sábado, 26 de janeiro de 2019

Venezuela, 2019: Abordagem Adaptativa Indireta para ‘mudança de regime’

24/1/2019, Andrew Korybko, Eurasia Future

Traduzido pelo Coletivo Vila Mandinga


Ver também
26/3/2016, "Guerras Híbridas". Abordagem adaptativa pós-tudo para 'mudança de regime',
Andrew Korybko, Oriental Review, traduzido, no Blog do Alok
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A Venezuela está envolvida numa Guerra Híbrida clássica, e analisar a abordagem adaptativa indireta para ‘mudança de regime’ que está sendo aplicada ali pode ser instrutivo para compreender processos similares em outros pontos.

A Guerra Híbrida contra a Venezuela está chegando ao clímax, depois de provocação planejada e coordenada, dos norte-americanos e de seus aliados no “Grupo de Lima”, para reconhecer Juan Guaidó como “presidente interino” do país, depois de ele mesmo ter-se apresentado como tal no dia em que a República Bolivariana comemorava a derrubada de um ditador, em 1958. O simbolismo foi pensado como ‘mensagem’ ao povo da Venezuela, de que Maduro será seu próximo governante a ser derrubado; e para sinalizar para a comunidade internacional que “o povo” estaria em levante contra o regime. Nada disso acontece por acaso, mas é a culminação de uma estratégia dos EUA para mudança de regime, atentamente calibrada ao longo dos anos que se seguiram desde a publicação, em 2015, de meu livro Hybrid Wars: The Indirect Adaptive Approach To Regime Change.

O que adiante se lê é um sumário simplificado do que os EUA fizeram para pôr por um fio a República Bolivariana:

1) Desenvolver um motivo multifacetado, que justifique o tempo e o esforço

Todas as Guerras Híbridas visam a alcançar objetivo que tenha significado estratégico; no caso da Venezuela, os EUA continuam a obrar para controlar completamente o Caribe; para promover duas de suas agendas: a agenda ideológica de derrubar governos socialistas, e a agenda econômica de controlar as maiores reservas de petróleo do mundo localizadas no Cinturão do Orenoco.

2) Desmantelar de fora para dentro o desenvolvimento macroeconômico

Os EUA impuseram sanções e utilizaram outras formas de coerção contra a Venezuela para minar o desenvolvimento macroeconômico do país. Com isso, duplicaram o efeito, porque as medidas para minar o desenvolvimento foram cronometradas para coincidir com o crash dos preços do petróleo que impediram que o estado mantivesse o próprio modelo socialista de redistribuição da riqueza sem fazer reformas.

3) Explorar os erros de gestão do governo Maduro

Deve-se sempre esperar que nenhum governo consiga gerir perfeitamente todas as situações adversas que tenha de enfrentar; o governo da Venezuela certamente não é exceção, mas os EUA usaram como arma a favor de interesses externos os erros do governo Maduro na resposta à Guerra Híbrida que Washington movia contra ele com recursos de infowars e outras operações para influenciar a opinião pública e reforçar movimentos de agitação social.

4) Despertar células de revolução colorida já organizadas 

Depois de ter implantado e cultivado clandestinamente células de Revolução Colorida dentro do país e em outros países, os EUA deram o sinal para que saíssem às ruas de tempos em tempos, em resposta a determinados “eventos-gatilho” como, por exemplo, o que a mídia-empresa dominante descreveu como “eleições disputadíssimas”, tudo com vistas a catalisar um ciclo autossustentado de agitação de Guerra Híbrida em que “civis” aparecem como se estivessem em luta contra o estado.

5) Estabelecer estruturas paralelas de governo

Simultaneamente com o estágio já avançado da preparação de Revoluções Coloridas, os EUA aproveitaram-se da iniciativa de Maduro, de criar a Assembleia Nacional Constituinte, para fazer a ANC operar como estrutura paralela de governo sob a influência de Washington e de elementos especialistas em forçar mudança de regime em outros países.

6) Confiar em ‘agentes locais representantes’ para ‘justificar’ o prosseguimento da intervenção

O passo seguinte, previsível, será os EUA e aliados ‘justificarem’ a intervenção cada vez mais profunda em assuntos internos da Venezuela, sob o pretexto de que Gaidó, o agente local representante dessa vez (ou quem o ‘suceda’ no cargo, caso algo lhe aconteça) requererá “ajuda adicional” que pode ser clandestina, mas que, na pior das hipóteses, também pode assumir dimensões de intervenção convencional.

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Como se vê, os EUA executaram intervenções cirúrgicas em estágios cruciais da Guerra Híbrida contra a Venezuela. Cada uma delas visava a escalar a situação em paralelo a várias ações de terrorismo. Lamentavelmente, não há “solução ideal”, dado que os dois lados estão jogando “para valer”; literalmente é jogo de tudo ou nada para os dois lados. 

“Ceder” em nome de algum chamado “bem maior” pode reforçar a “oposição” amparada e promovida por agentes externos ao país, exatamente como aconteceu em fevereiro de 2014, com a onda de terrorismo urbano conhecida como “EuroMaidan”; e Maduro sempre pode concluir que esse efeito seja inevitável, se for posto sob suficiente pressão, e assim “aceitar pacificamente” a ideia de participar de uma “transição de lideranças por etapas”. 

Por outro lado, Maduro e seus militares podem decidir lutar e resistir até o fim, caso creiam que têm a seu favor a maioria da população, como fez o presidente Assad da Síria em circunstâncias comparáveis, ainda que tenha de pagar o alto preço de uma guerra prolongada ou do que pode vir a ser umas das mais terríveis crises humanitárias que o mundo já viu.

Seja como for, que ninguém invista muitas esperanças em a Rússia iniciar intervenção em conflito militar em apoio a Maduro, como fez no caso de Assad. Não é viável para a Rússia manter linhas de suprimentos transatlânticas, necessárias para esse tipo de ação na América, dado que os EUA têm completo controle sobre ar e mar nesse espaço do ocidente. 

O máximo que a Rússia pode provavelmente fazer é despachar navios com entregas emergenciais de diferentes sistemas de armas, mas é recurso que só é relevante no que tenha a ver com conter agressão convencional e praticamente não tem qualquer efeito na resistência contra ameaças híbridas como as que surgem de Revoluções Coloridas e terrorismo urbano. Retórica à parte, o único interesse real que a Rússia tem na Venezuela é cuidar para que a Venezuela pague os empréstimos de bilhões de dólares que o país recebeu e que Caracas respeite os acordosde energia e militares que assinou com Moscou. Não há dúvidas de que a Rússia sofrerá grave baque financeiro, se as ‘autoridades’ que o golpe puser no poder cancelarem aqueles acordos, no caso de a ‘mudança de regime’ ser bem-sucedida. Por isso, é possível que os russos tentem algum “acordo pragmático” com os “rebeldes”, se se configurar alguma real possibilidade real de eles chegarem ao poder.*******

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