Sometimes there comes a crack in Time itself.
Sometimes the earth is torn by something blind. (...).
Call it the mores, call it God or Fate (...).
That force exists and moves.
And when it moves
It will employ a hard and actual stone
To batter into bits an actual wall
And change the actual scheme of things.
Stephen Vincent Benét, "John Brown's Body"*
Sometimes the earth is torn by something blind. (...).
Call it the mores, call it God or Fate (...).
That force exists and moves.
And when it moves
It will employ a hard and actual stone
To batter into bits an actual wall
And change the actual scheme of things.
Stephen Vincent Benét, "John Brown's Body"*
Concedamos a ele o que a ele cabe: foi a pedra dura e real que mudou o esquema real.
Há realmente muitas pedras, uns 60 milhões de pedras, mas Donald Trump fez, derrubando não só a afamada muralha azul [Democratas], mas toda uma muralha de elites e establishments e as expectativas respectivas.
O momento que eu, pessoalmente, nunca esquecerei:
Estava trabalhando numa rede carregada de GreenRoom, tarde da noite, na noite da eleição. Estávamos acompanhando, anotando margens em estados complexos, procurando algum sinal definitivo. De repente, alguém leu alto, do próprio telefone: "AP diz que –Donald Trump eleito presidente dos EUA". Silêncio por um instante. Escrevi nas minhas anotações "2h32 a.m., 11/9/16." Em seguida saímos para um painel na sala de redação, e eu disse o que pensava, outra vez usando minhas anotações: "Assistimos a algo grave, que muda uma época. É o começo de uma nova era cujos contornos e formato ainda não são claros, cujo pessoal e rumos precisos são ignorados. Mas aconteceu algo imenso e incalculável. Deus abençoe nosso país amado."
Não sou dos que sabiam como acabaria aquela noite. Via a vitória de Hillary Clinton, pelas razões de sempre. Agora, estamos cercados de razões que nada têm a ver com as razões de sempre.
Mas é preciso dizer algumas coisas.
Primeiro, nossa república democrática continua viva e vibrante. Não renunciou. Ainda é capaz de oferecer resultado não incompreensível, que derruba você de costas no chão.
Ninguém manipulou resultados. Ninguém viciou máquinas de votar. Ninguém hackeou as máquinas. Não houve brigas nos locais de eleição, havia gentileza e civilidade entre as pessoas. Na rua 92ª abracei três vizinhos. Tudo isso em eleição super eletrizada, altamente dramática e decisiva. Fizemos nosso trabalho democrático e fomos para casa. Tudo funcionou bem.
Segundo, Donald Trump disse que tinha um movimento, e tinha. A prova é a eleição. Sua campanha presidencial foi ruim – desorganizada, não profissional, caótica, improvisando sempre. Nada de ação complexíssima para fazer as pessoas votarem – os eleitores de Trump foram votar porque queriam votar. Nada de sistemas de alta tecnologia para identificar apoiadores – eles se autoidentificaram. Não foram contidos pelo fogo de barragem dos spots de propaganda, os mais brilhantemente produzidos – nada do que diziam se confirmou. Não vimos o triunfo dos mais modernos recursos de campanha eleitoral que o dinheiro pode comprar. O que vimos foi trabalho do povo. O povo, como indivíduos dentro de um movimento.
Foi erupção espontânea, autocomandada. É o que torna tudo ainda mais impressionante e emocionante. E que tão poucos tenham visto o que se aproximava torna tudo, de algum modo, ainda mais bonito.
No caminho para casa na 4ª-feira de manhã, pensei no meu amigo dono da loja de consertos de sapatos do bairro. É idoso, imigrado ítalo-norte-americano. Perguntei-lhe no inverno passado quem seria indicado candidato dos Republicanos, e eIe me olhou como se eu tivesse perguntado como provocação. "TrUmp!", disse ele. Naquele momento dei-me conta de que nos EUA de hoje, só gente normal, comum, é capaz de ver o óbvio. Todos os demais, todos, nos EUA, estão perdidos numa névoa que zune, de tantos "dados".
Valeu sem modificações até o final.
Os que frequentam essa coluna sabem por que acho que aconteceu o que aconteceu. O povo desamparado dos EUA, que tem de sobreviver com as políticas de Washington, rebelou-se contra os superprotegidos que fazem e defendem aquelas políticas, e que pouco se importam com os desprotegidos. Isso levou a romper elos antigos de lealdade e fidelidade. 3ª-feira foi dia, isso sim, de um levante dos desamparados. Foi parte do empurrão para trás contra elites indiferentes que se vê por todo o ocidente e, recentemente, já se viu na votação do Brexit.
Mas quanta coisa depende do imediato momento seguinte! Trump, agora, tem de se mover com firmeza. Se se somam os votos de Clinton, Jill Stein, Gary Johnson e outros, chega-se perto de 52%. 47%-48% votaram em Trump. Foi conquista enorme, mas precária, a corrida foi apertada demais.
Os 16 meses antes da eleição foram, para a campanha de Trump, de projetar a vitória. Agora, tem de começar o projeto de afirmação. O Partido Democrata está em choque, mas logo se recupera. A mídia-empresa de propaganda está cansada e ferida, mas logo se recobra. Passaram meses atirando sem parar contra Trump na campanha. Não se darão facilmente por derrotados. Daqui a pouco recomeça o tiroteio.
Há algo que tenho visto muito pessoalmente nos últimos dias. O modo mal-educado de dizer é que a esquerda acabou por acreditar na própria propaganda. O modo bem educado é que, tenho ouvido o presidente eleito Trump falar de mulheres e minorias etc., a esquerda sinceramente se convenceu de que Trump e o Trumpismo seriam ameaça real à pessoal liberdade irrestrita de cada um deles. A grande maioria dos apoiadores de Trump são cidadãos de bem, gente de boa vontade, que querem o melhor para os EUA, que têm alma de patriota, que jamais, em tempo algum, mereceram ser declarados racistas, sexistas, matadores de esquadrões-da-morte. Alguns, sim, não são nem jamais foram assim saudáveis e benignos.
Nos últimos dias ouvi de um judeu jovem que teme que os judeus sejam tomados como alvos de violência, e contou-me que tem amigos muçulmanos, na mesma rua, também nervosos. E aquela mulher elegante e muito bonita, com emprego de executivo e alto salário, que, quando lhe perguntei como se sentia com o resultado da eleição, contou-me que é lésbica e tem dois filhos nascidos no exterior e adotados, e teme ser alvo de violência e que as crianças lhe sejam tiradas, sabe-se lá como.
Muitos temem nunca mais ser respeitados. Todos têm de saber que as coisas de que dependem continuam a existir. Muita gente não compreende o que aconteceu e tem medo. Todos esses precisam – e merecem – receber informação, reconforto e segurança para continuar a vida. Aparelho do governo Trump: a missão de vocês é encontrar um meio para fazer precisamente isso.
O presidente eleito deve fazer imediatamente várias indicações, depressa, rapidamente, com ênfase inicial em gente de confiança dele. Não é preciso incluir inimigos ideolóticos, mas figuras reconhecíveis em Washington, de governos passados, sim, devem ser convidados. É tolice temer que os apoiadores de Trump, que votaram e o elegeram, passarão a ter medo dele, 'porque' é governo. Eles acreditam no próprio voto e no eleito, estão felicíssimos, e compreenderão que o novo presidente tem de reforçar a própria posição e a própria estabilidade comunicacional.
Terceiro, há ex-funcionários e especialistas respeitáveis, com currículos que os honram e que não compreenderam o que se passou. Tem de ser informados: "Agora, todos temos de ajudar o homem."
Há gente séria e respeitável que não se aproximou do candidato durante a campanha, por causa do estigma colado a ele, de bárbaro sanguinário e – com absoluta certeza – perdedor. Seria arriscar a reputação deles, talvez até o emprego. Melhor deixar que o candidato dos desamparados se afundasse até a total derrota, que ter de continuar a carreira, como tantos intelectuais de renome, no exílio.
Agora, tudo isso é passado.
Num governo Trump haverá três tipos de gente: seguidores leais, oportunistas e patriotas.
Os seguidores leais fizeram por merecer. "Ao vencedor, o butim." Apoie longa lista de presidentes, e você terá garantido um Gabinete de nível médio no Prédio do Executivo. Os oportunistas sempre aparecem em todo e qualquer governo – espionam e encontram a abertura, têm um amigo que tem um amigo que tem um amigo, vão, de subsecretário a secretário assistente. Assim é a vida humana, especialmente entre humanos políticos.
Os que mais interessam são os patriotas, muitos dos quais, no passado cuidaram de manter distância segura de Donald Trump. Agora, se precisa deles. Têm peso, sabedoria, experiência e percepção.
Donald Trump não tem ideia de como ser presidente. Não é frequentador da presidência. Jamais teve cargo público. Não é razoável supor que ele saiba como fazer a coisa.
O próximo presidente precisa dos norte-americanos. É pelo nosso país. Ajudem o homem.*****
* Sometimes there comes a crack in Time itself. / Às vezes lá vem uma rasgão no próprio Tempo
Sometimes the earth is torn by something blind. (...) / Às vezes a terra é rasgada por algo cego (...).
Call it the mores, call it God or Fate (...) / Chame-o os mores [os hábitos?], chame-o Deus ou Destino (...)
That force exists and moves. / Aquela força existe e anda.
And when it moves / E quando ela anda
It will employ a hard and actual stone / Se servirá de pedra dura e real
To batter into bits an actual wall / Para destruir até os cacos uma muralha real
And change the actual scheme of things / E mudar o real esquema de coisas (Stephen Vincent Benét, "John Brown's Body") Tradução de trabalho, sem aspiração poética, só para ajudar a ler [NTs].
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