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Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
A situação com a Turquia está saindo rapidamente de controle: os turcos já atiraram da fronteira, contra território sírio; recusaram-se a respeitar o Tratado "Open Skies" e impediram que um avião russo de vigilância sobrevoasse a Turquia. Agora, militares russos dizem que já detectaram sinais de preparativos, do lado turco, para uma invasão.
Há muitos outros indicadores de que, sim, é possível uma escalada na guerra: as negociações de Genebra foram abruptamente interrompidas; os sauditas estão ameaçando invadir a Síria e há sinais de que o exército sírio, lentamente, mas sem retrocesso, prepara uma operação para libertar Aleppo ainda ocupada por takfiris, o que está criando pânico em Ancara e Riad (o que implica que já deram adeus às ideias estúpidas de que os russos estariam sendo contidos ou de que não existiria exército sírio).
Ao mesmo tempo, há muitos indícios de que todo o "grande plano" de Erdogan para a Síria já colapsou completamente e que não lhe restam opções (leiam, por favor, a excelente análise de Ghassan Kadi sobre isso (traduzido no Blog do Alok - Nota do Blog) que postei hoje, e, também, a reflexão de Pepe Escobar sobre o mesmo tema).
Não sou adivinho nem profeta. Não posso saber o que Erdogan está realmente pensando, ou se os turcos tentarão invadir a Síria. Mas posso, isso sim, oferecer alguns palpites relativamente bem informados sobre possíveis respostas a esse movimento dos turcos, se acontecer.
Primeiro, dois princípios básicos:
1) Forças russas que sejam atacadas, revidarão. Putin até já lhes deu a necessária autoridade para decidir, e acontecerá quase automaticamente, com comandos locais já autorizados a tomar decisões. Em outras palavras, essa troca de tiros não implicará automaticamente guerra em escala total entre Turquia e Rússia.
2) Se a Turquia invadir a Síria, a Rússia agirá em estrita observância ao que determina e assegura a lei internacional. Significa que exigirá reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU e que muita coisa dependerá de como o Conselho reaja. Se a gangue dos fantoches de sempre der 'cobertura' à Turquia (o que, em minha opinião não é provável que aconteça, ou não, pelo menos, por muito tempo, no máximo por uma semana, por aí), nesse caso os russos declararão suas obrigações de proteger a Síria, nos termos do "Tratado de Amizade e Cooperação", de 1980, entre os dois países (sendo a Rússia estado sucessor da URSS, o tratado é plenamente vigente) e do "Acordo entre a Federação Russa e a República Árabe Síria sobre atuação de grupo de aviação das Forças Armadas sobre território da República Árabe Síria", de 2015.
Em outras palavras, a Rússia preservará para ela certo grau de flexibilidade para interpretar a situação, numa ou noutra direção. E isso, por sua vez, significa que muita coisa dependerá de o que os turcos realmente tentem conseguir.
Se estamos falando da velha típica violação pelos turcos de uma fronteira nacional para atacar os curdos, como já fizeram muitas vezes no passado, e se a intervenção for limitada em profundidade, a Rússia provavelmente optará por meios não militares para pressionar a Turquia. Mais uma vez, por mais que os doidos na Turquia anseiem muito por guerra com a Rússia para internalizar o conflito e forçar a OTAN a intervir, os russos não têm interesse algum nessa escalada.
Assim como no Donbass, o ocidente tenta fisgar a Rússia e arrastá-la para alguma guerra, e a Rússia recusa-se a morder a isca.
O problema é que, diferentes dos ucronazistas, os turcos têm máquina de guerra muito poderosa, que os russos não podem ignorar como ignoraram o exército ucronazista e seus muitos esquadrões da morte. Assim, se o objetivo de Erdogan for mostrar-se muito macho e flexionar alguns músculos, como, digamos, Reagan fez em Grenada, nesse caso é possível que nada de mais lhe aconteça, pelo menos por algum tempo. Mas se Erdogan estiver decidido a criar um conflito com a Rússia, os russos não poderão simplesmente dar de ombros e esperar que ele se acalme.
Nesse segundo caso, a Rússia terá várias opções para escalar.
A primeira opção óbvia é ajudar sírios e curdos com informação de inteligência. Já está sendo feito agora e, em caso de invasão turca, as ações serão apenas intensificadas.
A segunda é varrer dos céus as aeronaves turcas, aviões e helicópteros. É opção fácil, dado que os sírios já têm sistemas bastante bons de defesa antiaérea (incluindo alguns Pantsir-S1, Buk-M1/2E, Tunguskas 2K22 e sistema de alarme precoce bastante robusto) e mais algumas aeronaves mais ou menos capazes (que incluem, possivelmente, MiG-29s modernizados). O Kremlin pode pois contar com certo grau do que a CIA chamou de "negabilidade plausível".
A terceira opção ao alcance da Rússia é ajudar os sírios com o sistema de artilharia que os russos já instalaram na Síria, incluindo armas MTSA-B 52-mm, e lançadores de foguetes BM-27 Uragan e BM-30 Smerch.
Todas essas opções ainda não alcançam nível de guerra em "plena escala" entre Rússia e Turquia. Mas se Erdogan estiver determinado a escalar ainda mais, então a guerra será inevitável. Se a Turquia tentar atacar diretamente a base Khmeimim, não há nem sombra de dúvida de que nesse caso a Rússia retaliará.
Que ares terá isso?
A primeira coisa que eu diria é que nem um nem outro país tentará invadir o outro. A ideia de a Turquia invadir a Rússia é autoevidentemente cômica; mas, embora a Turquia esteja dentro da profundidade de 1.000 km para a qual os militares russos são treinados, não creio que a Rússia sequer cogite de invadir a Turquia. Para começar, e exatamente como acontecia no caso da Geórgia, ninguém na Rússia realmente acredita que os turcos, como nação, desejem guerra. No máximo, Erdogan está muito mais para um "Saakashvili versão 2", que para um Hitler, e será enfrentado por esse parâmetro. Além do mais, se durante a guerra de 08.08.08 a Rússia teve de proteger a população de Ossetia, contra os quase genocidas georgianos, no caso do Curdistão a Rússia não tem obrigação semelhante.
Cenário muito mais provável é repetição do que já vimos, mas em escala muito maior: se Erdogan realmente forçar a Rússia a entrar em guerra, haverá ataques de mísseis cruzadores e balísticos contra qualquer infraestrutura que dê suporte à invasão contra a Síria; afundamento de qualquer nave da Marinha Turca que se envolva no esforço; e ataques à bomba e de mísseis contra concentrações de forças turcas e depósitos de munição e combustível (POL); e, especialmente, contra pistas de pouso. O objetivo da resposta russa não será "derrotar" militarmente a Turquia, mas empurrar os turcos a retroceder, e impor a Erdogan a necessidade de um cessar-fogo.
Mesmo que os militares russos sejam capazes de derrotar completamente a Turquia numa guerra, o Kremlin também sabe perfeitamente que qualquer guerra entre Turquia e Rússia sempre terá de ser encerrada o mais rapidamente possível. Além do que, muito mais que "derrotar a Turquia" o verdadeiro objetivo dos russos sempre será derrotar Erdogan.
Por essa razão, os russos, longe de coçarem o dedo no gatilho, empreenderão todos os esforços imagináveis para mostrar que não iniciaram a guerra, mesmo que isso signifique deixar a Turquia entrar na Síria, pelo menos enquanto os turcos se mantiverem próximos da fronteira e desde que não tentem mudar o curso da guerra. Se tudo que os turcos quiserem for uma estreita "zona segura" dentro da Síria, não vejo os russos usando força militar para negar-lhes isso. Protestarão veementemente, em nível diplomático, a ajudarão sírios e curdos, mas não atacarão diretamente as forças turcas.
E quanto aos sauditas? Ora bolas, e o quê, quanto aos sauditas? Pois se não conseguem dar conta nem dos Houthis no Iêmen, por que alguém suporia que poderiam fazer alguma diferença na Síria? Os militares sauditas são piada. Não passam de força repressora degenerada, que mal consegue levar a cabo operações de repressão anti-xiitas. Podem ameaçar o quanto queiram, mas se tentarem entrar na Síria, sírios, russos, iranianos e o Hezbollah disputarão, uns contra outros, o direito de ser o primeiro exército que aplicará uma lição naqueles felásdaputa, que eles não esquecerão por muito tempo.
Francamente, simplesmente não quero crer que Erdogan e seus conselheiros sejam suficientemente doidos para tentar disparar uma guerra contra a Rússia, nem, sequer, para invadir a Síria. Erdogan, sim, é claramente maníaco, mas não acredito que toda a equipe que trabalha no governo turco sejam, todos, lunáticos. Além do mais, não consigo imaginar que EUA/OTAN/UE realmente apoiariam uma invasão turca à Síria ou, ainda menos, um ataque à Rússia. A russofobia é grande e forte, mas só enquanto não expõe o pescoço de cada um a uma guerra continental, porque aí prevalecem o autointeresse e a própria sobrevivência, acima de qualquer noção ideológica. Ou, pelo menos, espero que assim seja.
É possível que esteja sendo ingênuo, mas quero acreditar que o povo turco não ficará, lá, sentado, enquanto um presidente ensandecido arrasta o país deles a uma guerra contra a Rússia.
Para concluir, não quero deixar de mencionar algo bem estranho. Um ancião grego, um monge, de nome Paisios, que a Igreja Russa Ortodoxa consagra como santo, é muito conhecido pelas visões proféticas. Uma das mais famosas é a previsão de que Turquia e Rússia se enfrentariam numa grande guerra, cujo resultado seria o esfacelamento da Turquia, com Constantinopla libertada do jugo otomano (quem se interesse, encontra detalhes aquie aqui).
Claro que sei que, hoje, muita gente simplesmente desconsidera esse tipo de coisa como total nonsense, obscurantismo, superstição, pensamento 'desejante', brotado da cabeça de um "grego ressentido", 'enrolação' religiosa, etc. OK. Mas tenham em mente que, entre os séculos 15 e 20, Rússia e Turquia já combateram, uma contra a outra, 12 guerras (!). É mais de duas guerras (exatamente 2,4 guerras) por século, e a mais recente aconteceu já faz um século.
Assim sendo, independente de o que você pense sobre profecias, experiência histórica ou estatísticas, as coisas, sim, sim, parecem muito, muito assustadoras, pelo menos em minha opinião. E, como Ghassan Kadi e Pepe Escobar explicaram, Erdogan está preso contra a parede, sem saída. Isso, além de tudo mais, também o torna muito perigoso.
Os anglo-sionistas são especialistas em soltar pelo planeta os mais enlouquecidos ideólogos (wahabistas no Oriente Médio; neonazistas na Ucrânia), mas sempre acabam, mais cedo ou mais tarde, por, de um modo ou de outro, perder o controle sobre suas criaturas.
Espero que a 'cobertura' que os EUA dão hoje ao regime de Erdogan não resulte em disparar contra o mundo mais uma dessas ideologias pervertidas – um Imperialismo Otomano. Ou, se já tiverem disparado, que ainda esteja em tempo de os EUA porem rédeas naquele lunático, antes de que seja tarde demais.
Erdogan e seu regime são ameaça à paz regional e, também, à paz mundial. Não me faz diferença quem o tire do poder, se o povo turco ou a Casa Branca, mas, sim, espero que os dias de Erdogan no poder estejam contados, porque, enquanto ele lá permanecer, há risco real de uma catástrofe de grandes proporções.*****
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