terça-feira, 13 de outubro de 2015

Paisagem estratégica do OM: mudanças drásticas (2/2)

11/10/2015, Dmitry MININ, Strategic Culture Foundation





Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu



Eventos na Síria e em torno da Síria: perspectiva geopolítica 

A atitude de atores internacionais e a correlação de forças em geral criam condições favoráveis para operação militar russa dentro do conflito sírio.


Nos EUA, o presidente Obama deixou claro que a situação na Síria não escalará para uma chamada guerra "indireta" entre EUA e Rússia. Confronto entre Rússia e União Europeia está fora de questão.

No caso da União Europeia, qualquer movimento para pressionar a Rússia só facilitará os avanços do Estado Islâmico e criará milhões de refugiados, não centenas de milhares como se veem hoje. Vários estados europeus estão em vésperas de eleições. Difícil acreditar que os governos se interessem por oferecer mais guerras aos seus eleitores. Há quem tente culpar a Rússia pela crise dos migrantes na Europa, embora, evidentemente, essa crise seja o preço a pagar pela nenhuma estratégia europeia coerente para o Oriente Médio e sua adesão à política corriqueira de sempre seguir o que os EUA ordenem.


Pequim mostrou claramente seu apoio às ações da Rússia. A China é principal consumidora do óleo e do gás do Oriente Médio. Fontes israelenses correram a noticiar que a Força Aérea e a Marinha chinesas estavam indo juntar-se à operação russa. Noticiou-se que a China enviará jatos de combate J-15 Flying Shark para a Síria e helicópteros Z-18F antissubmarinos, além de helicópteros leves Z-18J. Segundo aqueles relatos, o porta-aviões chinês Liaoning-CV-16 (ex-Varyag) estaria ancorado no porto sírio de Tartus, acompanhado de um míssil cruzador teleguiado. A força aérea chinesa está pronta a prover alguma proteção ao trânsito nas rotas aéreas nos espaços iraniano e iraquiano. Até agora, essa informação não foi confirmada.

Vale mencionar que os veículos de mídia sediados em Hong Kong também noticiaram os mesmos planos, citando suas próprias fontes militares em Pequim. Que há algo no ar, há.

A posição de Telavive é criticamente importante para o sucesso da operação russa. Israel é o único estado regional com potencial militar para complicar as coisas. E está bem próximo do campo de combate na Síria.

Até recentemente, Israel adotara posição ambivalente. Nem apoiava nem fazia oposição a Assad. Estrategistas israelenses calculavam que o melhor resultado para Israel seria uma Síria fragmentada. Para eles, o Estado Islâmico seria movimento de guerrilha que não implicava qualquer ameaça às Forças de Defesa de Israel (Tsahal, o exército de Israel). Parece que Moscou usou com sucesso seus contatos com Telavive, inclusive no mais alto nível, para convencer os israelenses que o Estado Islâmico, sim, usa tecnologia de ponta e é capaz de expandir seu controle para além das fronteiras de um único Estado.

O primeiro-ministro de Israel Benjamin Netanyahu declarou essa posição sem meias palavras: "Não queremos voltar aos dias quando, vocês sabem, Rússia e Israel estavam em campos opostos. Creio que já alteramos esse relacionamento. E isso, no geral, é bom." Recusou-se a comentar potenciais consequências da operação russa na Síria. Segundo ele, não sabe se degenerará em escalada nas tensões. Só o tempo dirá.

Importante é notar que o vice-comandante do Exército de Israel Maj.-Gen. Yair Golan reuniu-se com seu contraparte russo, Cor.-Gen. Nikolai Bogdanovski, no quartel-general em Telavive dia 6 de outubro, para iniciarem conversações sobre segurança regional e a presença militar da Rússia na Síria.

A Turquia está preocupada com o novo desdobramento na Síria. Já condenou mostrou e teve reação excessiva e destemperada quando uma aeronave russa entrou acidentalmente em espaço aéreo turco, por alguns minutos. Há muitas razões pelas quais Erdogan não possa fazer muito mais, ainda que queira. Haverá eleições parlamentares dia 1º de novembro, um duro teste para o seu Partido Justiça e Desenvolvimento. Nas eleições passadas, seu partido perdeu a maioria parlamentar e não conseguiu formar governo de coalizão. Dessa vez, as pesquisas não preveem grande sucesso para o partido de Erdogan. Nessas circunstâncias, seria suicídio envolver-se em nova aventura na Síria. Os eleitores turcos percebem perfeitamente o peso do problema dos refugiados. Não há dúvidas de que absolutamente não desejam ver aumentar o fluxo de pessoas em busca de asilo. E projetos econômicos de grande escala e o comércio com a Rússia são importantes para a economia turca.

Os EUA estão frustrados com as forças que apoiaram até aqui e a Turquia está muito preocupada com a intenção de Washington de reorientar seus esforços e passar a apoiar os curdos sírios. O Partido da Unidade Democrática Curda, principal força política, é afiliado do Partido (radical) dos Trabalhadores do Curdistão. Do ponto de vista da Turquia, um sucesso eleitoral do Partido da Unidade Democrática Curda é muito pior do que a possibilidade de Bashar Assad permanecer na chefia do governo. O primeiro-ministro turco Ahmet Dovutoglu afirmou que "Mantemos abertos todos os canais de comunicação com a Rússia. Não me parece que os russos tomem qualquer medida que possa nos preocupar". Admitiu que a Rússia avisou a Turquia sobre o início da operação militar na Síria. O primeiro-ministro não quis dar detalhes.

A Jordânia não se manifestou sobre planos para obstruir a Rússia. Com a Turquia, a Jordânia também muito fez para agravar a crise síria. A Jordânia hospeda o quartel-general operacional da coalizão dos EUA contra o Estado Islâmico. A oposição que opera no sul da Síria recebe reforços da Jordânia. Mas recentemente, suas atividades tornaram-se significativamente menos intensas. Imediatamente depois dos primeiros ataques das Forças Aeroespaciais Russas, 700 militantes no sul entregaram-se ao governo, mais de 3 mil deixaram os combates e cruzaram de volta a fronteira jordaniana. A Jordânia pode vir a ser a próxima vítima do Estado Islâmico. E está interessada em todos os tipos de cooperação para dizimar o grupo.

Em Beirute, a maioria da população festejou as notícias sobre o início da operação militar russa, com não menos entusiasmo do que se viu em Damasco. O Líbano não conseguiu eliminar de seu território as atividades de grupos armados. Com a ajuda dos russos, o Líbano deseja rearmar-se e, afinal, resolver essa questão. Assim, se se examina o problema com perspectiva mais ampla, vê-se que não só o Hezbollah, mas também o exército libanês regular pode vir a envolver-se diretamente nas ações na Síria.

Falando ao Grupo de Apoio ao Líbano na Assembleia Geral da ONU em New York, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, observou que a Rússia "recentemente assinou acordos complementares para fornecimento de equipamento especializado ao Líbano.”

A coalizão de Rússia-Síria-Irã-Iraque começa a tomar medidas práticas. Por exemplo, dia 7 de outubro, a Rússia disparou mísseis cruzadores, de navios localizados no Mar Cáspio, contra posições do Estado Islâmico. Os mísseis sobrevoaram territórios do Irã e do Iraque, como uma manifestação 'pública' de que todos os parceiros da coalização cultivam alto nível de confiança mútua.

É muito improvável que alguma tentativa para separar o Iraque, da coalizão antiterroristas, venha a produzir resultados, por mais que o país ainda dependa muito dos EUA. O mais provável é que amplie a distância que separa Bagdá e Washington. O Iraque sente-se frustrado com tudo que os EUA fizeram em anos recentes, inclusive a (nenhuma) luta contra o Estado Islâmico. O primeiro-ministro do Iraque Haidar Al-Abadi reagiu, recentemente, contra críticas ao acordo para intercâmbio de informações de inteligência assinado entre Iraque, Irã, Síria e Rússia dia 28 de setembro. Disse que, para ele, o Estado Islâmico não poderia ser derrotado sem esse acordo.


A Arábia Saudita é o único ator regional que permanece firme no desígnio de opor-se a atividades dos russos na Síria. Nas atuais circunstâncias, seus recursos são limitados. A principal arma dos sauditas é o petróleo, que já usaram em diferentes situações para servir a interesses de outros países. Essa arma, agora, perdeu efetividade. O exército saudita está atolado no sul do país combatendo, até agora sem grande sucesso, contra insurgentes iemenitas fracamente armados. Nenhuma cooperação declarada é possível entre o Reino Saudita e o Estado Islâmico.


Para Al Baghdadi, que se diz descendente do Profeta Maomé, os reis sauditas não passam de usurpadores sem estirpe. O seu mais caro sonho é ser o libertador de Mecca e Medina. Já quis até destruir a Pedra Negra, no canto oriental da Kaaba, antiga construção de pedra localizada no centro da Grande Mesquita em Mecca. Acredita que venerar um monumento é superstição pagã.

Há quem diga que, apesar da retórica hostil dos sauditas, a emergência da Rússia no Oriente Médio serve bem, em certa medida, aos interesses da Arábia Saudita. Reduz a dependência da Síria, em relação ao Irã xiita, detalhe que assusta muito mais Riad, que a presença militar dos russos.

Qualquer sugestão de que o padrão da intervenção russa no Afeganistão possa repetir-se na Síria brota sempre de comparação superficial. É ideia sem nenhum fundamento. Nenhum dos principais atores profundamente envolvidos nas atividades para obstruir a operação soviética naquele caso têm hoje qualquer interesse em envolver-se seriamente no atual conflito sírio. Alguns deles, China e Irã em particular, aliam-se hoje à Rússia. A operação da recém criada coalizão bloqueará todas as vias pelas quais chegam suprimentos ao Estado Islâmico. Resultado disso, as gangues que constituem o grupo não terão como manter-se por muito tempo.

Como a experiência comprova, à vezes a janela de oportunidade só abre por tempo muito breve. A arte do pensamento estratégico pressupõe a capacidade para ver quando a história está oferecendo uma oportunidade, e colhê-la rapidamente.

Na Síria, Moscou trabalhou com cálculos absolutamente precisos, para estimar o momento de agir. Há quem preveja retumbante fracasso. Analistas mais perspicazes no ocidente pensam de outro modo. E se os russos estiverem corretos? E o que acontecerá se o mundo inteiro se aperceber de como a Rússia e sua coalizão conseguem eliminar a ameaça terrorista que pesa hoje contra a Síria e contra todo o Oriente Médio? OK. Nesse caso, o ocidente passará à posição de devedor, depois de a Rússia cumprir com sucesso missão na qual o ocidente fracassou espetacularmente. *****

Um comentário:

Unknown disse...

Dsclpem, coment. fora do texto: http://m.sputniknews.com/latam/20151014/1028535274/brazil-police-investigation-candy-scandal.html. /o\ #shame