domingo, 11 de outubro de 2015

Últimos estertores da estratégia dos EUA no Oriente Médio

(Ela vai-se fanando, como os autores, Jimmy Carter e Zbigniew Brzezinski). Vladimir Putin, Bashar Al-Assad chegam para dançar sobre a tumba deles
Enterrada a doutrina do "um helicóptero a mais":

10/10/2015, John Hellmer, Dances with bears




Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu



"Queria ter mandado um helicóptero a mais para buscar os reféns" – disse o ex-presidente dos EUA Jimmy Carter numa de suas aparições de despedida recentemente, em Atlanta. – "Teríamos resgatado todos eles, e eu teria sido reeleito."


Comparado aos seus predecessores e sucessores, Carter era intelectualmente superior. Não padecia de vocação irresistível para a corrupção, como Bill Clinton, nem da incontrolável compulsão para mentir, de Barack Obama. Mas diferente deles todos, Carter sofria de complexo de inferioridade. Começou com o mentor de sua carreira, o almirante judeu polonês Hyman Rickover, e aprofundou-se com seu conselheiro de segurança nacional o católico polonês Zbigniew Brzezinski. A combinação desses dois levou à destruição das posições dos EUA no Afeganistão, Irã, Iraque, Líbia, Egito, Iêmen e, hoje, na Síria.

O outro lado do complexo de Carter é um pensamento delirante desejante de Carter e de Brzezinski. Os erros de julgamento de ambos, dizem eles em voz alta, não teriam sido a causa daquelas derrotas. De fato, nem foram mesmo derrotas, mas estratégias vitoriosas às quais só faltou um aumento de força múltipla e que custaram pouco sangue aos EUA, itens que se poderiam facilmente acrescentar. Mais uma metralhadora no céu, e o triunfo deles teria sido reconhecido por todos como o triunfo que teria sido. Significa dizer que, no pensamento senil dos dois, foi.


Brzezinski está dizendo a mesma coisa. Em coluna assinada para o Financial Times, publicada na 2ª-feira, Brzezinski diz que "as presença naval e aérea da Rússia na Síria são vulneráveis, geograficamente isoladas das bases originais. Podem ser 'desarmadas', se insistirem em provocar os EUA." Quando Brzezinski diz que desarmará a força expedicionária russa na Síria, está falando de aumentar a força múltipla no lado dos EUA até ser tão enorme, que ele supõe que poderia destruir os russos ou forçá-los a escafeder-se. Trata-se da 6ª Frota dos EUA, acima e abaixo da superfície do Mediterrâneo; plus a Força Aérea dos EUA e unidades da OTAN às dúzias distribuídas na Itália, Grécia, Turquia e Golfo Persa. Para proteger os bunkers de comando-e-controle dos quais comandam a guerra síria, e as linhas de reabastecimento pelas quais fazem circular homens, dinheiro e munição, terão também de retomar, dos russos, o controle aéreo que hoje é deles. Com a demonstração essa semana, dos mísseis cruzadores disparados de território russo, o que Brzezinski prega não é coisa fácil de fazer. 

É disputa que, para superar o recorde de riscos de Carter-Brzezinski, o lado dos EUA teria de contar com força superior à força russa na proporção de 5 para um, melhor, 6 para 1, para poder considerar-se em posição satisfatoriamente segura. 


Mas e quem exatamente, no Pentágono e no quartel-general da OTAN, está confiantemente calculando qual deve ser o mínimo multiplicador para que o plano de "desarmar" os russos seja ainda mais bem-sucedido que a vitória militar facílima que Carter e Brzezinski comandaram contra o Irã, dia 24 de abril de 1980?

Examinem os candidatos à presidência de qualquer dos partidos (e também os sem partido) no início da campanha eleitoral de 2016: todos eles sabem que guerras no exterior não conquistam votos em eleições, e uma guerra quente, quase uma guerra mundial contra a Rússia –, ora... é assunto que nem aparece na escala das pesquisas. Sangue norte-americano não é moeda de troca em época de eleições – nem a menor gota, nem sangue de "voluntários" ou de "mercenários", não das Forças Especiais dos EUA ou dos soldados regulares dos EUA. Lembrem o cálculo daqueles dias, quando a Guerra do Vietnã ia sendo perdida – mortos em combate + inflação + desemprego = morte para candidatos à presidência.




Sobre esse mapa, trace linhas de 300km de alcance, a partir da base naval russa em Tartus, para o norte e para o sul pela costa, e para leste, para dentro do continente. Feche todas as linhas que levam aos bunkers dos quais conselheiros norte-americanos guiam chechenos, árabes e outros mercenários para seus alvos; interfira pesadamente, boicote e torne inextrincáveis as comunicações eletrônicas, de modo que eles não possam requisitar o socorro da cobertura aérea necessária para lutar contra forças do governo sírio; e treine você mesmo para operações na Ucrânia e no Cáucaso russo, incluindo o Daguestão e a Chechênia.

Trace linhas de 1.500km partindo da Rússia, que atravessem territórios do Irã e do Iraque, no rumo de cada trilha, caminho ou estrada pelos quais possam andar dólares, armas e homens norte-americanos. Destrua tudo o que haja ali hoje, e torne irrecuperavelmente precárias e intransitáveis todas as trilhas, caminhos ou estradas que pudessem vir a substituir as anteriores. 


Desenhe raios de voo dos bombardeiros Su-25 que cubram, para leste e para o norte, qualquer movimento de retirada e reagrupamento do exército dos EUA para desertos não cobertos, onde curdos, iranianos e iraquianos os esperam para matá-los. Essa não é "guerra híbrida", do tipo que transita pelas poltronas de Chatham House, Londres, ou Freedom House, Washington. Essa é guerra real – e com força múltipla de várias dúzias ou centenas para 1, a favor dos russos, sem nenhuma dúvida, nesse momento.

Com isso, a questão passa a ser – com quanto tempo se pode contar lá, por enquanto? Quer dizer, quanto tempo o exército dos coturnos norte-americanos em solo deve esperar pela chegada do helicóptero extra (que Carter não mandou) plus a cavalaria do "desarme", de Brzezinski? Ou, para pôr a questão em termos mais urgentes: quanto tempo ainda terão os homens em solo, antes de terem de correr para salvar a vida? A pergunta foi respondida na noite passada por Alexander Goltz, analista militar do Colégio da Defesa da OTAN (tem sede em Moscou): "A Rússia solicitou [aos EUA] que remova todos os instrutores norte-americanos [que haja na Síria], e suspeito que assim será feito." Para conhecer o currículo de Goltz como observador militar da OTAN em campo, em Moscou, leia o que está aqui.

O reconhecimento, por Goltz, significa que, a menos que os ministros de Defesa da OTAN decidam hoje à tarde, que entrarão em guerra contra a Rússia, qualquer força expedicionária aérea, naval ou em terra, suficientemente grande a ponto de poder desafiar os russos, agora, é impossível. 

É o que também foi noticiado quando o New York Times foi convocado para sessão de atualização "por oficial da Aliança [de Rússia, Síria, Irã, Iraque e Hezbollah], que falou sob a condição de que seu nome não fosse divulgado, para discutir estratégia militar". Tendo dispensado o Financial Times, oEconomist Der Spiegel, torsos falantes de militares que não existem no Oriente Médio, o objetivo estratégico dos russos agora está sendo informado diretamente aos EUA: "Nada de perguntas. Nenhuma. Em nenhum nível" – é o que o Times está noticiando do que ouviu.

A Rússia estabeleceu uma zona aérea de exclusão sobre todas as fronteiras da Síria e montará uma fortaleza alawita ao longo da planície costeira. Quanto ao que acontece nos desertos do norte e oeste, todas as decisões competem aos exércitos xiitas do Irã e do Iraque, com ou sem cobertura aérea russa, mas com absoluta garantia de que ali não haverá cobertura aérea de norte-americanos, da OTAN, de turcos, de sauditas, de jordanianos ou dos Emirados.

Gennady Nechaev, analista militar em Vzglyad em Moscou, explica: "Há espaço aéreo, mas é controlado ou pelos EUA ou por nossa Força Aérea. Mas hoje não se trata de controlar espaço aéreo. Estamos falando de controlar espaço em solo. Aí, as operações podem ser de dois tipos: destruição direta do ar, e isolamento da área de operações por ar, para impedir movimentos do inimigo e reservas futuras. Nesse caso, a tarefa é praticamente irrealizável, porque há uma fronteira aberta com o Iraque, pelo lado da Turquia. Os limites não são controlados. O problema pode ser resolvido [pela Rússia], se se atacar ao longo da profundidade total do espaço sob controle do ISIS. No momento, há em curso uma operação contra a infraestrutura do ISIS. Infraestrutura é modo de dizer e conceito muito maleável, nesse caso, porque eles não têm infraestrutura civil. Há elos militares e conexões que [devem] operar para o fornecimento de armas. Agora, a Rússia está atacando com vistas a esses objetivos."

À noite, um analista militar alemão disse: "Nada disso jamais se viu na história do Oriente Médio, desde a derrota do [marechal de campo Erwin] Rommel (imagem). O Exército Vermelho "está empoderado num nível que jamais se viu no mapa do Oriente Médio." Evgeny Satanovsky, acadêmico especialista em Oriente Médio, em Moscou, acrescenta: "Moscou não quer dividir os terroristas em 'nossos' e 'não nossos'". A emergência da Força Aérea Russa na Síria (...) mudou radicalmente a situação na região. Esperem coisa totalmente diferente, a partir dos princípios."

E se os sauditas transferem suas forças, de bombardear o sul e o leste no Iêmen, para bombardear o oeste, e convidam forças dos EUA para defender as decolagens das bases aéreas sauditas, ou de porta-aviões no Golfo Persa? Fonte militar egípcia comenta: "O rei [Salman] sofre do Mal de Alzheimer e seu filho [Mohammad bin Salman], que realmente governa, é jovem demais; inseguro demais na sucessão do rei; e domesticamente vulnerável demais. Se qualquer deles der uma piscadela nervosa, que seja, na direção da fronteira síria, o preço do óleo volta rapidamente ao nível que a Rússia deseja e do qual precisa. E não virá qualquer apoio para os sauditas contra os russos, do único real fiador árabe: Abdel Fattah el-Sisi, presidente do Egito. Há muito tempo, quando Obama instalou a Fraternidade Muçulmana no Cairo, [Sisi] entendeu a estratégia dos norte-americanos: as promessas de Obama são a mais séria e real ameaça que há, contra a segurança do Egito e dos países árabes em geral. Isso, porque Obama não consegue controlar as Amazonas ensandecidas de Washington que manejam a máquina de guerra dos EUA; nem os jihadistas que o próprio Obama emprega e paga, como mercenários para a guerra. Sem cobertura aérea, linhas de suprimento e muitos dólares, todos aí estão condenados. Os xeiques sauditas não se arriscarão em alguma tentativa para salvá-los."


Para saber mais sobre como Putin administra o relacionamento com os sauditas, leiam minha coluna de 29/10/2013, nesse blog. (...) 

Conforme a versão do New York Times, "um alto oficial da Defesa dos EUA" teria dito que "os padrões operacionais deles [dos russos, na Síria] permanecem idênticos [ao que fizeram na Ucrânia]." Segundo o secretário de Defesa dos EUA Ashton Carter, "entendemos que a Rússia está cometendo um erro em suas ações na Síria." Esse Carter tem laços sentimentais, mas não é parente de sangue do outro Carter, o Jimmy 'Helicóptero' Carter. Para saber mais sobre a figura, vejam-no em ação, ao vivo. *****

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