29.04.2016 - Fernando Brito, Tijolaço
"A discussão sobre a dignidade do Supremo, em termos jurídicos, “perdeu o objeto”.
Não pode mais ser restaurada.
Que vá discutir direitos autoriais, como fez ontem, ou se é possível entrar no cinema com a pipoca comprada no carroceiro; cada um tem a estatura que se dá."
A coragem e a dignidade de um ser humano não se medem apenas por seus atos, mas por quando os pratica.
O cidadão que vê alguém ser agredido e só grita “covarde!” quando o agressor já vira a esquina, talvez o esteja gritando para si mesmo.
O “pega-ladrão” dito quando o gatuno já some na poeira, levando o roubo, torna quem o diz cúmplice da perda que já não pode ser recuperada.
Ao Supremo Tribunal Federal, a esta altura, tanto faz condenar ou absolver Eduardo Cunha.
O que são os R$ 52 milhões de reais que, na denúncia feita hoje na folha pelo seu ex-cúmplice Fábio Cleto (sairá livre o rapaz bem apessoado?) perto dos 54 milhões de votos que ele furtou, domingo passado, ao povo brasileiro?
Se o Supremo o condena, ficará em todos a impressão que executa, como nas quadrilhas, a mão que fez o serviço sujo. Queima o arquivo, como se diz no dialeto policial.
Se o absolve, soará como paga ao trabalho imundo que realizou.
O resto, as alegações, o rito, os prazos, os artigos, alíneas, incisos, precedentes, arestos, assentadas e outras terminologias afetadas serão apenas, para seguir no Direito, lana caprina.
Lã de cabra, coisa sem valor, sem influência, inútil, que deve ser desprezada por sem serventia prática.
Bernardo de Mello Franco, na Folha de hoje, recorda que o afastamento de Cunha da Presidência da Câmara foi pedido em dezembro passado, em nome “dignidade do Parlamento”, que estava sendo usado “”em benefício próprio e de seu grupo criminoso”. E, dizia Rodrigo Janot, o “regular funcionamento das instituições (…) somente será possível se (…) adotada a medida de afastamento do deputado Eduardo Cunha”.
Se, agora, depois destes 135 dias e de quantos mais se passarem até que o Supremo examine o pedido, concluir-se que são procedentes aquelas razões, não se poderá dizer, então, que neste interregno o Parlamento foi indigno, que beneficiou um criminoso e seu grupo e que a instituição não funcionou de forma regular?
Um período em que, simplesmente, propôs-se e consumou-se um processo de impedimento de uma presidente eleita pelo sufrágio universal, notória vítima dos instintos mais primitivos de Cunha.
A discussão sobre a dignidade do Supremo, em termos jurídicos, “perdeu o objeto”.
Não pode mais ser restaurada.
Que vá discutir direitos autoriais, como fez ontem, ou se é possível entrar no cinema com a pipoca comprada no carroceiro; cada um tem a estatura que se dá.
PS. Para quem não sabe, poltrão diz-se de quem é medroso ou covarde. Ou do animal que engorda e se torna preguiçoso, o que não vem ao caso, não é?