Entreouvido na Vila Vudu:
Artigo interessante para q se comece a 'contextualizar' o golpe no Brasil e a correria em que se meteu o governo Temer-golpista, para implantar as tais 'reformas': os EUA exigiram pressa, porque precisam modelar o próprio quintal e torná-lo maximamente atraente para empresas norte-americanas – e quanto mais predadoras, melhor –, antes que Rússia e China tenham tempo para incorporar nossa região num desses BRICS+ ou BRICS++ e ideologias de "ganha-ganha" à chinesa... Os EUA nunca mudam!
Artigo interessante para q se comece a 'contextualizar' o golpe no Brasil e a correria em que se meteu o governo Temer-golpista, para implantar as tais 'reformas': os EUA exigiram pressa, porque precisam modelar o próprio quintal e torná-lo maximamente atraente para empresas norte-americanas – e quanto mais predadoras, melhor –, antes que Rússia e China tenham tempo para incorporar nossa região num desses BRICS+ ou BRICS++ e ideologias de "ganha-ganha" à chinesa... Os EUA nunca mudam!
A ordem mundial passa atualmente por mudanças profundas, na transição, de sistema unipolar controlado pelo Ocidente, para um modelo não ocidental de multipolaridade. A fricção multifacetada que se tem hoje entre as forças opostas é como um resumo complexo da Nova Guerra Fria. EUA e aliados lutam para preservara absoluta dominação sobre todos os assuntos globais; e Rússia, China e respectivos parceiros trabalham com empenho para conseguir avanços pacíficos no trabalho de minar o controle até aqui exercido pelo lado adversário.
Desenvolver sistemas alternativos de governança, como o grupo BRICS, a Associação de Cooperação de Xangai, OCX [ing.Shanghai Cooperation Organization (SCO)] e o Banco Asiático para Infraestrutura e Investimento, BAII [ing. Asian Infrastructure Investment Bank (AIIB)] é iniciativa central para que projetos já concebidos como multipolares comecem a alterar o sistema mundial. Mas o mais imediatamente necessário é integrar os países afro-eurasianos do Hemisfério Ocidental numa rede ganha-ganha de relações econômicas de setores reais. A solução chinesa para essa necessidade premente é o projeto "Um Cinturão, Uma Estrada" [ing. One Belt, One Road (OBOR)], visão global da conectividade das Novas Rotas da Seda, que visa a construir uma série de projetos de infraestrutura ligados por conectividade transnacional multipolar – para operar precisamente aquela interligação.
Conectividade no Corredor Econômico China-Paquistão
O projeto mais importante das Novas Rotas da Seda é o Corredor Econômico China-Paquistão, CECP (China-Pakistan Economic Corridor, CPEC), investimento até aqui de $55 bilhões para conectar o Leste da Ásia ao Sul da Ásia, servindo-se de rota comercial por terra que não se sirva do estreito de Malacca. Quando a construção estiver completada, o Corredor Econômico China-Paquistão será fator de ampla mudança no jogo geopolítico, pela simples razão de que dará à China uma alternativa à rota pelo Mar do Sul da China e Estreito de Malacca, tornando impossível para a sempre incômoda Marinha dos EUA controlar as rotas comerciais da República Popular, pela manipulação daqueles dois pontos de engarrafamento. Assim, por sua vez, a China poderá comerciar mais livremente com a Europa Ocidental, Oriente Médio e parceiros africanos e, assim, promover globalmente sua visão das Novas Rotas da Seda como elemento de transformação estrutural do sistema global sob controle unipolar.
Enquanto a China realmente já navegando também por corredores terrestres por toda a Eurásia e planeja equipá-los com tecnologias para trens de alta velocidade, cada um desses novos corredores permanece exposto ao risco de ser interrompido, controlado ou influenciado pelos conflitos identitários, todos provocados de fora, do que tenho chamado de Guerras Híbridas. O mesmo se pode dizer do Corredor Econômico China-Paquistão, sim, mas é muito mais fácil administrar essas perturbações na China e no Paquistão, dois estados de trânsito, do que no centro do continente eurasiano. Assim sendo, o Corredor Econômico China-Paquistão passa a ser o investimento mais sólido e confiável de todo o Projeto Novas Rotas da Seda, de um ponto de vista de segurança, muito mais facilmente compreensível se se conhece a seriedade geoestratégica desse projeto.
O Corredor Econômico China-Paquistão não só conecta a China ao Oceano Índico, mas também lança os alicerces para que o Paquistão funcione como o 'entroncamento da Eurásia', conectado uma série de blocos econômicos eurasianos. Como expliquei na análise que redigi para o Russian Institute of Strategic Studies, em setembro de 2015, o Corredor Econômico China-Paquistão carrega em si a promessa de operar o 'entroncamento' da União Econômica Eurasiana liderada pela Rússia, com China, Irã e o Paquistão (membro da Associação Sul-asiática Cooperação Regional [South Asia Association for Regional Cooperation, SAARC]) juntos para fortalecer economicamente a OCX e, assim, reforçando subsequentemente a viabilidade da emergente Ordem Mundial Multipolar.
Se se aceita que o Corredor Econômico China-Paquistão tenha reais possibilidades de conectar Europa, países árabes e África com seus contrapartes da OCX, então se pode pensar numa Convergência de Civilizações a acontecer em território paquistanês, e que poderia, consequentemente fazer frente ao que se propagandeia como "Choque das Civilizações".
Se se conhece a significação única e insubstituível do Oceano Índico e o duplo papel que o Corredor Econômico China-Paquistão está posicionado para desempenhar como Acelerador da Eurásia e para a Convergência de Civilizações, é razoável afirmar que esse é um século Indo-Pacífico e que o Paquistão está bem no coração dos mais influentes processos globais.
Como funciona
Mas nenhum dos conceitos acima referidos – Acelerador da Eurásia, Convergência de Civilizações e Século Indo-Pacífico – é mero slogan hiperbólico, e há sólidos argumentos econômicos por trás de cada um.
Explicando de modo resumido, a expansão da conectividade nos transportes em geral resulta em melhoria de relações econômicas entre as partes conectadas e que passam a utilizar uma determinada rota, melhoria que em termos gerais justifica o paradigma do Acelerador da Eurásia.
Quanto à Convergência das Civilizações, qualquer empresa se interessaria por mudar suas fábricas e unidades de produção para o Paquistão, de modo a se posicionar entre fornecedores e consumidores distribuídos por todo o Hemisfério Oriental, e por reduzir os custos de transporte e mão de obra.
Postos de manufatura, montagem ou vendas no sul da Ásia poderiam facilitar muito o processo de equilibrar a conectividade comercial entre a Europa Ocidental e o Leste da Ásia, bem como o acesso, em princípio, à Associação Sul-asiática de Cooperação Regional (desde que possam ser superados os bloqueios político-administrativos).
O Corredor Econômico China-Paquistão também está localizado a meio do caminho entre o florescente mercado leste-africano e as indústrias chinesas do leste da Ásia, de modo que o corredor pode também ser utilizado por qualquer desses lados ou por terceiros interessados para facilitar o comércio entre os países desse emergente eixo econômico.
Todas interligadas, as várias redes comerciais no Oceano Pacífico e a localização central do Corredor Econômico China-Paquistão darão ainda maior confiabilidade ao argumento de que o mundo caminha na direção de um Século Indo-Pacífico que verá o Sul da Ásia tornar-se o ponto focal da disputa geopolítica e econômica global.
Ampliar os BRICS
Tendo já compreendido a lógica que rege o Corredor Econômico China-Paquistão e sua importância para a Nova Guerra Fria, é hora agora de o leitor começar a entender como esse projeto de mudanças vastíssimas deve contribuir para promover o bloco dos BRICS e para a consequente promoção da emergente Ordem Mundial Multipolar.
Economista chefe do Banco de Desenvolvimento da Eurásia e Diretor de Programa do Clube Valdai de Discussão, Yaroslav Lissovolik publicou proposta política provocadora, que exige reflexão, no artigo "Repensando os BRICS: os conceitos de BRICS+ e BRICS++ [Re-Thinking The BRICS: On The Concepts Of BRICS+ and BRICS++][1]." Nesse artigo Lissovolik elabora sobre as possibilidades mais factíveis para ampliar as parcerias dos cinco países BRICS numa plataforma verdadeiramente multipolar global. Pouco depois, a China propôs seu próprio conceito de "BRICS-Plus" vagamente referido como constituído de parceiros chaves no projeto Um Cinturão um Estrada, inferindo portanto que o Paquistão e o Corredor Econômico China-Paquistão (o maior investimento da Rota da Seda) estaria naturalmente envolvido.
Esse movimento provocou imediatamente a ira da Índia, que sempre se opôs firmemente ao Corredor Econômico China-Paquistão, alegando que o projeto violaria as demandas de Nova Delhi sobre a Caxemira. Explorei em muitos detalhes as várias nuances envolvidas nisso, em artigo que escrevi para um veículo de análise política de Islamabad, Regional Rapport intitulado "Índia enlouquece por causa da proposta 'BRICS+' da China" [India's Freaking Out Over China's 'BRICS-Plus' Proposal], onde leitores interessados podem encontrar detalhes dessa importante questão. Mas a questão da resistência da Índia ao projeto não é o foco desse artigo, nem o processo pelo qual a Índia desenvolve rapidamente sua parceria militar-estratégica com os EUA – os quais muito provavelmente tiveram papel ativo e de orientação nos movimentos da Índia. Assim sendo, prefiro continuar aqui a considerar os aspectos positivos relacionados ao Corredor Econômico China-Paquistão.
A visão chinesa da nova conectividade do projeto Um Cinturão Uma Estrada recebeu recentemente apoio oficial do Conselho de Segurança da ONU em meados de março, o que criou cenário privilegiado para o reunião de cúpula, em março, em Pequim, daIniciativa Cinturão e Estrada, da qual participarão dúzias de líderes mundiais, inclusive o presidente Putin. Índia e EUA, no que ainda não se sabe se é coincidência ou plano, ainda não confirmaram presença – o que além do mais sinalizará que os dois países estão voluntariamente se autoisolando, escolhendo posicionar-se fora desse novo quadro econômico global.
Com eles ou sem, a China e a multidão de parceiros que a acompanha não se deixarão dissuadir e prosseguirão em velocidade frenética a fazer avançar seu projeto Um Cinturão Uma Estrada, mesmo que dois países 'do contra' oponham-se a essa série de iniciativas, e há fortes sinais de que Pequim fará dos conceitos de Novas Rotas da Seda e BRICS+ as manifestações tangentes dosquatro temas que a República Popular da China planeja promover na próxima 9ª Cúpula dos BRICS que acontecerá em Pequim em setembro.
Assim sendo, não há como não prever que o Corredor Econômico China-Paquistão lá aparecerá e roubará o show, dada a sua alta relevância geoestratégica, como vimos acima. Por tudo isso, pode-se dizer que esse projeto das Novas Rotas da Seda constituirá a espinha dorsal inseparável dos BRICS+ e, assim, do futuro do mundo multipolar.
É o que torna ainda mais estranho que não estejam todos interessados no Corredor Econômico China-Paquistão e no quanto poderá catalisar uma transição global da unipolaridade para a multipolaridade, mas essa falta de clareza pode ser atribuída à guerra de informação em curso que os rivais de China e Paquistão promovem e que visa a suprimir qualquer informação objetiva sobre esse ambicioso movimento. Seja como for, a China parece pronta a levar o Corredor Econômico China-Paquistão para a ribalta e mostrá-lo ao mundo durante as duas próximas grandes reuniões de cúpula, da Inciativa Cinturão-Estrada e a dos BRICS – quando esses projetos serão expostos como pedra basilar de um sistema mundial alternativo igualitário e justo, que China e seus parceiros estão construindo.
Assim sendo, o futuro do mundo multipolar depende desse Corredor Econômico China-Paquistão. E dado o forte apoio global que a iniciativa vem recebendo, pode-se dizer com segurança que o futuro do mundo está em boas mãos.*****
[1] "Com efeito, o círculo dos BRICS+ delimita o grupo da parceria interna "regional" dos blocos econômicos dos BRICS (constituído de blocos chaves de integração regional, como a Organização de Cooperação de Xangai (onde se reúnem os três atores chaves na Eurásia – Índia, China e Rússia), Mercosul, SADC/SACU, etc. Os BRICS++são círculo mais solto de alianças bilaterais (com países individuais ou blocos regionais) que têm por base Acordos de Livre Comércio; ou se baseiem em outros tipos de acordos de integração econômica (incluindo a esfera de investimentos). Ambos, BRICS+ e BRICS++ expandem o conjunto de alianças de todos os países incluídos nesse círculo mais amplo, no qual acordos já existentes de comércio ou investimentos podem servir de base para multilateralizá-los com outros grupos do grupo ampliado. Se bem-sucedido na construção do próprio peso econômico, a rede BRICS ampliada pode ter impacto significativo nos fluxos de comércio e investimento na economia mundial e tornar-se ponto focal capaz de atrais esses fluxos (à base de uma “causação cumulativa", como já se viu acontecer nas economias desenvolvidas nas décadas precedentes." [Re-Thinking The BRICS: On The Concepts Of BRICS+ And BRICS++, 7/2/2017, Yaroslav Lissovolik, Valdai Club, aqui traduzido.]
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