terça-feira, 1 de setembro de 2015

Choque da Bolsa e Bipolarismo Econômico


28/8/2015, Andrew Korybko, The Vineyard of the Saker





Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu


O choque da Bolsa na "2ª-feira negra" enviou ondas para toda a economia global, com toda a Ásia e boa parte o ocidente experimentando algum tipo de queda no mercado. A queda fez surgirem medos de que o mundo esteja às portas de mais uma recessão global, dessa vez causada pela fase "novo-normal" chinesa de crescimento moderado e correção da moeda. A transição da maior economia do mundo, de explosão-surto de desenvolvimento, para supergigante estável por direito próprio, é um dos processos mais importantes da próxima década, e a força que a economia chinesa exerce sobre o resto do mundo já é agora incontestável. 

Mas os EUA não estão assistindo a tudo sentados e trabalham furiosamente para impedir a criação catalítica, pelos chineses, de uma nova ordem econômica mundial, inflando seus projetos TPP (Trans-Pacific Partnership) e TTIP (Transatlantic Trade and Investment Partnership, TTIP). Além disso, os políticos e executivos norte-americanos, apesar de perdas consideráveis que sofreram por efeito da "2ª-feira negra", muito certamente se consolaram ao ouvir dizer que a queda no mercado chinês fora maior. Essa rivalidade global entre duas superpotências é de fato uma guerra fria global – e já nos obriga a considerar o tópico do bipolarismo econômico e como está impactando o resto do mundo.


Na primeira parte desse artigo, introduzo o conceito de bipolarismo econômico e descrevo as duas principais características que o definem. Na sequência, examino a natureza do "não alinhamento" nessa competição mais ampla, e disseco as três categorias que compõem esse conceito geoeconômico. Na parte final, exponho alguns dos interesses estratégicos que os EUA têm em explorar disrupções econômicas como a "2ª-feira negra", para 'desmoralizar' o rival chinês aos olhos de Europa e da região do Pacífico Asiático.

A natureza do bipolarismo econômico

O núcleo duro desse conceito geoeconômico tem várias colorações temáticas da Guerra Fria de antes entre EUA e União Soviética, embora ajustadas para a rivalidade de hoje entre EUA e China. Eis três legados que continuam ativados até hoje:

A competição ideológica

EUA e China têm grandes estratégias diametralmente opostas, pesadamente influenciadas por suas respectivas ideologias. Os EUA são os cães de guarda do mundo unipolar e, como tal, defendem obcecada e viciosamente unipolarismo do atual estado de coisas, servindo-se para isso de incontáveis agressões 'preventivas' (as guerras contra Iraque, Líbia, etc.) e de sabotagem conspiratória (as chamadas 'revoluções coloridas'). 

O principal objetivo dos EUA ao alterar o status político-militar de locações geoestratégicas chaves é buscar eventuais ganhos econômicos que possam preservar o unipolarismo e a unipolaridade e atacar as forças multipolaristas que se vêm organizando ao longo dos últimos 15 anos. A visão econômica geral dos EUA é tornar-se o centro nervoso global no gerenciamento do comércio Leste-Oeste, usando sua localização privilegiada como uma 'ilha-mundo' que conecta Atlântico ao Pacífico, o que explica o foco obcecado nos acordos ['parcerias'] TPP e TTIP em anos recentes. 

Se esses acordos se tornarem vigentes, e mais ainda, se as tentativas de golpes dos EUA na América Latina forem bem-sucedidas e recriarem um hemisfério de governos fantoches, tudo isso permitirá que os EUA mantenham e reforcem o sistema existente. O objetivo de longo prazo, que os tomadores de decisões norte-americanos empenham-se para alcançar mediante a combinação de intriga geopolítica e projetos econômicos globais, é uma realidade econômica reconstruída que devolva os EUA à posição onde antes estiveram, de mais importante economia do mundo.

A China, por outro lado, opõe-se firmemente aos planos dos EUA e, embora outros, como a Rússia, também se oponham, os chineses são os únicos capazes de resistir contra esse projeto num nível econômico (enquanto os russos só podem resistir no front geopolítico/técnico-militar; daí a parceria estratégica sino-russa).

A China antevê um futuro no qual a multipolaridade sobrepõe-se à unipolaridade, com a fatia do leão das vantagens dessa reorganização cabendo aos projetos da Nova Rota da Seda, que se estima que recobrirão o planeta e aplicarão golpe mortal, no longo prazo, ao decrépito sistema norte-americano de dominação. Pequim acredita que os avanços de chineses e seus contrapartes, na construção de sistemas econômicos e financeiros alternativos, não dominados pelo ocidente (o AIIB; o Banco dos BRICS e o  Contingent Reserve Arrangement dos BRICS), pode prover substituição adequada e oportuna para a estrutura existente, e que a transição pode evoluir suavemente nos anos futuros, desde que se mantenham as atuais tendências multipolaristas. O que a China tenta alcançar, então, é revisão completa do sistema global, mudança fundamental que pesaria em detrimento dos EUA, ao mesmo tempo em que daria oportunidade ampla para que outros crescessem.

"Destruição Mútua Garantida" [orig. Mutually Assured Destruction (MAD)

China e EUA são ambos capazes de infligir dano econômico devastador um ao outro, mas o resultado seriam consequências inaceitáveis que fariam ruir a economia de quem atacasse primeiro. Por exemplo, a China poderia pôr à venda todos os títulos públicos dos EUA que tem em poder dela, apenas para dar um exemplo, mas a calamidade que daí resultaria com certeza reverberaria, num instante, de volta contra a China. O repentino crash do dólar e o subsequente colapso da economia dos EUA devastaria a moeda oficial mundial de reserva e de todos que a usem, e eliminaria um dos maiores parceiros comerciais da China e destino de exportações. Por outro lado, se os EUA resolvessem arquitetar algum desmoronamento rápido da economia chinesa mediante manipulação de ações e/ou agitação social, nesse caso também estariam trabalhando contra sua própria economia que se iria pelo mesmo ralo global financeiro (como o pânico da “2ª-feira negra” já sugeriu assustadoramente); e/ou iniciaria a temida venda, pela China, dos papeis norte-americanos, dentre outros cenários de revide. 

A razão pela qual nenhum dos dois países decidiu tomar qualquer medida drástica contra o outro está na complexa interdependência econômica entre eles, que garante a mútua destruição econômica dos dois lados, não importa quem ataque primeiro.

Mas isso não significa que será sempre assim, com os dois lados, EUA e China, explorando meios assimétricos pelos quais romper o ciclo MAD [ing. "louco"] e pôr-se em posição menos adversa para iniciar hostilidade econômica em grande escala. A China está fazendo isso mediante, principalmente, a busca da desdolarização, a qual, se bem-sucedida no longo prazo, reduzirá muito o risco que a própria China enfrentará no caso de um colapso econômico norte-americano premeditado. Os EUA, ao contrário, estão tentando aprofundar o papel do dólar na economia global, amarrando-o como parte inseparável do comércio trans-Atlântico e trans-Pacífico, de tal modo que, no evento de um colapso da moeda, outros dos maiores parceiros comerciais da China seriam também arrastados, o que faria o colapso voar, como bumerangue, para Pequim. Outra coisa que os EUA tentam fazer, mas que pode permitir-lhes iniciar ofensiva econômica significativa contra a China, é incentivar empresas norte-americanas a retirar-se da China e mudar-se para a zona da proposta Parceria Trans-Pacífico (TPP). Se acontecer em escala suficiente, pode reduzir os efeitos posteriores que um colapso da China teria sobre grandes empresas norte-americanas. A China, por sua vez, tratou de corrigir o yuan para torná-lo mais competitivo, numa tentativa de enfrentar aquele movimento dos EUA antes de que se torne irreversível.

O Movimento dos [países] Não Alinhados (MNA) 

A guerra fria econômica entre EUA e China também tem sua justa fatia de membros não alinhados os quais (embora sejam países que se identificam como mais próximos de um ou de outro polo), e sem contar aqueles já ligados por lealdade a um ou outro lado (e.g. a República Popular Democrática da Coreia ('Coreia do Norte'), em relação à China; o Haiti, aos EUA) podem ser distribuídos em três níveis:

– Aspirantes a serem novos polos

Entidades como a União Eurasiana e a União Europeia, além de grandes mercados como Índia e Brasil, aspiram a tornar-se eles mesmos os seus próprios centros de gravidade econômica num mundo econômico realmente multipolar. Por enquanto, contudo, o bipolarismo econômico ainda é o real estado das coisas. Mas se a China for vitoriosa na luta contra os EUA, nesse caso deve-se esperar que os EUA cedam seu 'momento unipolar' em favor de uma multipolaridade genuína, que é fundamental para a nova ordem econômica hoje em construção. Assim, os países hoje aspirantes a serem novos polos podem ser vistos como 'Chinas regionais' nesse arranjo futuro, o que acontecerá para benefício dos próprios países, como também para benefício da China. 

Por enquanto, embora essa categoria tenha sincero autointeresse no multipolarismo econômico, a unipolaridade geopolítica dos EUA está pressionando pesadamente pelo menos um de seus membros constituintes – a União Europeia –, para que desista dessa via de desenvolvimento e se mantenha atrelada aos EUA mediante a Parceria Trans-Atlântico, TTIP.

Deve-se prever que outros desses jogos de poder serão iniciados contra Brasil e Índia, mas ainda não se pode especular sobre eventuais chances de sucesso, até que as propostas apareçam. 

Quanto à UE, parece que há 50% de probabilidades de que se integre à Parceria Transatlântica, mas evidentemente é possibilidade que se mantém no ar. O mais importante é que, se a China puder converter os países aspirantes e fazer deles novos polos apoiadores do multipolarismo econômico, nesse caso aumentam as possibilidades de que alcance grande sucesso estratégico; assim também, os EUA podem cooptar essas mesmas entidades ou seus líderes, para que creiam, erradamente, que se poderiam beneficiar muito de um unipolarismo econômico prolongado, o que, se acontecer, fortaleceria o sistema existente e o tornaria mais forte para resistir a disrupções multipolaristas. 

– Intencionalmente oscilantes

A categoria seguinte é constituída de potências medianas, que pretendem oscilar entre os dois polos, equilibradamente, na esperança de colher de ambos os lados os dividendos econômicos resultantes. Exemplos desses estados são Indonésia, Vietnã, Irã, Turquia, Egito, Etiópia, Nigéria e talvez, mesmo, um dia, até o México. Em escala menor, mas relacionada, Myanmar e Cuba também tentam fazer isso, depois de terem reconsiderado suas fidelidades originais e terem optado pelo que veem como modelo mais 'equilibrado' de desenvolvimento. 

Se, por um lado, as atuais potências medianas podem ser capazes de administrar o complexo movimento de equilíbrio envolvido nessa política multifacetada, graças às suas populações relativamente maiores e maiores potenciais de mercado, Myanmar e Cuba estão em posições menos vantajosas vis-à-vis esses pré-requisitos estabilizantes, e, assim, podem vir a desestabilizar-se, como resultado de suas políticas bem-intencionadas (mas politicamente mal orientadas).

– Zonas de Concorrência

Quanto ao restante do mundo, entra principalmente como parte das zonas de concorrência entre os dois polos – especificamente: quase toda a América Latina e quase toda a África. 

Dentro dessa faixa gigantesca de território, os estados pelos quais EUA e China estarão competindo podem ser também às vezes ligados ou a países aspirantes a polos ou a países intencionalmente oscilantes, o que faz deles importantes complicadores da situação. 

A Nigéria, por exemplo, é intencionalmente oscilante, que atualmente está alinhada mais próxima da China e expande sua influência econômica para os vizinhos Niger e Chade. Esses são dois países que estão claramente na zona de concorrência, visivelmente mais próximos de aspirantes a polo da UE (especificamente, da França, a qual, nos dois casos de superposição, está atualmente incluída na área de influência econômica unipolar e unipolarista dos EUA). 

A tendência geral tem sido – para os tradicionais mercados externos dos EUA e da UE, na América Latina e na África (as zonas de concorrência) – mover-se para mais perto da China. 

Relacionado a essa categoria, mas não inteiramente dentro dela no momento presente, é o Oriente Médio, especialmente as monarquias do Golfo dependentes de exportações de energia, que podem vir a olhar mais para a China no futuro, em busca de comércio e investimentos, enquanto suas riquezas nacionais começam a dar sinais de esgotamento.

China’s Pain, America’s Gain 
[Se dói na China, é bom para os EUA]

Sempre que surgem notícias de dificuldades econômicas (“2ª-feira negra”) ou desenvolvimentos vistos como controversos (correção do yuan) emergem da China, os EUA sempre se posicionam tentando extrair alguma vantagem estratégica relativa. Adiante, os três modos pelos quais os EUA tentam transformar desafios para os chineses em oportunidades para os norte-americanos:

Atacar a boa reputação da Rota da Seda chinesa:

Empresas fornecedoras de noticiário pró EUA como CNN e Bloomberg têm tendido a recolher e distribuir qualquer notícia econômica negativa que apareça sobre a China, de modo a criar e inflar dúvidas sobre a estabilidade sistêmica do país. Por mais que haja interesses empresariais das próprias empresas que fazem isso, e também vivem do negócio de literalmente vender noticiário, aí elas atendem também a outro objetivo, nem sempre diretamente conectado às empresas de notícias, e que é atacar a reputação da China diante de seus parceiros nos projetos da Nova Rota da Seda. Seja feito deliberadamente ou não, essa ação 'midiática' claramente atende a objetivos do establishment da política externa dos EUA, muito interessado em manipular a consciência pública nos estados oscilantes e da zona de concorrência conectados à Rota da Seda. 

Quanto mais consiga abalar a confiança de estados parceiros nos fundamentos da economia chinesa, mais os EUA podem inflar qualquer dúvida que haja sobre a natureza do desaquecimento da economia chinesa e subsequente capacidade do país para financiar seus compromissos de dimensões megalíticas.

A Nova Rota da Seda já é questão política contenciosa dentro da elite do Sri Lanka, por exemplo, e o novo presidente, pró-EUA, já congelou o investimento chinês de $1,4 bilhão no porto de Colombo (ao mesmo tempo em que passou a dedicar-se a obra equivalente em Hambantota). Essa questão tem mais a ver com geopolítica do que com a guerra de informação que os EUA movem contra os compromissos de seu rival econômico multipolarista, mas se os EUA conseguirem pôr em jogo essa questão, como fator para influenciar (com fatos verdadeiros ou inventados pelo 'marketing') os relacionamentos da China na região e abalar a cooperação para a Rota da Seda do Sri Lanka, a operação pode até se converter em interessante caso para estudar o quanto é profunda a confluência entre (i) geopolítica, (ii) geoeconomia e (iii) guerra de informações, e o quanto os EUA podem usar todos esses recursos para retardar o avanço da Nova Rota da Seda. 

Idealmente, os EUA gostariam de repetir o cenário proposto para o Sri Lanka, com seus prepostos encarregados de tocar a agenda anti-Rota da Seda, e depois 'justificá-los' retroativamente, sob o argumento de que a desaceleração econômica da China teria levado aqueles países a reconsiderar seus projetos comuns. 

Pouco importa que seja ou não seja o caso, porque aos EUA só preocupa preservar uma 'negabilidade plausível' que lhes permita continuar a 'declarar' que um ou outro dos seus estados clientes tomou por conta própria uma ou outra decisão controversa, sem qualquer interferência norte-americana.

Assustar investidores, para que se afastem da China:

É evidentemente impossível para os EUA alcançar sempre todos os próprios objetivos (nem de fato interessa aos EUA destruir completamente a China), mas muito interessa aos EUA, isso sim, usar seus meios de informação para influenciar investidores estrangeiros a que retirem seus capitais da China e os transplantem para mercados mais 'estáveis' e 'lucrativos' como o Vietnam e outros dos propostos 'estados TPP'. Momento em que investidores e proprietários de negócios estejam em pânico é momento certo em que estão mais receptivos a 'sugestões' alternativas ou inferências propostas pelos veículos de informação e conselheiros 'especialistas' nos quais 'confiam'.

Não há dúvidas de que a China passa por desaquecimento e que o "novo normal" veio para ficar, mas o problema aparece quando a especulação financeira tomada pelo pânico passa a prevalecer sobre qualquer avaliação bem refletida, no processo de ajustar o portfólio econômico na região, de um ou outro grande investidor, o que se aplica a investidores financeiros, tanto quanto a investidores na economia real, em setores de construção e operação de grandes fábricas.

Nas linhas do que acima ficou exposto na primeira sessão, os EUA gostariam de ver acontecer exatamente isso, para minimizar os efeitos econômicos que recairiam sobre os próprios EUA e seus parceiros, no caso de os EUA decidirem 'endurecer' na guerra econômica contra a China. Não se prevê de modo algum qualquer grande fluxo de capital para fora da China como resultado dessa estratégia de manipulação da informação, mas é o êxodo lento mas continuado – que pode vir a compor-se numa tendência maior –, que pode vir a ter as implicações mais perturbadoras para a China e sua visão econômica pró multipolarismo.

Fortalecer o apelo relativo dos EUA:

Os EUA aposta na certeza de que seus corretores-vendedores de informação sejam suficientemente hábeis para inflar o apelo a favor de seus patrões, ao mesmo tempo em que denigrem qualquer atração que a China tenha. A hipocrisia absoluta dessa situação está em que os mesmos traços que a chamada 'mídia' usa para atacar a economia chinesa (“ incerta”, “sem qualquer regulação”, “sem transparência”) podem ser igualmente usados para descrever a economia norte-americana. O que acontece é que, com a informação entregue a especialistas em manipulação dos discursos e dos meios, essa evidência pode ser quase completamente diluída, quando o noticiário é 'preparado' para divulgação massiva (nos casos em que um ou outro 'comunicador' dê-se conta das semelhanças). 

Para os EUA, o mais importante é que há ganhos a extrair imediatamente do fortalecimento de seu apelo, no momento em que redobram as pressões sobre estados da UE e do Pacífico Asiático para que se incorporem às 'parcerias' TTIP e TPP, respectivamente. Qualquer declínio comparativo da China (não importa se real ou imaginário) é instrumento com o qual os EUA podem operar nesse momento crucial em que tentam arregimentar para sua área de influência aqueles dois mercados geográficos. 

Dadas as enormes consequências em jogo nessas duas iniciativas (especificamente, que estados da União Europeia e 'estados do Pacífico', os dois blocos comerciais transnacionais, resultariam proibidos de firmar acordos econômicos externos sem ter, antes, a aprovação do 'parceiro' norte-americano), torna-se radicalmente importante identificar e avaliar todos os impactos da guerra de informação econômica que os EUA movem contra a China, no que tenha a ver com as percepções relativas das economias chinesa e norte-americana.

À guisa de conclusão 

O choque das ações da “2ª-feira negra”, embora em vários sentidos tenha sido exagerado (e tenha sido considerado fora do contexto da realidade da menor capitalização do mercado chinês), conseguiu tornar muita gente consciente do impacto que a economia chinesa tem sobre o resto do mundo. O caráter de íntima interconexão entre a globalização econômica e a histórica ascensão dos chineses ao lugar de primeira economia do planeta inevitavelmente significaria que eventos dentro do mercado chinês sempre se refletiriam em algum grau em todos os demais países. Se se dá um passo atrás e relembramos como o mais recente pânico global foi disparado pelos fracassos estruturais dos EUA (muito mais objetivamente factuais e aferíveis, que a onda inflada da crise chinesa no mesmo momento), começam a emergir as linhas gerais do bipolarismo econômico, com EUA e China na função de âncoras respectivas da ordem atual.

Como se viu no sistema bipolar da Guerra Fria, o que se vê hoje também carrega consigo, implícitos, muita concorrência e altos riscos, com cada lado tentando burlar e sabotar o outro, na disputa por fazer valer a própria visão ideológica do futuro da economia global. Os que estejam entre os dois lados associam-se mais intimamente a um ou outro desses dois estados, e podem ser distribuídos numa hierarquia de três níveis que descreve mais acuradamente o relacionamento de cada um desses países 'intermediários' com a estrutura geral de dois polos. Dado que EUA e China estão engajados em feroz disputa global um contra o outro, cada vez que a China tropeça, seja o tropeço real ou imaginário, os EUA lá estão para extrair do tropeço todas as vantagens econômicas comparativas possíveis. 

No momento, a disputa se trava em torno da “2ª-feira negra”, que foi usada como presente divino para todos que, no establishment norte-americano se interessam por fazer avançar sua narrativa "anti-China", segundo a qual os melhores tempos chineses já seriam passado. 

Esse noticiário autorreferente, enviesado e autointeressado é arquitetado para apresentar os projetos chineses da Rota da Seda como 'delirantes', irrealistas e desmesuradamente ambiciosos, com o objetivo final de abalar a confiança que estados europeus e do Pacífico Asiático depositem na China; assim os EUA contam com pressionar seus estados clientes naquelas regiões para que subscrevam os ambiciosos planos dos EUA consubstanciados nas 'parcerias' TTIP e TPP.

Mas o que os EUA e seus estrategistas não estão considerando é que, embora, sim, os dias do bipolarismo estejam contados, o fim pode não ser a vitória dos EUA na qual Wall Street tanto está apostando.*****

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