8/1/2018, Pepe Escobar, de Asia Times em The Vineyard of the Saker
Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
Conversações intracoreanas de alto nível na cidade de Panmunjeom na fronteira são passo vital na diplomacia dos Jogos Olímpicos de Inverno, mas também oferecem excitante chance para uma abertura em discussões que estão hoje paralisadas no 'grupo dos seis'.
Em contraste gritante com a chuva usual de tuítos, o presidente Donald Trump dos EUA até disse ao presidente Moon-Jae-in da Coreia do Sul que a reunião poderia levar a resultado positivo.
Outra possibilidade é que se revigorem as conversações dos seis (China, Rússia, Japão, Coreia do Sul, EUA e Coreia do Norte).
Além dos Jogos de Inverno, a feroz divisão entre Norte e Sul, é claro, não será superada, ainda que o líder norte-coreano Kim Jong-un tenha destacado que seu país não recorrerá a soluções nucleares, se seu regime não for atacado por "forças hostis".
Parece confiante de que os EUA não atacarão preventivamente com armas nucleares, por causa da capacidade de contenção que o Norte tem. Assim sendo, a pergunta é: onde se posicionará a China, depois das conversações de Panmunjeon?
Rumores de que Pequim ter-se-ia resignado a enfrentar guerra iminente entre Washington e Pyongyang jamais mereceram qualquer crédito. Sem sombra de dúvida, uma das posições tiradas no 19º Congresso do Partido Comunista da China em outubro passado foi que o Presidente Xi Jinpingprotegeria o complexo relacionamento de Pequim com Washington, bem como os relacionamentos com grandes parceiros comerciais da China em toda a Ásia.
Mas não significa necessariamente abandonar completamente a República Popular Democrática da Coreia. O imperativo estratégico número 1 para Pequim é manter o país como almofada de proteção contra a presença dos EUA no Nordeste da Ásia. Uma península coreana reunificada, com soldados norte-americanos plantados junto à fronteira noroeste da China é algo que tem de ser evitado a qualquer custo.
Confronto direto
Mas também significa evitar qualquer escalada que possa levar a confronto direto com os EUA. Assim, se pode dizer que Xi concluiu que os negócios com os EUA superam em muito qualquer apoio incondicional à Coreia do Norte, que em nada faz avançar os interesses de Pequim.
Um alto conselheiro do governo chinês, professor Shi Yinhong, descreveu a Coreia do Norte, em expressão que ganhou fama, como uma "bomba relógio". Assim sendo, fizeram-se planos que foram implementados. Importante aí foi a construção de uma rodovia de seis pistas entre Shuangliao, cidade na província ocidental de Jilin, passando por Ji’an, cidade que tem nível de município na região central de Jiangxi, e daí até a fronteira da Coreia.
Pode ser interpretada como um mapa do caminho para proteger o arsenal nuclear do Norte, em caso extremo. Envolveria o fim da dinastia Kim ou um movimento para Pequim promover uma mudança de regime em Pyongyang – tema que se discute há anos nos think tanks chineses.
Na verdade, esse cenário conecta-se com sugestões de que o Exército Popular de Libertação da China não interfira nem no caso de os EUA lançarem ataque preventivo. Oficialmente porém a posição de Pequim favorece a desnuclearização da península coreana.
Assim começaria um mecanismo de "duplo congelamento", permitindo o diálogo entre Washington e Pyongyang. Pequim está agudamente consciente de que conter o programa nuclear do Norte terá efeito direto na modernização militar do Japão e da Coreia do Sul. China também tem alto interesse em melhorar as relações com Seul.
Desce 1953, existe apenas um tênue armistício na península coreana. E nenhum ator geopolítico fez qualquer esforço para alterar esse status quo. Afinal de contas, qualquer marola geraria um abalo tectônico no tabuleiro de xadrez geopolítico no Pacífico Asiático, com consequências imprevistas.
Mas agora uma Coreia do Norte nuclear está mudando a dinâmica entre EUA e China na região, mudança que se intensifica com a deriva da Rússia para o oriente. E, claro, há o Japão e a Coreia do Sul, duas grandes potências econômicas.
Por mais que o Norte possa temer o impacto em seu próprio mercado interno no caso de ser massacrado geoeconomicamente por Pequim, não é excesso de fantasia imaginar Kim, com vistas a obter as simpatias de Washington, disposto a meter uma cunha nas Novas Rotas de Seda da China, hoje conhecidas como Iniciativa Cinturão e Estrada.
Assim como Trump, Kim pode até nem ser um líder dos mais estrelados. Mas com certeza sabe – segundo pensa o Pentágono –, que o Pacífico Ocidental, combinado com o Oceano Índico, é absolutamente estratégico para que a China seja contida.
Estudos como o de Michael Green, By More Than Providence: Grand Strategy and American Power in the Asia Pacific Since 1783 deixam perfeitamente claro que os EUA não tolerarão que outra potência estabeleça "hegemonia exclusiva".
Mesmo assim Washington não sabe nem por onde começar a negociar com a Coreia do Norte. Rússia e China opõem-se a qualquer solução militar que possa interferir em seus objetivos geopolíticos. Simultaneamente, Pyongyang quer ser aceita como potência nuclear e ator chave no tabuleiro de xadrez do Pacífico-Asiático.
Ataque devastador
Tudo isso considerado, só há três possibilidades sobre a mesa. A primeira é ataque preventivo devastador, com forças nucleares, além de aéreas e marítimas. Isso levaria a perda de número imenso de vidas, não só no Norte, mas também em Seul, que estaria dentro da área de tiro de Kim.
As conversações em Panmunjeon são prova ainda mais convincente de que o presidente Moon está fazendo tudo que esteja ao seu alcance para impedir uma marcha rumo à guerra.
A segunda opção é aceitar a Coreia do Norte como potência nuclear sob controle internacional estrito de EUA, China, Rússia, Japão e Coreia do Sul. A desescalada teria de incluir um acordo que congelasse o programa nuclear do Norte.
Há sinais de que canais secretos usados pelo secretário de Estado dos EUA Rex Tillerson permanecem abertos. Essa redenção improvável de um estado nuclear bandido, porém, significaria alteração mínima do status quo. E além do mais daria à China enorme vantagem na região.
A terceira opção, por fim, é admitir que o problema é insolúvel; converter Kim em ator racional e deixar que o Norte conserve sua bomba. O regime de Kim nesse caso seria avisado de que qualquer tentativa para usar a bomba resultaria em "fogo e fúria".
É o que se pode chamar de a arte do não acordo.*****
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