terça-feira, 13 de outubro de 2015

KALIBRar o inimigo: implicações estratégicas do lançamento de mísseis cruzadores russos


A diplomacia, apesar de todas as convenções, só reconhece eventos reais.
Charles de Gaulle


Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu

Semana passada, aconteceu na Síria um evento de máxima importância, como parte da Operation Hmeymima Flotilha do Cáspio da Marinha Russa disparou 26 mísseis cruzadores de ataque em terra (land-attack cruise missiles (LACMs) que acertaram 11 alvos militares, dos grupos terroristas Jabhat al-Nusra dentro da Síria, localizados a cerca de 1.500km de distância do ponto de onde os mísseis foram disparados:






Um disparo massivo, usando LACMs Kalibr-NK, foi feito do sudoeste no Mar Cáspio. Os objetos do ataque eram fábricas que produzem explosivos; postos de comando, depósitos de munição, de armas e de combustível; e campos de treinamento de terroristas nos governorados sírios de Raqqa, Aleppo e Idlib. Os mísseis cruzadores, com margem de erro de cerca de 3m de raio em torno do alvo, acertaram precisamente os respectivos alvos definidos dois dias antes.

A fragata Dagestan, armada com mísseis e capacidade para deslocar cerca de 2.000 toneladas, atuou como nave madrinha da força naval russa de assalto, acompanhada pela pequena patrulha de mísseis formada pelas naves Veliky UstyugGrad Sviyazhsk eUglich (com capacidade de deslocamento de cerca de 1.000 toneladas). 
Os mísseis Kalibr-NK são extremamente difíceis de detectar: quando manobra, um LACM voa em alta velocidade, em modostealth – o que significa que não emite qualquer sinal que possa ser rastreado por radares.

A Rússia informou aos líderes do Iraque e do Irã sobre a trajetória desses mísseis. Para prover máxima segurança às populações civis, a rota dos LACMs foi traçada sobre área não habitada.

Quais as implicações militares e políticas do uso desses mísseis?

Foi a primeira vez que as Forças Armadas russas empregaram esse tipo de arma em situação de combate real – que não fosse durante exercício – contra alvos tão distantes. 

O segundo ponto mais importante é que todos os 26 mísseis lançados atingiram os alvos demarcados, nenhum se desviou da trajetória previamente calculada, nenhum sofreu qualquer tipo de pane técnica e nenhum caiu em solo enquanto ainda se aproximava do alvo. (A rede CNN informou erradamente que quatro mísseis teriam 'caído no Irã', o que foi desmentido, não pelaCNN, e não só por fontes russas e iranianas, mas também por porta-vozes do Departamento de Estado e do Pentágono). Alguns alvos receberam dois tiros.


Área de alcance dos Kalibr-NK a partir do Cáspio (círculo da direita) e do Mar Negro.


Graças ao sucesso de uma Operação Cáspio, as Forças Aeroespaciais Russas de Defesa acrescentaram mais um novo e muito significativo elemento às suas capacidades para combate aéreo na Síria. 


O traço mais importante dos [mísseis cruzadores de ataque em terra (land-attack cruise missiles)] LACMs é que atacam instantaneamente e com acuidade sem paralelo. Têm acentuado efeito de desmoralização sobre o inimigo, porque, mesmo que o míssil seja detectado no momento do lançamento, não é possível sequer prever a área geográfica que será atingida. Evidentemente, os EUA não se cansam de 'exigir' que Moscou seja proibida de usar esses mísseis, insistindo que eles violariam o Tratado sobre o Alcance de Forças Nucleares de Médio Alcance [Intermediate-Range Nuclear Forces Treaty], o que não se aplica, porque esse tratado só proíbe o uso de LACMs disparados de terra.

Esse primeiro evento de emprego no mundo real, pela Rússia, de seus LACMs de longo alcance, tem significativa importância estratégica, porque os veículos que transportam esses sistemas (de superfície e submarinos), estacionados em qualquer ponto no oceano, podem minimizar o uso potencial de armas nucleares e de sistemas antibalísticos ofensivos, por estados que ainda consideram a Federação Russa como "maior inimigo potencial", "estado agressor" e "estado anexador".

Esses sistemas de armas de alto impacto podem ser usados, transportando ogivas nucleares ou não nucleares, para ataques preventivos ou de retaliação.

Além disso, o Mar Cáspio ("mar fechado") ganha importância estratégica para a Rússia, porque dali a Rússia pode fazer ataques cirúrgicos com os mísseis LACMs em toda a região do Oriente Médio, sem risco de contramedidas das forças navais da OTAN.

Agora que as forças armadas russas já inauguraram arma de tão alta precisão, o Pentágono pode parar de jogar dinheiro fora na ampliação de suas opções militares pensadas exclusivamente para atacar a Rússia. 

Em outras palavras, não é mais necessário gastar quantias significativas de dinheiro para manter armas nucleares táticas norte-americanas estacionadas na Europa, ou usar a infraestrutura antibalística plantada no mar na Romênia e na Polônia – e também na região do Pacífico Asiático –, dado que está já absolutamente evidente que doravante todas essas instalações passam a estar ao alcance não só dos LACMs russos mas, muito em breve, estarão também ao alcance de armas efetivamente hiper-sônicas de alta precisão equipadas com ogivas não nucleares

Deve-se esperar que não só o 'Estado Islâmico', mas também Washington e a OTAN logo cheguem a conclusões rápidas, táticas e profundamente estratégicas a partir da Operação Cáspio; que assim ponham fim às repetidas ameaças de usar força contra a aviação russa; e que compreendam que, ainda que não consigam ser amigos ou "parceiros estratégicos" da Rússia, devem aprender a conviver em paz.*****






[1] Vladimir Kozin é Chefe do Grupo de Conselheiros do Instituto Russo de Estudos Estratégicos, Membro da Acadamia Russa de Ciências Naturais e Professor da Academis de Ciências Militares da Federação Russa.

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