e gravado pela TV Drone de São Paulo.
Veja abaixo os documentos. De livre circulação.
MST: Estamos entrando num novo período histórico da luta de classes.
Confira a Carta de Caruaru, em que o MST apresenta o balanço crítico do atual momento político e as perspectivas para o próximo período.
2 de fevereiro de 2016 19h25
Da Página do MST
Na semana passada, mais de 400 dirigentes do MST de todo o Brasil se reuniram na cidade de Caruaru (PE), durante o encontro da coordenação nacional do MST.
No final da atividade, os Sem Terra escreveram a Carta de Caruaru, em que apresentam um balanço crítico do atual momento político e as perspectivas para o próximo período.
Confira:
Carta de Caruaru
1. A atual crise mundial do capitalismo, iniciada ainda em 2008, causa o aumento do desemprego, do crescimento da desigualdade social, a concentração da renda e riqueza além de intensificar o uso do aparato repressivo do Estado em todas as partes do mundo.
2. O grande capital se mostra incapaz de apontar saídas para essa crise do capitalismo. Acentua-se que será uma crise profunda, prolongada, que exigirá reformas estruturais. E suas consequências sociais são imprevisíveis.
3. No cenário nacional, à crise internacional do capitalismo soma-se o esgotamento do modelo neodesenvolvementista, baseado no crescimento econômico e na distribuição de renda com conciliação de classes, iniciado em 2003.
4. Frente à gravidade da crise, a classe dominante demonstra não ter unidade em torno de um novo projeto hegemônico para o país. Há setores da burguesia que persistem na defesa do modelo neodesenvolvimentista. E há outra parcela que almeja a retomada e o aprofundamento do modelo neoliberal.
5. A presidenta Dilma Rousseff, desde o início do seu 2º mandato, errou em implementar um programa econômico de medidas neoliberais, adotado do seu adversário político, derrotado nas urnas. Tal equívoco causou o agravamento da crise econômica e fragilizou o apoio popular que lhe assegurou a vitória nas últimas eleições presidenciais.
6. Mesmo assim, o governo seguiu cedendo ao grande capital, retirando direitos sociais e trabalhistas e dando continuidade ao ajuste econômico, que mostrou-se fracassado em 2015.
7. As anunciadas reformas trabalhistas e da previdência social – que penalizam a classe trabalhadora e, especialmente, as mulheres camponesas – são inaceitáveis; e, se concretizadas, provocarão uma onda de lutas populares em todo o país contra o governo.
8. Da mesma forma exigimos que o governo enfrente o modelo de agricultura do agronegócio. É uma agricultura financiada pela poupança social e subsidiada com recursos públicos, destinada a atender os interesses do mercado internacional. Esse modelo de agricultura provoca a concentração de renda e da propriedade da terra, aumenta a desigualdade social, produz alimentos com agrotóxicos, promove uma irracional destruição ambiental em nosso país e subordina toda cadeia produtiva agropecuária ao controle e interesses das empresas transnacionais e do capital financeiro.
9. Todo este contexto sinaliza um novo período histórico da luta de classes. Cabe à classe trabalhadora enfrentar o desafio de impulsionar as lutas populares nas ruas, construir a unidade da classe e alimentar o povo brasileiro com os ideais de uma sociedade avançada, socialmente justa e democrática.
10. Urge a classe trabalhadora construir coletivamente, através de todas as mediações, sindicatos, movimentos populares e partidos políticos progressistas, um novo projeto político para o país. Um projeto alicerçado na defesa e no aprofundamento da democracia popular, na distribuição da riqueza e na soberania nacional.
11. A Frente Brasil Popular (FBP), criada em setembro/2015, em Belo Horizonte/MG, logrou unidade de uma parcela da classe trabalhadora em torno de uma plataforma política mínima de um projeto político para o Brasil. Como integrante da FBP, faremos todos os esforços para a sua consolidação nos estados e municípios. Cabe-nos, ainda, a tarefa de ampliar a FBP com outros setores e organizações, além de aprofundar o diálogo com outras Frentes existentes.
12. No campo, diante da ineficiência e apatia do governo em adotar medidas favoráveis à Reforma Agrária, iremos intensificar as mobilizações populares, as ocupações de latifúndios improdutivos e das fazendas, como estabelece a Constituição Federal de 1988, que não cumprem a função social.
13. Lutaremos pela Reforma Agrária Popular, centrada na distribuição da terra às famílias camponesas e em um novo modelo de agricultura brasileira. Uma agricultura que priorize a produção de alimentos sadios, baseada na agroecologia e na cooperação agrícola, associada com a implantação de agroindústrias nas áreas da Reforma agrária.
14. A Reforma Agrária Popular é indissociável do direito da população do campo ter acesso à educação e ao conhecimento. Assim, lutaremos contra o fechamento das escolas do meio rural e exigiremos, para cada área de assentamento, a existência física de escolas que assegurem uma educação pública, de qualidade social e gratuita. Educação é um direito e não uma mercadoria!
15. Juntos com a Via Campesina e os demais movimentos populares do campo, lutaremos pela soberania alimentar de todos os povos, em defesa das sementes como um patrimônio da humanidade, e pelo alimento ser um direito do ser humano e não uma mercadoria que visa apenas os lucros das empresas transnacionais, às custas da miséria e da fome de milhões de seres humanos.
Enfim, assumimos o compromisso de dar continuidade e intensificar as lutas populares de 2015. Iremos, em 2016, voltar às ruas contra forças imperialistas, a direita partidária, o conservadorismo do Congresso Nacional, o oligopólio da mídia, os setores reacionários e golpistas incrustados no aparato estatal. Estes querem fazer o país retroceder nas conquistas democráticas já obtidas, nos direitos trabalhistas conquistados e no avanço das políticas econômicas que reduzem a desigualdade social.
Será um ano de muitas lutas e de superação de desafios na construção da unidade da classe trabalhadora, do reascenso das lutas populares, da solidariedade com todos os povos em lutas e na construção de um projeto político popular para o nosso país.
Caruaru/PE, 30 janeiro de 2016.
Coordenação Nacional do MST
Lutar, construir a Reforma Agrária Popular!
CARTA A PRESIDENTA DILMA ROUSSEFF
Excelentíssima Senhora
MD. Presidenta Dilma Rousseff,
República Federativa do Brasil
No dia 14 de dezembro de 2014, estivemos reunidos para tratar dos temas que envolvem a terra, a política agrária em geral de nosso país. Passado um ano, nossa avaliação é que pouco avançamos em relação a realização concreta dos diversos compromissos que seu governo assumiu, de mudanças para o campo. Por isso, vimos a sua presença apresentar as questões ainda pendentes, para que a senhora tenha conhecimento, e eventualmente nos colocamos a disposição para realizarmos uma reunião de trabalho apenas para tratar desses temas.
I - TERRA
1. Solução para as famílias acampada
Neste ano não foi possível dar celeridade a sua determinação política de priorizar assentamento das famílias acampadas, e foi nos dito que a razão seriao contingenciamento dos recursos. Num ano foram mobilizadas apenas 31 areas, que representa apenas uma por estado. Por outro lado há áreas que já foram destinadas a reforma agrária e as famílias assentadas há três anos, e por falta de pagamento do Incra, corremos o risco dos decretos caducarem e a justiça mandar devolver aos ex-propietarios. 2016 esperamos que os recursos sejam de fato aplicados para assentar todas as famílias que estão sobrevivendo embaixo da lona preta acampadas pelo Brasil.
2. Novos Recursos para Reforma Agrária
É urgente e necessário que se destine os recursos recolhidos por diversas taxas para o Incra, que estão depositados no Tesouro Nacional, porém vão para o superávit primário. Há na conta Incra 1 bilhão e 200 mil), que poderiam ser utilizados imediatamente para as enormes demandas do Incra, e da reforma agrária.
3. Plano de metas
É urgente que o governo acorde o plano de metas para a reforma agrária já discutida com os movimentos e apresentado pelo MDA.
4. Habitação Rural
Pedimos a contratação imediata dos projetos que estão na Caixa Econômica e Banco do Brasil que totalizam a construção de 12 mil casas acordadas em outubro de 2015; e ate agora nenhum contrato foi assinado. Lançamento imediato do "Programa Minha Casa, Minha Vida 3" para atender as 120 mil famílias quem vivem em barracos.
5. Pronera
O Pronera é o melhor programa do governo para garantir aos jovens do campo acesso ao ensino superior. Esse ano foram apenas 20 milhões. Nossa demanda de projetos em parcerias com asuniversidades poderiaatender a milhares de jovens. Por isso pedimos que o governo veja formas de alocar recursos no Pronera/Incra, no valor de 200 milhões de reais.
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II – POLÍTICA AGRÍCOLA
1. Conab
Programa de Aquisição de Alimentos: É urgente recompor o orçamento para o PAA e transferi-lo para o MDA. Antes havia um total de 1,2 bilhões de reais /ano, e este ano, não ultrapassa os 200 milhões atendendo menos de 30 mil famílias. Num potencial de mais de um milhão de famílias que poderiam fornecer alimentos.
Programa Milho no Balcão: Garantir recursos para ampliar a distribuição de milho na regiãosemi-árido e assim amenizar os problemas da seca entre a agricultura familiar.
Programa Doação Simultânea: precisamos ampliar esse programa para que milhões de pessoas pobres das periferias das cidades e que estão organizadas por suas associações e movimentos.
2. Assistência técnica e extensão rural
É preciso que o Governo assuma o pagamento dos contratos de trabalho já realizados pelos convênios da ATES. Há diversas entidades que já apresentaram notas há três meses e até o momento não foram pagos. A inadimplência do Governo com os contratos de ATES vai levar a falência diversas entidades que fizeram convênios com o Incra, gerando um clima de revolta e desconfiança.
Estruturação e funcionamento imediato da ANATER
3. Instituto Nacional de Pesquisas do Semi-árido - INSA
Por ser o único instrumento de pesquisa do semi-árido é necessário rever o posicionamento do Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação de encerrar as atividades do instituto, pelo contrário, é necessário fortalecê-lo e transferí-lo para o MDA a fim de estimular o desenvolvimento da região Nordeste.
4. Programa Nacionalde Redução de Agrotóxicos - PRONARA
Existe apoio formalizado de 8 ministros da República. A ministra da Agricultura, Kátia Abreu, se negou a assinar. É preciso que o Governo Federal promulgue e divulgue o mais breve possível.
5. Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – PLANAPO
É fundamental a imediata designação de orçamento próprio para viabilizar as propostas acordadas entre os ministérios concentrando os recursos no MDA.
6. Fundo Desenvolvimento Incra
É urgente que se constitua esse fundo com objetivos de financiar projetos comunitários de agroindústria nos assentamento rurais e com obras comunitárias, que ora o Incra não tem orçamento.O projetodo Fundo já foi apresentado na Secretária de Governo, e os movimentos do campo, apoiamos a iniciativa do Incra.
7. Perímetros irrigados
Desde 2009 os agricultores aguardam que essas terras sejam destinadas para Reforma Agrária, sendo que o processo fica estacionado dentro do Ministério da Integração. É necessário que o governo decrete as áreas para produção familiar;
Interferir para que o Ministério da Integração possa liberar os 50 milhões contingenciados para construção de sistemas de irrigação simplificados para áreas de agricultura camponesa;
III – PROJETOS DE LEI DE INTERESSE POPULAR QUE CIRCULAM NO CONGRESSO E QUE O GOVERNO PRECISA SE POSICIONAR
1. Terrorismo
Exigimos a imediata retirada da urgência da votação do Projeto de Lei que tipifica o terrorismo no nosso país.
2. Previdência Rural
N
ão aceitaremos calados que o ministro Levy retire os direitos dos trabalhadores rurais no sentido da alteração da idade mínima para aposentadoria e da retirada do valor de referência do salário mínimo. Não existe projeto, mas o Ministro tem feito reiteradas declarações na imprensa.38
3. Lei de terras para estrangeiros
O Executivo deve vetar qualquer tentativa de alteração desta lei. As nossas terras são nosso patrimônio e não devem ser mercantilizados ao interesse do mercado financeiro internacional.
4. Transgênicos
A tecnologia Terminator é proibida em todo o mundo, apenas no Brasil se coloca em debate uma medida que prejudica profundamente a biodiversidade do campo brasileiro, o que determina isso são os interesses dos indivíduos que compõem o Congresso Nacional. O Governo Federal não pode compactuar com esse absurdo.
5. PEC 215
O Poder Executivo deve articular a base aliada do governo no Congresso Nacional para barrar mais esse retrocesso nos Direitos Humanos da nossa história.
No mais desejamos que a Presidenta tenha muita força para passar por este período de profundo tensionamento político. O acirramento político coloca uma urgente e necessária tarefa para os lutadores do povo: resistir! Nessa trincheira somos aliados, não permitiremos nenhum retrocesso nas conquistas democráticas do povo brasileiro.
Um abraço da Direção Nacional do MST
Brasília, 17 de dezembro de 2015
ALEXANDRE CONCEIÇAO
JOAO PEDRO STEDILE
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